O estado da Flórida intensificou nesta semana o bloqueio econômico a Cuba após o parlamento estadual aprovar uma lei que proíbe governos locais de negociar com empresas estrangeiras que mantenham relações comerciais com o país caribenho. Uma das principais afetadas pela medida? A brasileira Odebrecht.
A nova lei estadual, apresentada por políticos republicanos, entre eles todos os que têm ascendência cubana, não menciona o nome da empresa brasileira, mas porta-vozes dos cubanos anticastristas apontam que a Odebrecht é o objetivo escolhido. “É o primeiro nome que me vem à cabeça”, afirmou ao Opera Mundi Mauricio Claver-Carone, diretor do maior grupo de pressão política da extrema direita cubana, o Comitê de Ação Política Cuba-Estados Unidos.
A Odebrecht mantêm uma relação de negócios muito forte com as autoridades municipais do condado Miami-Dade, a maior área metropolitana do sul da Flórida. Entre os projetos estão as obras públicas mais importantes da região, como a construção dos dois principais terminais do aeroporto internacional de Miami, uma obra avaliada em três bilhões de dólares.
Além disso, a empresa brasileira está construindo o metrô que liga o aeroporto ao centro da cidade e participou da construção do Centro de Artes Dramáticas, a maior sala de espetáculos da Flórida, e de dois centros desportivos: a American Airlines Arena e o estádio da Universidade Internacional da Flórida.
No momento, os executivos da empresa brasileira em Miami moderam seus comentários. A Odebrecht tomou conhecimento no dia da aprovação da lei, sexta-feira, mas segundo Gilberto Neves, presidente do conselho de administração nos EUA, a empresa quer ficar. “Os EUA são a nossa casa, queremos continuar aqui”, disse.
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Autor do projeto de lei, Michael Bileca (centro) diz que empresas devem escolher se querem fazer negócios com “países terroristas”
Imposto em 7 de fevereiro de 1952, o embargo econômico, comercial e financeiro a Cuba foi ampliado com a proibição para que filiais estrangeiras de companhias norte-americanas comercializassem com Cuba – a valores superiores a 700 milhões de dólares anuais – em 1999.
Em termos legais, a Odebrecht que opera nos EUA é uma empresa subsidiária da matriz brasileira. Mas não por causa do embargo, e sim devido a uma lei federal dos EUA que proíbe a atividade de empresas estrangeiras no país. Toda companhia não-americana precisa abrir uma filial norte-americana.
A construtora está na Flórida há 20 anos, mas só começou a ser contestada pelos exilados cubanos depois que a presidente Dilma Rousseff visitou Cuba em janeiro, quando foi anunciada a participação da empresa nas obras de reconstrução do porto de Mariel, a oeste de Havana, e na remodelação da indústria do açúcar.
Tecnicamente, a nova lei estadual proíbe a utilização de fundos públicos em contatos com empresas que tenham relações comerciais com países que o Departamento de Estado dos EUA considera “protetores de atividades terroristas”.
“Basicamente, a Odebrecht é vítima do bloqueio a Cuba. A questão do terrorismo é uma desculpa, porque de outro modo não iam conseguir aprovar uma lei assim”, comentou ao Opera Mundi o advogado Francisco Morales, especializado em Comércio Internacional.
Divulgação/Odebrecht
Com investimento brasileiro, Cuba reforma porto de Muriel; obra conduzida pela Odebrecht ficará pronta em 2014
Prova disso, explica Morales, é que a empresa brasileira não é proibida de realizar negócios com entidades privadas nos EUA, senão suas operações seriam canceladas. “E, até agora, o governo federal nunca disse nada”, lembrou.
Política externa
Por regra, os estados não podem aprovar leis que abrangem aspectos da política externa dos EUA, um terreno reservado exclusivamente para o governo federal. Para o congressista Michael Bileca, o principal proponente da lei, o problema é simples: “As empresas são quem decidem. Querem ou não ganhar dinheiro com países terroristas? Nós achamos que não”.
Para advogados e especialistas entrevistados pelo Opera Mundi, o assunto não está encerrado, porque o mais provável é que o caso seja levado aos tribunais, precisamente porque a política externa é da alçada de Washington DC. “Isso é inconstitucional”, disse Dan O’Flaherty, presidente do Conselho de Comércio Internacional, citando uma sentença do Supremo Tribunal de 2000, que anulou uma lei parecida aprovada em Massachusetts, mas contra Mianmar (a antiga Birmânia).
Além disso, no caso da Odebrecht, é praticamente impossível aplicar a nova lei, porque não existe uma parecida em nível federal. No entanto, alguns dos vereadores cubano-americanos de Miami, embalados pela aprovação da lei estadual, já disseram que vão congelar os negócios com a construtora.
Dissidência
Esta semana, durante uma reunião no município, o diretor do aeroporto de Miami começou a explicar em que consiste um novo projeto da Odebrecht. Depois, o chefe da comissão do condado, o ex-policial Joe Martinez, pediu para que se calasse.
O novo projeto da firma, chamado “Airport City”, consiste na construção de dois hotéis, rodeados de lojas e escritórios, dentro dos terrenos do aeroporto. Uma obra de 700 milhões de dólares que, segundo Gilberto Neves, dará emprego a 5.800 pessoas durante as obras e a 10 mil quando abrir as suas portas. “Vai trazer um grande desenvolvimento econômico para a cidade”, afirmou.
O plano está sendo estudado pelas autoridades de aviação federais, mas a palavra final fica por conta dos vereadores do condado Miami-Dade, de maioria cubana.
Para o vereador Javier Souto, que combateu as tropas de Fidel Castro na invasão norte-americana à Baia dos Porcos, em 1961, é melhor que a empresa brasileira esqueça o projeto. “Seria um insulto para nós. Esta nova lei resolveu o assunto”, disse.
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