Uma discussão inflamada numa rua central de Atenas levou alguns moradores às sacadas de seus apartamentos na manhã deste sabado (27/06). Um grupo, que formava fila diante de um caixa eletrônico do banco Piraeus, um dos principais do país, manifestava em alto e bom som o medo de ter suas divisas bloqueadas em um futuro próximo e discordava sobre o mais recente anúncio do primeiro-ministro Alexis Tsipras, feito na noite de sexta: o referendo.
Seja nas ruas, na imprensa ou nas redes sociais, Atenas acordou falando da consulta popular convocada para o domingo, dia 5 de julho, em que os gregos deverão decidir se aceitam ou não as medidas de austeridade propostas pelas credores europeus para que seja liberada mais uma parcela do pacote de empréstimo à Grécia.
Agêncie Efe
Gregos fazem fila em caixa eletrônico em Atenas
Em três horas de caminhada pela região central de Atenas, não foi possivel encontrar quase nenhum caixa eletrônico desocupado. Quase todos tinham filas. Uma funcionária pública de 45 anos, que preferiu não se identificar, disse estar aterrorizada. “Não sei se os bancos vão abrir na proxima semana, não sei se o meu país vai à falência”, desabafou, após tentar sacar dinheiro em um caixa que já não tinha mais papel-moeda.
Ela teme também pelo resultado do referendo, que, a seu ver, culminará na saída da Grécia da zona do euro. “Os jovens vão votar contra, vão recusar a proposta da União Europeia, porque pensam que com a volta da dracma [antiga moeda grega] estará tudo bem como nos anos oitenta, quando recebemos muitos empréstimos da Europa. Mas eles têm que voltar aos anos cinquenta e ver como era pior”.
A cidadã grega também se diz incomodada com uma possível mudança da posição geopolítica do país. “Nós temos muitos problemas com nossos vizinhos, especialmente com a Turquia. Se a Grécia ficar sozinha aqui, podem nos invadir de novo”, opinou, lembrando os séculos de ocupação otomana.
Agência Efe
Gregos fazem fila em caixa eletrônico em Atenas após convocação de referendo por Tsipras
'No longo prazo será melhor'
A desempregada Sundy Kalianioti, 45 anos, está de partida para as ilhas gregas — destino de muitos gregos, que veem no turismo oportunidade para alguma estabilidade. Ela arrumou um trabalho de camareira num hotel. “É o único tipo de trabalho que consigo”, diz com tristeza.
Kalianioti lamenta ter que deixar o pai idoso aos cuidados de outra pessoa e mostra-se muito preocupada com a possível adoção das medidas de austeridade impostas pelos credores, como corte das aposentadorias. “Meu pai trabalhou a vida inteira e recebe 700 euros por mês. Se aceitarem [o acordo], ele vai passar a receber 350 euros. Só os remédios custam 175 euros. Como vamos fazer?”. Como muitos gregos, Kalianioti acredita que o país vá sofrer no curto prazo, caso saia da Uniao Europeia, mas acha que no longo prazo será melhor. “Também teremos ajuda da Russia, tenho certeza”, comenta.
A oceanógrafa Maria Papadopoulou, 30 anos, compartilha da mesma opinião. “Nao estou com medo da Grécia sair da zona do euro. Vai ser melhor assim no longo prazo”, diz com serenidade, enquanto espera na fila sua vez de sacar dinheiro “só para tomar um café”. Em outro caixa, um homem comenta que hoje tambem é dia de pagamento das aposentadorias e por isso tem tanta gente na fila. Uma mulher retruca que praticamente nenhum deles é idoso.
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Kívia Costa / Opera Mundi
Em banca de Atenas, homem lê jornais que repercutem convocação de referendo por Tsipras
'Para mim, é game over'
Para o comerciante George Aravanis, 43 anos, a situação não é de pânico, mesmo porque os gregos que têm economias já colocaram suas divisas no exterior, diz ele. No entanto, Aravanis acha que a saida da zona do euro é inevitável. “Tsipras errou em convocar o referendo. Ninguém esperava isso e os europeus não gostaram nem um pouco. A nossa dívida [com a Troika] já vence na quarta-feira [dia 30] e o Banco Central Europeu não vai mais socorrer os bancos gregos, que já estão sem dinheiro. Para mim, é game over.” Ele ainda opina que a convocatória do referendo foi uma estratégia do Syriza [partido esquerdista do premiê, eleito em janeiro deste ano) para ter a volta da dracma e conseguir governar com o apoio do povo.
George, que cresceu no Brasil e passou mais de duas décadas na capital grega, fechou sua loja de roupas há quatro anos e mudou-se para a ilha de Creta. “Muitos gregos estão vindo para as ilhas, que é onde há turismo e a situação é melhor. Não me arrependo nem um pouco”, disse.
Sentadas nas escadarias do politecnico de Atenas, tradicional palco de protestos, as estudantes de arquitetura Maria e Xaroula, 23 anos, falam do futuro com dúvidas e palavras reticentes. Perguntadas se pensam em ir para o exterior, respondem em uníssono que sim. Questionadas se muitos colegas pensam da mesma forma, são enfáticas: “Muitos, muitos!”.