O tempo para salvar o Chaco paraguaio está acabando, adverte ao Opera Mundi Rafael González, diretor de Áreas Protegidas da Secretaria de Ambiente do Paraguai (SEAM) e um dos maiores conhecedores da região. Ele afirma que, segundo sua experiência, um milhão de hectares, cerca de 10% do bosque chaquenho, desapareceram nos últimos quatro anos, embora não existam cifras oficiais. O fenômeno é provocado por estrangeiros que compram terras para transformá-las em pastos e exportar carne para a Europa.
Alfonso Daniels/Opera Mundi
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González também observa que, se não houver ações logo, o Chaco paraguaio desaparecerá em 20 anos. Ele confia nas reuniões que se realizam nestes dias na região entre o governo e todos os grupos interessados para compatibilizar o desenvolvimento do gado com a preservação, mas admite que isso será difícil.
São confusas as cifras de desmatamento do Chaco paraguaio. Com quais vocês lidam?
Não existem cifras oficiais. Temos um acordo com a ONG Guyra Paraguay para fazer um monitoramento com o grupo e a cifra que ele calcula é de quatro mil hectares desmatados por mês. Chegamos a um acordo com o governo japonês, que nos dará sete milhões de dólares para monitorar o desmatamento, e esperamos ter cifras oficiais no fim do ano.
É verdade que, como dizem alguns meios, segundo imagens de satélite, 10% do Chaco foi desflorestado nos últimos quatro anos?
Em minha experiência, definitivamente é uma cifra realista. O desmatamento aumentou muito, por exemplo, por causa de compradores de terra uruguaios no norte chaquenho e da chegada contínua de brasileiros. Suas famílias crescem e buscam terras em outras áreas com empréstimos de bancos brasileiros. No Uruguai, a terra é dez vezes mais cara do que aqui e, em outros países, a diferença é ainda maior.
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A lei diz que 25% da terra comprada não pode ser desmatada. Ela está sendo cumprida?
O panorama não é tão sombrio. Em anos anteriores, o desmatamento ilegal era enorme. Agora há cada vez mais pressão dos cidadãos denunciando o desflorestamento ilegal, há mais conscientização sobre o problema com a ajuda da tecnologia. Nos últimos dois anos, vimos que a lei está sendo muito mais respeitada, mas ainda falta presença do Estado. Por sorte, ainda não chegamos ao extremo do que ocorreu no leste paraguaio, onde houve uma invasão da soja, um verdadeiro laissez-faire que acabou com tudo.
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Embora a lei dos 25% esteja sendo mais respeitada, o fato de que 10% do Chaco foi desmatado em apenas quatro anos indicaria que o problema continua?
É preciso mudar a lei, sem dúvida. Falar, por exemplo, de 25% para manter o ecossistema do Chaco é insuficiente. É preciso exercer uma forte pressão para que haja verdadeiros corredores biológicos e consolidá-los. Do contrário, será impossível proteger o ecossistema. E quanto aos índios ayoreo, é preciso lhes oferecer soluções, para que eles não precisem depender só da caça e da produção de carvão.
Você é otimista sobre o futuro do Chaco paraguaio?
Devemos ser otimistas, mas o Grande Chaco paraguaio chegou ao limite, não temos muito tempo para agir e, se não fizermos algo, ele desaparecerá em 20 anos. Dentro de cinco anos os programas deveriam estar estabelecidos. Os grandes problemas são a mudança de uso das terras (transformação de bosques em pastos) e a abertura de caminhos que atravessam o Chaco e facilitam o acesso.
Agora há um grande comitê para retomar a criação de uma reserva da biosfera da Unesco e voltar a instalar o comitê da biosfera que servirá de vínculo com a sociedade e garante o cumprimento da lei. Daí poderão sair propostas para modificar as leis, mas será muito difícil. Os menonitas, por exemplo, mantêm um negócio de desmonte (maquinário, plásticos e outros materiais que vendem para desmatamento) que movimentou US$ 90 milhões em 2008-2009, e o preço da carne continua aumentando. Agora temos dois grandes parques naturais. Se não fizermos nada, eles se transformarão em ilhas. A carne do Chaco paraguaio prejudica a humanidade. Isso tem de mudar.
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