A guaricica é uma árvore encontrada na Mata Atlântica brasileira que chega, em média, a 15 metros de altura e pode ter cerca de 44.3 centímetros de diâmetro. Aplicadas a uma equação matemática, os números revelam que a espécie pode resgatar 100 quilos de carbono da atmosfera. A capacidade de cada uma multiplicada por dez é igual a uma tonelada de CO2 – o principal gás causador do efeito estufa. Cada tonelada de carbono já pode ser negociada na Bolsa de Chicago pelo valor aproximado de 10 dólares.
Uma guaricica, portanto, vale um dólar.
As mudanças climáticas resultaram na criação de um negócio bilionário. Com o mercado de carbono, que permite que empresas poluidoras comprem cotas de emissão em outras partes do mundo, cada vez mais as árvores têm se transformado em commodities. Em diversas regiões do Brasil, elas já têm proprietários e números de identificação.
Na Dinamarca, país que sedia a conferência das Nações Unidas sobre mudança climática (CoP-15), até os taxis já participam da corrida por um lugar na “economia verde”. Adesivos dentro dos carros trazem uma mensagem garantindo que os veículos não emitem carbono. A princípio, parece propaganda enganosa, já que os carros são abastecidos com gasolina. No entanto, a empresa de transporte conquistou a marca de sustentabilidade por ter compensado suas emissões comprando créditos de carbono.
Um novo mecanismo de regulação promete criar ainda mais oportunidades para os países com grande quatidade de florestas, como o Brasil.
O Reed (Redução das Emissões causadas por Desmatamento e Degradação) ganhou força nas negociações da conferência em Copenhague e já deve ser incluído no novo acordo que substituirá o Protocolo de Quioto em 2012.
“As conversas estão avançadas e estamos convencidos de que o mecanismo terá força de lei dentro de três anos”, afirma John O. Niles, diretor da ONG Tropical Forest Group.
A proposta
O objetivo do Redd é criar valores econômicos para compensar a preservação das florestas e evitar desmatamentos. Pela proposta, as pessoas ou organizações que preservarem florestas devem receber uma compensação financeira simplesmente pelo fato de evitar a destruição ecológica. Paralelamente, o carbono “sequestrado” por essas florestas seria negociado no mercado, transformando o Redd em um negócio duplamente lucrativo para os países em desenvolvimento.
A ideia é fazer com que a preservação das florestas proposta pelo Redd seja responsável por 10% do total das metas de redução de carbono estabelecidas pelos países. Se uma nação se compromete a reduzir os níveis de emissão de CO2 em 30%, por exemplo”, um adicional de 3% deverá ser direcionado apenas para redução de emissões ligadas a programas de Redd.
“O Redd pode criar uma nova lógica econômica. Quem hoje desmata não faz isso por estupidez, mas porque existe uma economia que depende desse ciclo. O principal desafio hoje é superar o custo-oportunidade do desmatamento e fazer com que quem desmata possa ter lucro com a preservação”, explica o João Tezza, diretor técnico-científico da Fundação Amazonas Sustentável.
Atualmente, o Protocolo de Quioto não reconhece o Redd como um mecanismo legal, embora já exista um mercado voluntário atuando no setor. Prevê apenas a concessão de créditos de carbono para o reflorestamento de áreas degradadas, dentro da regulação dos MDL (Mecanismos de Desenvolvimento Limpo).
Perigos
A definição da ONU sobre o que é considerado como “floresta” ainda é confusa. Um dos critérios usados é a altura das árvores. Dentro desse ítem, gera-se uma controvérsia: plantios de eucalipto, por exemplo, poderiam ser considerados “florestas em pé”. Entretanto, essa regiões são constantemente desmatadas: empresas produtoras de papel cortam as árvores, utilizam a celulose e refazem o plantio. O ciclo se repete a cada cinco anos, aproximadamente – o que gera uma alto índice de emissões de carbono.
Se a legislação do Redd não for mais restrita e específica, existe o receio de que os grandes responsáveis pelo desmatamento no presente e no passado sejam os maiores beneficiários do programa.
Corrida por terras
Enquanto isso, comunidades indígenas, que sempre primaram pela preservação, correm o risco de perder o pouco de terras que ainda possuem.
“Quase 80% da Amazônia não estão territorializados. Se o Redd for oficializado como um mecanismo de comercialização de carbono, haverá uma corrida contra o tempo para conseguir comprar terras na floresta amazônica. É preciso garantir a existência da selva, mas devemos rechaçar o Redd como mais um mecanismo do capitalismo verde”, afirma a ativista Daiana Mezzonato, representante na CoP-15 da Via Campesina e do Movimento dos Sem Terra.
Um documento da Global Forest Coalition, uma associação de ONGs ambientalistas, defende que legislação do Redd inclua tópicos específicos que protejam populações indígenas e comunidades que vivem em áreas florestais.
Segundo os ambientalistas, o maior desafio do Redd é garantir que o dinheiro a ser investido nos projetos de preservação chegue às mãos de quem realmente preserva as matas, e não nas de políticos corruptos ou de instituições de pouca credibilidade.
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