Os Estados Unidos devem enviar mais 30 mil soldados para o Afeganistão este ano, começando em abril. Mas o aumento de contingente pode ser insuficiente para conter o avanço do Talibã e o crescimento das plantações de papoula e da produção de heroína.
A ideia não é nova. Foi uma das promessas de campanha do presidente Barack Obama e será anunciada nesta semana, segundo a imprensa norte-americana divulgou hoje. A contrapartida seria uma retirada completa do Iraque em menos de 16 meses. Mas especialistas acham que com o aumento do teatro de operações no Afeganistão, fruto de uma estratégia errada herdada da administração anterior, e a ineficiência do governo do presidente Hamid Karzai, o envio de dois batalhões não é suficiente.
Entre outras coisas, porque a reconstrução do Afeganistão não está dando o resultado desejado. O Talibã se aproveitar das dificuldades e toma posições. Por exemplo, a maior estrada do país, reconstruída pelo exército norte-americano, entre Cabul e Kandahar, transformou-se num dos pontos preferidos de ataques quando o tráfego aumentou.
“O presidente Bush deixou um plano errado no Afeganistão. Concentrou-se em criar uma democracia reconstruindo o país, mas deixou de lado o combate ao Talibã. De modo que agora, por uma questão de prestígio e porque não pode parecer débil, Obama não tem outra alternativa que enviar mais tropas”, explicou o analista Daniel Alvarez ao Opera Mundi.
“Mas com a corrupção governamental no Afeganistão, é obvio que 30 mil soldados adicionais não são suficientes. Se nos últimos cinco a seis anos, o exército do Afeganistão não fez nada, são os estrangeiros que tem de fazer tudo e levar o combate por si sós”, acrescentou o analista, da Universidade Internacional da Flórida.
Alvarez recorda que o próprio general David Petraeus, chefe do Comando Centro, pediu a Obama que enviasse mais tropas, mas o presidente decidiu ficar nos 30 mil. “Obama prometeu isso na campanha. Se não cumpre, perde prestígio num momento em que os Talibãs estão se fortalecendo. Se o presidente não avança com mais tropas, corre seriamente o risco de afundar o país no Afeganistão. Lembre que nem os soviéticos puderam com os afegãos”.
A Guerra do Afeganistão durou de 1979 a 1988, quando tanques e soldados russos deixaram de vez o território afegão. Sob a conjuntura da Guerra fria, a Rússia apoiava os líderes marxistas do governo, enquanto os Estados Unidos financiavam grupos rebeldes.
Como os tempos mudaram, a Rússia agora se diz aliada. O presidente Dimitri Medvédev afirmou hoje que seu país, e outros aliados da velha era soviética, querem ajudar os Estados Unidos a “estabilizar” o Afeganistão. Segundo ele, Moscou quer colaborar “totalmente” com Washington nesse aspecto.
Mas ontem a república do Quirguistão anunciou que pretende acabar com uma base militar norte-americana em seu território, que é um importante centro de abstecimentos, depois que Moscou prometeu um empréstimo de US$ 2 bilhões. O fechamento da base de Manas poderia colocar em risco o plano de Obama de enviar mais 30 mil soldados para o Afeganistão.
“A Rússia e outros [aliados seus] estão prontos para colaborar totalmente com os Estados Unidos e outros membros da coligação na luta contra o terrorismo na região. Esta luta tem de ser total e incluir componentes militares e políticos, só assim terá êxito”, disse o presidente russo.
Medvedev não esclareceu a imprensa local russa se espera alguma compensação por parte de Washington pela colaboração “total”.
Esforços “fragmentados”
Os Estados Unidos já gastaram US$ 32 bilhões no Afeganistão. Outros US$ 30 bilhões foram aportados pelos demais países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Mas segundo o general Arnold Fields, inspetor geral da reconstrução, esses esforços estão “fragmentados e com falta de coerência”. “Temo muito que essa estratégia tenha grandes defeitos”, afirmou num relatório divulgado pelo Pentagono no fim da semana passada.
Os 30 mil soldados que serão enviados em abril e agosto – para um total de 90 mil tropas estrangeiras no país – vão ser estacionados nas zonas de produção de papoula para controlar o tráfico de heroína ao longo do vale do rio Helmand, na fronteira com o Paquistão, ao norte, e na região de Farah, ao sul. Uma fonte militar disse ao Washington Post que o plano é estacionar esses soldados em zonas afastadas da capital Cabul, onde o exército do país não consegue chegar.
Segundo estatísticas da Otan, 19 das 20 áreas de movimentação do Talibã são rurais. A região metropolitana mais perigosa é Kandahar, mas está em 13º lugar, enquanto Cabul está em 42º.
Por outro lado, soube-se da existência de um relatório secreto do Pentágono, que aconselha Obama a mudar completamente a estratégia militar, diminuindo o ênfase na reconstrução e concentrando os esforços no combate ao Talibã e à Al-Qaeda dentro do Paquistão, com a ajuda do exército desse país.
Aparentemente o projeto, que ainda não foi enviado à Casa Branca, reflete a preocupação das chefias militares norte-americanas no Afeganistão de que os planos deixados pelo ex-presidente George W. Bush os obrigam a fazer mais do que realmente podem fazer, disse a agência Associated Press.
O novo plano que os militares propõem aconselha a realização de um esforço mais preciso para acabar com os redutos talibãs na fronteira com o Paquistão, mas não fala de aumento de tropas, segundo fontes que o leram, mas não quiseram se identificar por não terem autorização para falar publicamente do assunto.
“Aumentar as tropas só seria uma solução se fossem concentradas onde está o inimigo: nas zonas rurais”, disse uma das fontes.
Dois dias na região para “escutar”
O representante especial dos Estados Unidos para o Afeganistão e Paquistão, Richard Holbrooke, viajará nos próximos dias a esses dois países e depois à Índia, em sua primeira visita de “orientação” à região do sul da Ásia, segundo a agência EFE.
O representante, que assumiu o cargo em 23 de janeiro, considera seu primeiro contato com a região como uma viagem de “orientação”, na qual não transferirá às autoridades “nenhuma mensagem do governo, nem da secretária de Estado, Hillary Clinton, nem do presidente Barack Obama”, segundo o porta-voz adjunto do Departamento de Estado, Robert Wood. “Não vai para conversar, mas para escutar” as partes.
Apesar de a Índia não fazer parte da abrangência da missão de Holbrooke, os EUA consideram que é “um país importante na região e tem interesses no Afeganistão”, destacou Wood. Portanto, Holbrooke “quer ouvir a opinião do governo indiano a respeito de como podemos contribuir melhor para a paz e estabilidade no Afeganistão”.
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