Uma multidão cercava Barack Obama, que, simpático, sorria para fotos com crianças no colo e dava abraços calorosos nos moradores da Cidade Deus, favela-símbolo da zona Oeste do Rio de Janeiro. Apenas dois seguranças, também bem-humorados, protegiam o homem mais poderoso do mundo em sua visita à comunidade que ficou famosa graças ao cinema.
Seria uma história fantástica, não fosse o Obama em questão o sósia profissional Reinaldo Américo, famoso por imitar o presidente norte-americano no estádio do Maracanã. Foi com ele que a população da Cidade de Deus teve que se contentar na visita feita pelo Obama de verdade a um centro comunitário dentro da favela. Pouca gente viu o primeiro negro eleito presidente dos Estados Unidos, que ficou no local por pouco mais de meia hora. E muitos tentaram.
William Maia
O sósia profissional de Obama, Reinaldo Américo, posa com criança na Cidade de Deus
O forte esquema de segurança, que já havia afastado o presidente da população brasiliense em seu encontro com a presidente Dilma Rousseff, e fez transferir o discurso da Cinelândia para um local fechado, mexeu com a vida dos moradores da Cidade de Deus. Ruas foram bloqueadas, lojas fechadas e centenas de policiais e homens da Força de Segurança Nacional eram vistos a cada esquina. Devido aos bloqueios, muitos moradores foram impedidos de chegar às suas casas.
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“Hoje eu não posso sair com o meu carrinho, não posso usar minha bolsa, tenho que ficar andando com identidade na mão”, reclamou a vendedora Marisa Alencar de Souza. Apesar da queixa, ela tentou se aproximar da associação comunitária para ver Obama. “Achei muito legal ele vir até aqui, é um homem bom… e muito bonito”, disse, aos risos.
Mas nem todos estavam contentes com a presença do norte-americano. A dona de casa Maria de Souza, 55, varria uma enorme poça de água enlamaçada na viela em que mora, num local próximo ao que Obama conheceu. “Quero ver ele passar aqui nessa rua. Nem com a visita dele deram um jeito de limpar aqui desse lado. Só onde ele vai passar”.
A avenida que corta a Cidade de Deus estava livre de carros e organizada como nunca, segundo o comerciante Jessé Albuquerque. “Nunca vi uma pista tão limpa quanto hoje”, disse. “Eu estou com o lixo ali pra botar pra fora. Ele (Obama) não podia esperar até o caminhão passar?”, protestou outra moradora.
William Maia
A dona de casa Maria de Souza varre poça d'água: “Nem com a visita dele deram um jeito de limpar”
Decepção
“Se você tentar passar, eu vou atirar mesmo, nem tenta. E não fica pulando muito perto de mim porque estou com a arma destravada”, disse um policial do BOPE (Batalhão de Operações Policiais Especiais) à estudante Ruth Késia, 19, enquanto mantinha o cordão de isolamento que separava centenas de moradores, que se amontoavam em busca de um aceno de Obama.
Uma dessas moradoras era dona Ana, 67, que tinha esperança de falar com o presidente norte-americano em duas línguas: inglês e francês. “Queria dizer “nice to meet you, mr. president, how are you?”, disse a senhora, que também queria chamar a atenção de Obama para a situação de Beirute, cidade onde morou na década de 1960. “Hoje ele está atacando a Líbia, amanhã pode ser o Líbano também, Beirute é uma cidade tão linda”.
William Maia
Na Cidade de Deus, muita gente se esforçou para ver Obama, mas poucos tiveram contato com o presidente
Ciceronado por políticos, Obama ficou na quadra da FIA (Fundação para Infância e Adolescência) por cerca de 20 minutos. Assistiu a apresentações de capoeira e percussão e arriscou embaixadinhas com meninos atendidos na instituição. Na entrada, não saiu do carro. Na saída, acenou por alguns segundos para as pessoas, que se aglomeravam em lajes e janelas, e foi embora.
Enquanto isso, o “Obama genérico” transpirava de tanto dar autógrafos e tirar fotos. Um morador puxou o grito que continou a festa depois da saída da carreata oficial: “Nós temos Obama! O nosso Obama!”
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