Os turistas que visitaram Paris nos últimos dias não tiveram sorte com as fotos: há uma semana a capital francesa está coberta por uma nuvem de poluição, o que dificulta a visibilidade e, sobretudo, exige cuidados com a saúde. O nível de poluição está três vezes mais elevado do que a recomendação da OMS (Organização Mundial de Saúde) e já teve picos ainda piores. Para tentar diminuir o trânsito na capital, um dos maiores causadores da poluição, o governo francês adotou a gratuidade dos transportes públicos e instaurou o sistema de rozídio de carros.
Amanda Lourenço/Opera Mundi
O calor incomum para esta época do ano é a causa principal do problema: “A ausência de vento somada a dias quentes e noites frias faz com que a poluição fique bloqueada em uma espécie de bolha sobre toda a região”, explica Anne Kauffmann, diretora adjunta da Airparif, associação que controla a qualidade do ar na região parisiense. “Ainda por cima, partículas vindas de outros pontos da Europa chegaram com o pouco vento que tivemos”, observa a diretora em entrevista a Opera Mundi.
[Névoa de poluição atrapalha a vista da Torre Eiffel, em Paris]
Na França, o alerta máximo é dado a partir de uma concentração de 80 microgramas de partícula PM10 por metro cúbico de ar (80 μg/m3), enquanto o objetivo de qualidade é não ultrapassar os 30 μg/m3. Porém, na última sexta-feira a concentração chegou aos 105 μg/m3. A partícula PM2,5,ainda mais perigosa por ser menor, medindo dez vezes menos do que a circunferência de um fio de cabelo, tem seus níveis de concentração em Paris também alarmantes. As partículas finas são facilmente inaladas e chegam até os pulmões, aumentando as chances de bronquite, asma, câncer, acidente vascular cerebral, entre outras doenças.
Apesar do perigo, muitas pessoas não conseguem sentir a diferença, como o estudante Julien: “Não posso dizer que seja algo que realmente me incomode, mas é verdade que quando olho para longe é como se tivesse uma nuvem de poeira na cidade”.
Em 2011, a Airparif publicou um estudo que aponta que o trânsito de veículos é responsável por 51% das partículas PM2,5 emitidas na região parisiense. Agindo nesta direção, o governo francês incentivou a população a deixar seus carros na garagem e a optar pelo transporte público, que, entre sexta e segunda-feira (17/03), foram gratuitos. O Vélib e o Autolib, serviços de aluguel de bicicletas e carros elétricos da prefeitura também foram liberados.
Ontem, as autoridades experimentaram o sistema de rotatividade de automóveis, só permitindo a circulação de carros que terminassem com placas ímpares. A medida funcionou: no horário de pico de ida para o trabalho, os engarrafamentos diminuiram de 250 quilômetros em um dia normal, para 90 quilômetros. Kauffmann confirma que a poluição também foi menor do que a esperada: “Sim, os níveis de poluição ficaram abaixo da expectativa, mas só no final da semana. Depois de testes, teremos certeza da responsabilidade do sistema de rodízio nesta melhora”.
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No entanto, nem todos gostaram da novidade. “Programei meu dia para fazer compras grandes e agora não posso sair de carro. Não dá para ir de metrô, mas também não quero arriscar uma multa, vou ter que ir outro dia”, se conforma Élisabeth, médica. Ela não quis arriscar, mas outras milhares de pessoas acabaram tendo que pagar a multa de 22 euros (cerca de 70 reais) por estarem com suas placas pares em via pública. Houve muita reclamação, já que os parisienses não estão acostumados com o sistema – a única tentativa precedente foi em 1997.
Amanda Lourenço/Opera Mundi
Policiais multam carro com placa de final par em dia de rodízio
Apesar da grande preocupação, a capital francesa não possui um histórico de poluição permanente, como é o caso de outras grandes metrópoles. O francês Pierre Alix, que mora há um ano na cidade de Jiaxing, a 50 quilômetros de Xangai, na China, estranha tanta precaução: “Uma taxa de 160 ou 170 μg/m3 aqui é o cotidiano, não há nenhuma medida especial para esse nível de poluição. Só quando a concentração passa dos 300 ou 400 que o pessoal começa a se preocupar. É engraçado de ver toda essa mobilização em Paris”.
Com a melhoria da qualidade do ar na região parisiense, o governo não renovou as ações para o restante da semana. Já na cidade de Grenoble, centroeste do país, a prefeitura copiou a gratuidade de transportes nesta terça-feira por causa da chegada da poluição por lá. O problema é que os motoristas marcaram uma greve para o mesmo dia e a previsão é que apenas a metade dos ônibus esteja em serviço.