A um ano das eleições presidenciais francesas, novos atores políticos já começaram a entrar em cena. O movimento L’appel du 21 avril (ou O Chamado de 21 de abril, em português), é um coletivo que convoca a
mobilização da sociedade civil para a renovação do quadro político do
país. São, em sua maior parte, jovens partidários dos ideais de esquerda
que querem evitar a repetição do resultado do primeiro turno das
eleições de 21 de abril 2002, que resultou em um duelo entre os
candidatos à presidência da direita, representada pelo presidente
Jacques Chirac (da UMP, União por um Movimento Popular), e da
extrema-direita, Jean-Marie Le Pen (da Frente Nacional).
O objetivo é, por um lado, garantir uma esquerda sólida, com um
candidato forte para disputar as eleições e, de outro, impedir a ida ao
segundo turno de Marine Le Pen, da extrema-direita, que vem seduzindo as
classes populares e apresentando bons resultados nas pesquisas de
intenção de votos.
O recente escândalo envolvendo o diretor-gerente do FMI (Fundo
Monetário Internacional), Dominique Strauss-Kahn, que responde a um
processo de abuso sexual em Nova York torna a necessidade do movimento
ainda mais urgente. Afinal, embora Strauss-Kahn nem sempre seja apontado
como um político de esquerda, o ainda pré-candidato socialista era,
segundo pesquisas de opinião, o nome mais viável para derrotar Nicolas
Sarkozy e a direita em 2012.
Luiza Duarte
Bruno Laforestrie, fundador do coletivo L'appel du 21 avril.
Nem partido, nem sindicato, o L’appel du 21 avril é uma rede de
ação cidadã que pretende usar a internet como sua maior arma. Site,
twitter e página facebook convidam os internautas a se unirem aos dois
mil signatários do grupo. Ações em universidades, manifestações
artísticas e encontros mensais também estão previstos para sensibilizar
cada vez mais pessoas.
Criado em outubro de 2010, ela se inspira na midiática organização liberal norte-americana MoveOn, que apoiou a candidatura de Barack Obama nos Estados Unidos com seus cinco milhões de membros.
“A gente não terá o apoio de um partido, mas é provável que nós
venhamos a apoiar um candidato. Queremos sim a adesão de personalidades
às ideias”, revela Bruno Laforestrie, diretor da rádio Générations FM e
fundador do coletivo.
Leia mais:
Ultradireitista francesa Marine Le Pen pede fim do FMI
Preso em Nova York, Strauss-Kahn renuncia à chefia do FMI
Maioria dos franceses acredita que Strauss-Kahn é vítima de complô Candidatura à presidência de Strauss-Kahn está 'seriamente comprometida', diz imprensa francesa
Diretor do FMI, Strauss-Kahn, é detido por suspeita de abuso sexual
Além de Nicolas Hulot, pré-candidato às eleições pelo partido
Europa Ecologia, e de Laurianne Denniaud, presidente do Movimento dos
Jovens Socialistas, o grupo é formado por estudantes, artistas,
jornalistas, moradores dos subúrbios e jovens empreendedores.
Esquerda unida
A maior das batalhas do coletivo é convencer os principais
partidos chamados de esquerda do país – PS (Partido Socialista), PCF
(Partido Comunista Francês) e Europa Ecologia – a realizarem primárias
abertas para definir um candidato único para as eleições de 2012.
“Assim, haverá uma verdadeira aliança em torno de um projeto”,
garante Baki Youssoufou, presidente da CNEF (Confederação Nacional de
Estudantes Franceses). “Quem ganhar escolherá a melhor equipe para
realizar esse projeto mas, se a aliança é feita depois, ela não será
sobre o projeto e sim sobre a vitória, quer dizer, como querem ganhar,
vão buscar votos com determinados partidos que vão impor o que querem
ter em troca no governo. Nós preferimos que isso se decida antes,”
insiste.
O líder estudante diz não querer escolher entre uma pessoa ou
outra e sim entre diferentes visões da sociedade “Dessa vez, nós
queremos ações que acompanhem as palavras, “argumenta.
Luiza Duarte
Baki Youssoufou, presidente da CNEF.
Ele afirma que os partidos veem com bons olhos o fato de haver
mobilização, mas que não escondem incômodo e desconfiança ao não
controlarem essas decisões que são tomadas fora de seus núcleos
partidários. Uma candidatura única da esquerda ainda está longe de se
tornar realidade, já que poucos estão dispostos a fazer as concessões
necessárias. Youssoufou reconhece, por exemplo, a improvável adesão da
extrema-esquerda, representada pelo Novo Partido Anti-Capitalista.
Gerações em conflito
“Nós somos pela dupla alternância, mudança de governo, mas também
cultural e de geração,” revela Laforestrie. Além da renovação pela
chegada da esquerda ao poder, o coletivo assina um pacto, que denuncia
um conflito de interesses entre as gerações e um desejo de maior
representatividade e participação da parte dos jovens.
Leia mais:
Charge: Dupla anti-imigração Sarkozy/Berlusconi
Imigrantes com doenças graves podem ser expulsos da França
Muçulmanas são detidas na França por usar véu islâmico
Marine Le Pen, da extrema-direita, lidera primeira pesquisa presidencial francesa
Sarkozy associa criminalidade a imigrantes e provoca polêmica na França
Em um país onde o voto não é obrigatório, a ida deles às urnas
será decisiva. Embora na última eleição presidencial os nascidos na
década de 70 tenham apresentado uma taxa de abstenção de 15,7%, em 2002,
a taxa atingiu 36,3% entre esses eleitores e é apontada como a causa da
chegada da extrema-direita ao segundo turno. “Se a juventude não se
mobilizar nas próximas eleições, levando em conta a estrutura etária da
França, será um voto conservador, em favor dos mais velhos,” acredita.
Preocupado com a sociedade francesa, o fundador do grupo acredita
que ela está “à beira de um terremoto”. Ele considera que há risco real
de um conflito entre as gerações, “entre os jovens que estão cada vez
mais sob pressão, mais pobres e sem um sistema de educação performático,
além de terem problemas para encontrar emprego, e uma geração que, em
breve, estará aposentada. São os “baby boomers”, nascidos no período
pós-guerra, e que beneficiaram de todo o sistema econômico e que hoje
não entraram em relação, em termos de transmissão, com as gerações
anteriores, “diz.
Inspiração das Américas
“Vocês foram mais rápidos no Brasil do que na França na
compreensão da miscigenação. No Brasil, mesmo se nas instituições isso
demore a mudar, não se suspeita de que alguém não é brasileiro pela sua
cor da pele. Na França, é preciso ainda justificar que se é francês,
mesmo depois de várias gerações,” acrescenta Youssoufou. Para ele, o
problema da não representatividade envolve também a negação da imagem da
nova sociedade francesa e de seus filhos de imigrantes.
A palavra de ordem deles é mudança. O ex-presidente Luís Inácio
Lula da Silva e o atual presidente americano Barack Obama são citados
como exemplos das mudanças que eles querem para a França. Políticos que
sejam símbolo de uma sociedade que se transformou e quer ser mais
representativa.
“Será que a gente quer criar uma Europa como Mônaco, onde haverá
apenas ricos, brancos e velhos, ou como o Brasil, onde haverá muitos
jovens e mestiçagem, que é a realidade agora? No entanto, nossos
dirigentes continuam no mesmo modelo, formados nas mesmas escolas e
vindos dos mesmos clãs,” questiona.
Não será necessariamente proposto um candidato da juventude, o
coletivo também diz não querem opor jovens e velhos. A ideia é forçar a
participação e reconhecimento de novas camadas da sociedade dentro do
debate político. Querem outra cara para o país, “para que, quando
olharmos a Assembleia Nacional francesa, ela se parece com a França de
hoje”, argumenta Youssoufou.
Siga o Opera Mundi no Twitter
Conheça nossa página no Facebook
NULL
NULL
NULL