A escritora bielorrussa Svetlana Alexievich, vencedora do prêmio Nobel de Literatura deste ano, afirmou nesta segunda-feira (07/12) que, na Rússia após a dissolução da União Soviética, “uma era cheia de esperança foi substituída por uma era de medo”. Alexievich fez essas declarações durante um discurso na sede da Real Academia de Ciências da Suécia, em Estocolmo, que lhe conferiu o Nobel em outubro.
EFE
EAcademia justificou o prêmio a Alexievich pelos “escritos polifônicos, um monumento pelo sofrimento e a coragem do nosso tempo”
“Vou tomar a liberdade de dizer que nós perdemos a chance que tínhamos nos anos 1990. A questão foi colocada: que tipo de país deveríamos ter? Um país forte, ou um país digno, onde as pessoas possam viver decentemente?”, disse a escritora. De acordo com a ela, a opção de um ser país forte foi a escolhida pela Rússia.
Alexievich lembrou a atual política externa de Moscou, criticando as posições do Kremlin. “Novamente, estamos vivendo em uma era de poder”, disse ela, pontuando que os russos estão em combate com os ucranianos, chamados de “irmãos” dos russos pela escritora, e bombardeiam alvos na Síria.
“Eu tenho três casas: minha terra bielorrussa, pátria do meu pai, onde passei toda a minha vida; a Ucrânia, pátria da minha mãe, onde eu nasci; e a grande cultura da Rússia, sem a qual eu não consigo me imaginar. Todas são muito queridas por mim, mas nesta época é difícil falar de amor”, afirmou.
NULL
NULL
Um dos trabalhos da carreira de Alexievich foi documentar o desastre nuclear em Chernobyl, na Ucrânia, em 1986. O livro “Vozes de Chernobyl” (em tradução livre), que não foi publicado no Brasil, é resultado das mais de 500 entrevistas realizadas pela escritora. “Você não podia ver a radiação, nem tocá-la, nem sentir o cheiro dela. Quando viajei para o local [do acidente], me disseram prontamente: não colha as flores, não sente na grama, não beba água dos poços. A morte se escondia em todos os lugares, mas era um tipo diferente de morte”.
A escritora disse que, em Chernobyl, não se sentia nem bielorrussa, nem ucraniana, nem russa, e sim “uma representante de uma espécie biológica que poderia ser destruída”. Segundo ela, duas “catástrofes” aconteceram ao mesmo tempo: Chernobyl e a decadência do socialismo.
“Muitas vezes eu me choquei e me amedrontei com os seres humanos. Experimentei o prazer e o asco. Algumas vezes, eu quis esquecer o que ouvi e retornar para um tempo em que vivi na ignorância. Mais de uma vez, no entanto, vi o sublime nas pessoas e tive vontade de chorar”, disse ela.
A cerimônia de outorgação do prêmio Nobel de Literatura a Alexievich está marcada para o dia 10 de dezembro em Estocolmo.