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Análise

Eleições indefinidas nos EUA: o fracasso da estratégia Joe Biden

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Biden foi a opção por um nome centrista, incapaz de polarizar uma discussão, avesso a assumir qualquer compromisso radical em qualquer pauta que lhe fosse apresentada

Haroldo Ceravolo Sereza

São Paulo (Brasil)
2020-11-04T04:54:00.000Z

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Atualizadas às 8h39

Diante de todos os erros, mentiras e uma enorme fileiras de absurdos cometidos ao longo de quatro anos, Donald Trump sobreviveu. É possível que o republicano ainda vença a eleição, ou perca por uma margem apertada. Indubitavelmente responsável pelo fracasso absoluto na lida com o coronavírus, responsável por um país que gera mais pobreza e desemprego, racista, machista, misógino, ele está aí. Mostrou força e promete aniquilar as bases de legitimação da ex-admirada democracia norte-americana.

Um resultado desses não se explica apenas pelos acertos de Trump. É preciso entender onde falharam os democratas. E a resposta, embora óbvia, não será facilmente admitida: os erros são muitos, mas todos podem ser resumidos na estratégia Joe Biden.

O que foi a estratégia Biden? Basicamente, a opção por um nome centrista, incapaz de polarizar uma discussão, avesso a assumir qualquer compromisso radical em qualquer pauta que lhe fosse apresentada. Baseado em compromissos com o status quo, mas também com a leitura ligeira da situação política, Biden foi apresentado como o candidato capaz de conquistar o centro. O homem que tiraria votos menos radicais de Trump e, por outro lado, não animaria os eleitores mais extremados da direita a se sentirem ameaçados a ponto de se engajarem na luta contra o comunismo e socialismo, o fantasma que ronda a política norte-americana desde o fim da Segunda Guerra Mundial. 

Não funcionou com Hillary Clinton, que adotou o mesmo discurso ao bater Bernie Sanders na convenção democrata, e não funcionou com Biden. Mesmo que Biden vença, ele deverá essa vitória não a seus méritos, mas à agressividade da covid-19. E, dessa forma, Trump e o trumpismo continuarão a ser uma força política poderosa nos Estados Unidos. 

Onde, então, falhou o Partido Democrata? 

A escolha centrista atrapalhou o partido mesmo em redutos tradicionais. Na Flórida, boa parte dos latinos bandeou para Trump. Biden não significava nenhuma esperança de vida melhor para eles, e numa situação dessas a política anticastrista de Trump operou como sempre. Para o eleitorado negro, Biden e Kamala Harris formavam uma dupla problemática, os políticos tradicionais que, de olho em eleitorados mais amplos, viraram as costas para a luta contra o encarceramento em massa. E para os trabalhadores brancos, seja nos estados industriais, seja nos estados agrícolas, o que mudaria com Biden? Quase nada. Nenhuma política explícita de aumento dos direitos trabalhistas ou uma política forte de elevação sistemática do salário mínimo. 

Biden não é igual a Trump. Sabemos que com ele a vida política norte-americana voltaria aos trilhos. O problema é, no caso, com que rumo. O que propunha Biden? Colocar os EUA no caminho que o país trilhava quatro anos atrás – que é, digamos assim, o caminho da catástrofe que levou a Trump. Nenhuma inversão de prioridades, nenhuma crítica ao sistema, nenhuma autocrítica concreta às políticas de Obama. 

Nos anos 1990 e começo dos anos 2000, o filósofo húngaro Isztván Mészàros afirmava que, se o assunto fosse distribuição de renda e percentual de população abaixo da linha da pobreza, os Estados Unidos eram um país do Terceiro Mundo. Com o fim do socialismo soviético, a expressão Terceiro Mundo caiu em desuso. Mas a situação não muda porque deixamos de usar algumas palavras. A situação dos pobres norte-americanos só piorou de lá para cá. Os democratas, em tese mais próximos dos trabalhadores, não adotaram políticas que mudassem isso significativamente. 

Nesse sentido, para os trabalhadores e marginalizados nos Estados Unidos, a diferença entre republicanos e democratas é simbólica. E entre um símbolo de força (Trump) e um de tibieza (Biden), perdoa-se todos os erros do histriônico e nenhum do cordato.

Gage Skidmore/FlickrCC
Mesmo que Biden vença, ele deverá essa vitória não a seus méritos, mas à agressividade da covid-19

Assim, uma vitória democrata seria pouco mais que um alívio. Mas, como foi imaginada e talvez se concretize, não será capaz de eliminar o sufoco mundial que significou o projeto Donald Trump. Claro que a ultradireita recua um pouco com uma eventual derrota trumpista, o espaço da política se repõe, novos caminhos para a relação com a América Latina são abertos, com o retorno de algumas regras de civilidade que haviam deixado de valer. 

Com doses altas de hipocrisia, com Biden voltaríamos a discutir problemas como covid-19, aquecimento global, embargo a Cuba, políticas de imigração, encarceramento em massa, negociações de paz no Oriente Médio. Nada de muitas esperanças, apenas a chance de tomarmos fôlego enquanto esperamos uma segunda onda direitista, eventualmente sob o comando do próprio Biden. 

Uma vitória de Biden, pelo menos tudo indica, seria insuficiente para reverter os processos altamente destrutivos que campearam nos governos de Bill Clinton e Barack Obama: a desestabilização permanente de países ao redor do mundo, política de Estado no pós-crise de 2008 que levou os Estados Unidos a derrubarem indiretamente inúmeros governos nas Primaveras Árabes; o apoio discreto na Europa e explícito na América do Sul a políticos de direita; o escamoteamento de toda e qualquer crítica à ditadura da burguesia financeira e industrial dos EUA contra os trabalhadores do próprio país. 

O conservadorismo oposicionista de Biden tenderia, portanto, a não resolver as contradições que levaram Trump ao poder. Ao contrário, a maior parte delas seria apenas renovada. Não significaria a morte do projeto da ultradireita, nem teria forças suficientes para romper com a vocação imperial e autoritária dos Estados Unidos. Esses projetos continuarão a circular nos EUA e no mundo, como fantasmas em busca de casas para assombrar. 

Há, no entanto, um novo componente em andamento nos EUA, que a disputa com a ultradireita e a arriscada opção democrata pelo centro acabou eclipsando: o crescimento de uma esquerda forte eleitoralmente nos Estados Unidos. Ainda que no topo a direção democrata seja ainda muito ligada ao grande capital financeiro, a base do partido caminha para posições mais radicais e realistas. Essa dupla vida democrata indica uma possibilidade de fratura no sistema bipartidário clássico. Só essa fratura pode reapresentar aos Estados Unidos algo que poderíamos chamar realmente de democracia. 

Assim, a esperança não estava na figura de Biden e a rigor nem mesmo na de Bernie Sanders, que representava a esquerda realmente progressista (mas não radical) norte-americana. Mas, sim, no processo de reorganização política que parece estar seguindo passos lentos, mas consistentes, no país. Com a vitória apertada de Biden ou com sua derrota, a direção democrata, que o candidato personifica tão bem, terá de lidar, já, com uma esquerda democrata muito mais atuante e que tem muito mais voz do que aquela que aceitou a guinada centrista de Barack Obama. 

Se Trump é o novo normal das milhares de mortes diárias da covid-19, Biden é o velho normal da política de um império em crise. O velho normal pode não ser tão terrível quanto o pesadelo dos anos Trump, mas também está longe de ser o mundo dos sonhos. E, para vencer a direita, não basta prometer o velho mundo, é preciso abrir caminhos para que os deserdados da terra imagine um mundo melhor e acreditem que ele é possível.

Eleições 2020 nos EUA

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Hoje na História

Hoje na História: 1920 - Império Otomano e nações aliadas da Primeira Guerra Mundial assinam tratado de paz

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O Tratado de Sévres pôs fim ao Império Otomano. Duro demais e impraticável, o documento despertou a ação dos nacionalistas turcos que se negaram a aceitá-lo, defendendo a independência turca

Max Altman

São Paulo (Brasil)
2022-08-10T14:15:00.000Z

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O Império Otomano, aliado da Alemanha durante a Primeira Guerra Mundial, assina em 10 de agosto de 1920 a paz em Sèvres (Hauts-de-Seine). Os Aliados impõem um desmembramento do Império Otomano, cujo território fica reduzido à Anatólia, ou península anatoliana, uma região do extremo oeste da Ásia que corresponde hoje à porção asiática da Turquia, em oposição à porção européia, a Trácia.

A Grécia ontem a costa do mar Egeu, a Armênia e o Curdistão obtêm o direito à independência e as províncias árabes são colocadas sob mandatos britânicos e franceses. Os nacionalistas turcos, comandados por Mustafá Kemal Ataturk, rejeitariam esse tratado. O tratado seria revisto em Lausanne (Suíça) em 1923.

O período final do Império Otomano aconteceu durante a Segunda Era Constitucional do Império Otomano. Durante a Primeira Guerra Mundial, na região do Oriente Médio, a batalha aconteceu entre as Forças Aliadas, formadas pela Grã Bretanha, França e Rússia e as Forças Centrais, formada basicamente pelo Império Otomano.

O Império Otomano foi bem-sucedido no início da guerra. Os Aliados foram derrotados nas batalhas de Galipoli, Iraque e Bálcãs. No entanto, alguns territórios anteriormente perdidos foram reconquistados. A Revolução Russa também foi um fator favorável para a reconquista de territórios Otomanos, como Trabzon e Erzurum. As ofensivas incessantes dos ingleses mostraram-se decisivas e o Império Otomano acabou sendo derrotado em 1917.

As tropas aliadas vitoriosas, lideradas pelo general inglês Edmund Allenby, com apoio das revoltas árabes e assistência da recém declarada República da Armênia, anexaram territórios otomanos.

O Tratado de Sévres pôs fim ao Império Otomano. Este tratado mostrou-se duro demais e impraticável, o que despertou a ação dos nacionalistas turcos que se negaram a aceitá-lo, passando a defender a independência da Turquia. Em resposta a tal partilha surge a figura do mito nacional Mustafa Kemal Pasha, logo renomeado Ataturk (Pai dos Turcos), mobilizando o nacionalismo turco e reorganizando parte do extinto exército otomano na Anatólia.

Wikimedia Commons/Cumhuriyet
Os quatro signatários do Tratado de Sévres, que entrou na história ao por um fim ao Império Otomano, em 1920

Vitorioso na luta da independência, que resultou na expulsão das forças aliadas, Ataturk funda a República da Turquia em 1922, tornando-se seu primeiro presidente. Muda o nome de Constantinopla para Istambul e transfere a capital para Ancara, no centro do país, além de extinguir os vestígios do sultanato otomano ao exilar o último sultão.

O tratado de Lausanne de 1923 reconheceu a Turquia em suas atuais fronteiras. Ataturk implantou reformas radicais no país: tornou a Turquia um país secular; unificou o sistema educacional e fez com que o turco passasse a ser ensinado no alfabeto latino em vez do persa-árabe, com o intuito de se alfabetizar a maioria da população; baniu o uso do véu feminino nas universidades e em locais públicos e concedeu às mulheres direitos civis iguais aos homens; aboliu os trajes típicos que expressavam a hierarquia religiosa e social dos cidadãos.

Para Ataturk, o fato de a Europa cristã ter tido sua super-estrutura (leis, escolas, comércio) drasticamente alterada por eventos como o Renascimento, o Iluminismo e a Revolução Francesa estabeleceu a diferença com o mundo islâmico, que preservara suas próprias estruturas em que a religião ainda determinava o funcionamento da sociedade e se constituiu na causa real do fim do império otomano.

O fato de tais reformas terem ocorrido muito rapidamente e sem consultas maiores aos líderes das antigas estruturas causou e ainda causa certa tensão entre uma sociedade mais modernizada, visível nos grandes centros urbanos, e outra mais apegada aos antigos costumes, no interior e em povoados afastados, que não as absorveram por completo. 

Cerca de 85% dos atuais 70 milhões de habitantes do país são turcos étnicos, 97% islâmicos, sunitas em sua maioria. Quatro milhões e meio vivem na capital Ancara e cerca de 12 milhões, vivem no coração cultural e econômico do país, na área metropolitana de Istambul.

Cerca de 12 milhões de turcos vivem fora do país, 3 milhões só na Alemanha. Persistem ainda três fontes de tensões internacionais: o conflito com a Grécia pelo Chipre; as rebeliões da minoria curda (12 milhões) por autonomia no sudeste do país e o reconhecimento turco do genocídio Armênio ao fim da primeira guerra mundial, quando 1.5 milhão de Armênios, que chegaram a compor 25% da população otomana, foram massacrados ou deportados.

(*) A série Hoje na Hist´ória foi concebida e escrita pelo advogado e jornalista Max Altman, falecido em 2016.

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