O resultado das eleições legislativas na Argentina foi um golpe para o governo de Cristina Kirchner, sobretudo para seu marido Néstor Kirchner, derrotado na província de Buenos Aires, ao contrário do que previam as pesquisas. O ex-presidente, e agora deputado eleito, perdeu para uma coalizão de direita que teve como principal candidato o multimilionário peronista Francisco de Narváez.
Apuradas 96% das urnas, Narváez, da coligação União Pro, contabilizava 2,50 milhões de votos (34,58%), contra 2,32 milhões (32,11%) de Kirchner, da Frente para a Vitória.
Com a contagem de votos a ponto de acabar, já não havia dúvidas sobre a perda do controle das duas casas parlamentares, Câmara e Senado, por parte do governo. Isso o obrigará, a partir de dezembro, a desenvolver uma política de alianças muito mais ampla do que a atual.
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Durante a tarde de domingo (28), o kirchnerismo se aferrou às pesquisas de boca de urna, que o apontavam como ganhadores na província de Buenos Aires, principal distrito eleitoral do país, por seis pontos percentuais. Mas desde a primeira urna contabilizada, o resultado foi adverso. Na madrugada, ele reconheceu que havia sido derrotado “por um pouquinho”.
Kirchner buscou não dramatizar o revés eleitoral. Sustentou que “lutamos com muita dignidade em uma eleição que foi muito apertada”. Preocupou-se em esclarecer que aceitou sem desculpas a vontade popular e se diferenciou da oposição. “Se tivesse ganhado o peronismo por dois pontos, nos teriam acusado de fraude. Mas nós garantimos a transparência destas eleições”, disse, referindo-se a denúncias de possíveis fraudes feitas por partidos da oposição dias antes da eleição.
Os primeiros efeitos da derrota já apareceram. A ministra da Saúde, Graciela Ocaña, pediu demissão e o próprio Kirchner deixou a presidência do Partido Justicialista (Peronista). Ele será substituído por Juan Manzur, atual vice-governador de Tucumán, província do norte argentino.
“Estas eleições resultaram em um forte chamado de atenção para o governo, que deve entender que se rompeu o contrato social que tinha com a classe média, a mais favorecida pelo modelo kirchnerista”, disse ao Opera Mundi Alberto Fernández, ex-chefe de gabinete tanto de Nestor quanto de Cristina Kirchner.
Mas ele considera que nem tudo está perdido. “Em 2003, quando Kirchner chegou ao governo, não tínhamos um só deputado que nos representava e assim mesmo governamos. Agora temos que oxigenar o governo e começar a caminhar de novo, escutando o que se diz na rua e buscando novamente consenso no Parlamento para seguir governando”.
A versão de Cristina
A presidente Cristina Kirhner minimizou o impacto da derrota e afirmou que a nova composição do Congresso “vai exigir acordos por parte de todos”. “Deveremos negociar como acontece em todos os outros parlamentos”, disse durante sua segunda coletiva de imprensa desde que assumiu a presidência, em dezembro de 2007.
Cristina descartou a possibilidade de remodelar seu ministério para acomodar membros da oposição. “Não vejo por que o resultado das eleições tenha que provocar alguma mudança de gabinete”.
A presidente argumentou que, apesar da derrota em distritos-chave, o cômputo geral dos votos coloca o governo numa situação não tão desfavorável.
Oposição pensa em 2011
Do lado da oposição, que festejou durante a madrugada, todos destacaram que o resultado em nada complica a continuidade e a estabilidade do governo nacional. Mas não esconderam que já pensam no novo cenário político que se desenha para as eleições presidenciais de 2011. O vice-presidente Julio Cobos, rompido com o governo de Cristina Kirchner, começou a elaborar sua estratégia presidencial após seu partido, o novato Confe (Consenso Federal), vencer com folga na província de Mendoza, governada por ele até 2007.
Outro presidenciável é o senador peronista e ex-piloto de Fórmula 1 Carlos Reutemann, que renovou sua bancada na província de Santa Fé ganhando do oficialismo local, liderado pelo governador socialista Hermes Binner. O terceiro aspirante à Casa Rosada é Mauricio Macri, prefeito da capital federal e líder da aliança direitista Unión PRO, que ganhou em seu distrito e, efetivamente, na província de Buenos Aires, na aliança liderada por Narváez.
Carrió
O resultado eleitoral deixou entre os participantes sabores doces, amargos e também agridoces, como é o caso do Acordo Cívico e Social. A coligação teve um considerável crescimento na Câmara de Deputados, passando de 57 para 80 cadeiras (veja gráfico abaixo). Mas ficou em terceiro lugar na capital federal por um partido novo, o Projeto Sul, conduzido pelo cineasta Fernando “Pino” Solanas.
Trata-se de uma coalizão instável, que ainda não definiu quem é de fato seu líder. Na prática, exercem essa função a ex-radical conservadora Elisa Carrió, o atual presidente da União Cívica Radical (UCR), Gerardo Morales, e o vice-presidente do país, Julio Cobos. Cobos aumentou seu capital nessa disputa ao vencer na província de Mendoza, resultado melhor que o obtido na capital.
Veja gráfico sobre a composição da Câmara antes e depois das eleições, divulgado pela agência Telam.
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