O retorno da França ao comando militar da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) após mais de 40 anos, anunciado ontem (11) pelo presidente Nicolas Sarkozy, não vai apenas aumentar a participação de Paris nas decisões da aliança. Há também uma estratégia política, de um país que quer reforçar sua posição junto a outras nações européias e aos Estados Unidos.
A opinião é do professor de História e Relações Internacionais na Universidade de Sorbonne Frédéric Bozo, autor do livro A França e a Otan. “A França será, sem dúvida, associada a uma porção maior de decisões, mas a diferença não será fundamental. Na verdade, o objetivo dessa decisão é mais de natureza política que propriamente militar”, disse durante bate-papo realizado hoje pelo jornal Le Monde.
O país é membro da Otan desde sua criação, em 1949, mas permaneceu fora das questões centrais da aliança desde 1966, por decisão do então presidente, general Charles de Gaulle (1959-1969). Ele justificou que não queria tropas estrangeiras na França dirigidas por outra força no contexto da Guerra Fria.
“Sarkozy deseja mostrar aos integrantes europeus [da Otan] que busca a integração militar regional e não o estabelecimento de uma força francesa, como foi sugerido anteriormente. O reingresso na Otan deixa clara a intenção da França de liderar”, afirmou o professor.
Reação da esquerda
A decisão de Sarkozy foi criticada pelo Partido Socialista. O ex-primeiro-ministro Dominique de Villepin, que integrou o governo de Jacques Chirac (1995-2007) junto com Sarkozy, afirmou ao jornal Washington Post que a independência da política externa do país será “diluída”.
Ségolène Royal, que competiu pelo PS nas eleições de 2007 contra o atual presidente, disse estar preocupada com o forte “alinhamento” da França com os Estados Unidos, “ao mesmo tempo em que o resto do mundo está se distanciando da superpotência”.
No discurso de ontem, Sarkozy disse que a “independência da França não está em questão” e que o país irá manter o controle sobre seu arsenal nuclear.
Para Frédéric Bozo, a percepção de que um alinhamento com os Estados Unidos seja ruim vem do fato de que o distanciamento por 40 anos da Otan deixou nos cidadãos franceses uma noção de “independência total” em relação a Washington e ao resto do mundo.
A idéia de reaproximar a França da Otan é antiga e foi ensaiada por outros presidentes, segundo ele. “Jacques Chirac, em 1995, havia iniciado um processo que conduziria à normalização da posição francesa. François Mitterrand [1981-1995] permitiu que o embaixador francês na Otan conduzisse uma discussão sobre o mesmo tema com os norte-americanos”.
O professor pensa, portanto, que não haverá maior alinhamento. “Haverá uma continuidade das políticas atuais”.
O anúncio francês foi comemorado em Washington. “A França está novamente em seu lugar na estrutura de comando da aliança que contribuiu para criar”, declarou o porta-voz do Pentágono, Geoff Morrell.
Afeganistão
Concretamente, a decisão francesa não trará grandes mudanças. Mesmo fora do comando militar, o país integrou as principais missões da Otan – como na Bósnia, Kosovo e, atualmente, no Afeganistão –, está entre os cinco principais fornecedores de tropas e é o quarto maior contribuinte de seu orçamento.
Mais de 3 mil soldados foram mandados para o Afeganistão e Sarkozy argumenta que, dada a grande participação francesa, não fazia mais sentido o boicote à estrutura militar.
“Mandamos nossos soldados para o campo de batalha, mas não participamos do comitê onde os objetivos são decididos”, afirmou. “A hora de acabar com essa situação chegou. É interesse da França e da Europa”.
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