Com mais de 30 candidatos presidenciáveis, a RCA (República Centro-Africana) realiza nesta quarta-feira (30/12) eleições gerais que já foram adiadas cinco vezes por conta da violência que o país passa há quase três anos.
A última data agendada para a realização do pleito era o dia 27 de dezembro. Contudo, as autoridades tiveram que adiá-lo em virtude de problemas técnicos e de dificuldades de organização. Muitos materiais usados nos colégios eleitorais, por exemplo, chegaram só no dia 29.
Reprodução/Al Jazeera
Centro-africanos organizam colégios eleitorais para votação decisiva
“Desta vez, tudo estará certo e correrá bem na RCA”, assegurou à Al Jazeera Julius Rufin Ngoadebaba, porta-voz da Autoridade Nacional Eleitoral, rejeitando as acusações de que cédulas ilegais estariam sendo distribuídas na nação.
Entre os 30 candidatos em disputa, há alguns nomes conhecidos na política local, como o ex-primeiro-ministro Martin Ziguele, o ex-chanceler Karim Meckassoua e o filho do ex-presidente Bilal Desire Nzanga-Kolingba.
Quase 2 milhões de pessoas devem votar nesta quarta-feira, em mais de 500 colégios eleitorais espalhados pelo país.
Opera Mundi
Mapa apresenta localização da República Centro-Africana, a capital (Bangui) e seus limites fronteiriços no continente africano
“Nós estamos prontos e determinados a ir em frente com a votação deste dia 30 de dezembro, pois é a hora de nosso país sair desta longa crise para que os centro-africanos se reconciliem e vivam juntos novamente”, disse a estudante Mireille Djapou, de 26 anos, à Associated Press.
Histórico de violência
Desde que conquistou a independência da França em 1960, a República Centro-Africana manteve um panorama político instável, com sucessivas deposições e tomadas de poder com o passar das décadas.
Entretanto, um golpe de Estado em março de 2013 — que afastou o então presidente François Bozizé e declarou Michel Djotodia o primeiro líder muçulmano em um país de maioria cristã — levou o país a uma nova etapa de conflito.
NULL
NULL
Apesar das reservas de ouro, diamante, urânio e ferro, a RCA é um dos países mais pobres do continente africano. Para entender a atual dimensão do conflito é preciso compreender as condições a que o país estava submetido em 2013. Na liderança da nação desde 2003, Bozizé também virou presidente após um golpe.
Contudo, dez anos depois, o então presidente foi deposto, segundo Djotodia, “por causa da situação miserável” que deixou o país. Líder da milícia muçulmana Seleka, Djotodia também havia dito que ficaria no poder “o tempo que fosse preciso para estabelecer a paz”.
No entanto, a duração do governo Seleka foi efêmera. Como apenas 15% da população da República Centro-Africana é muçulmana, a entrada da facção no poder foi censurada pela maioria cristã – particularmente pela milícia cristã Antibalaka –, marcando o início da escalada de tensão no país.
H. Reichenberger/ ACNUR
Crianças centro-africanas refugiadas em Burkina Faso: conflito separou centenas de milhares de famílias
Djotodia renunciou no início de 2014 devido a fortes pressões internacionais e Bozizé nunca mais voltou desde que se exilou na República Democrática do Congo. Apesar disso, o derramamento de sangue continua até os dias de hoje e se aproxima cada vez mais da categoria de genocídio – em grande parte, por ser um dos conflitos mais ignorados no mundo contemporâneo.
A violência foi levemente apaziguada desde que Catherine Samba-Panza assumiu o Executivo de forma interina, em maio de 2014, entretanto, o número de refugiados e deslocados é preocupante.
“A verdade é que a RCA sempre foi um Estado falido e nunca deu muito certo”, relata o brasileiro Hugo Reichenberger, que foi funcionário do ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados) no país, em entrevista a Opera Mundi em 2014.
Com 4,5 milhões de habitantes, a RCA sempre teve tensões internas inconciliáveis, mas a atual situação tem alarmado as agências da ONU que trabalham para apaziguar o confronto na região. “A diferença entre o que acontecia antes e o que vemos agora é a intensidade: o número de vítimas e deslocados é muito maior e os níveis de brutalidade são incríveis”, explica Reichenberger.
EFE/ Arquivo
Catherine Samba-Panza, na ocasião de sua posse à presidência interina da República Centro-Africana