“F**k taxas” e o poder dos palavrões: eles aumentam os batimentos cardíacos e fazem as mãos suarem
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Em protestos e manifestações, como os que tomam ruas de diversas cidades do país nas últimas semanas, não raro são ouvidos gritos que envolvem palavrões. Os xingamentos compõem os cenários das intervenções e, segundo a pesquisadora da Universidade de Stanford Melissa Mohr, têm justificativa. “Os palavrões transmitem emoções melhor do que quaisquer outras palavras, por isso eu diria que eles são perfeitos para manifestações e protestos”, diz Melissa Mohr. As conclusões sobre as origens dos xingamentos e a maneira como eram vistos dentro das sociedades ao longo da história foram publicados em seu recente livro Holy Sh*t, a brief history of swearing.
Segundo Melissa, esse tipo de palavra “faz com que as pessoas compreendam quão forte é seu sentimento sobre algo, o quanto aquilo significa para elas”. Além disso, estudos têm mostrado que os xingamentos fazem as pessoas se sentirem unidas, como parte de um grupo. “São formas de expressão que ajudam os manifestantes a se sentirem unidos contra o que estão protestando”, diz ela.
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Dentro das sociedades contemporâneas, a autora observa que os palavrões representam uma força muito significativa, capaz de influenciar favoravelmente o rendimento de quem realiza tarefas xingando, se comparado com quem realiza tarefas pronunciando outras palavras. “Isso é uma coisa que eu não fazia ideia antes de começar a estudar”, conta. “Você é capaz de permanecer com sua mão em água gelada por mais tempo se estiver xingando do que se estiver pronunciando palavras neutras, por exemplo”.
Segundo Melissa, a nossa resposta aos palavrões e xingamentos vai além das palavras. “Ouvir e falar palavrões ou obscenidades leva ao aumento dos batimentos cardíacos e faz as mãos suarem”, exemplifica.
Poder cultural
O principal motivo que fez Melissa se debruçar sobre o tema, ela conta em entrevista a CartaCapital, explica-se pelo poder cultural que as palavras representam nas diferentes sociedades. “Em toda cultura existem palavras que mudam o estado de espírito das pessoas quando são pronunciadas, que as deixam chateadas. São como tabus”.
Segundo a pesquisadora, um divisor de águas na história da interpretação das palavras foi o cristianismo, difundido durante a Idade Média. “Nos tornamos mais religiosos, e as palavras ganharam significados e pesos diferentes”, afirma ao explicar que a maneira como as pessoas viam Deus também mudou, bem como a relação que as pessoas desenvolviam com ele. “Especialmente em lugares que viveram revoluções protestantes, a maneira como as pessoas enxergavam Deus mudou bastante.”
As pessoas, observa a autora, tratavam sua relação com Deus de maneira muito rígida, e os juramentos invocando os santos nomes tinham uma importância literal para elas. Essa relação, ela explica, perdeu um pouco de força com a ascensão das relações mercantis, quando os juramentos feitos para parceiros comerciais se tornam prioritários e os juramentos feitos a Deus passaram a vir em segundo plano.
Por outro lado, os modelos que estabelecemos para o que é socialmente reprovável vieram dos romanos, como os termos sexuais que ainda usamos em nossa linguagem corrente. Palavras que são consideradas realmente impactantes e vistas com certa proibição dentro de diversas culturas, como as que descrevem partes do corpo, por exemplo. No inglês, Melissa destacou palavras que ganharam essa característica de xingamento ou de cunho obsceno, como “fuck“, “cunt“, “cock” e “piss“.
Os romanos também lidavam com o corpo como nós, a partir do seu caráter sexual e com uma ideia de obscenidade. Para eles, palavras como vagina (cunnus) e clitóris (landica) eram vistos com proibição. “Eu diria que os romanos nos deram o modelo que temos hoje para o obsceno, o pervertido e o proibido”.
* Texto publicado originalmente na revista CartaCapital
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