Conhecido por participar de filmes produzidos em Hollywood, o ator Jackie Chan tem se aproximado cada vez mais do Partido Comunista chinês com suas críticas ao governo dos Estados Unidos.
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Depois de pedir que o governo de Hong Kong, sua cidade natal, decretasse o que pode ou não ser motivo de protesto público, o ator de 58 anos avança em seu discurso alinhado com Pequim ao criticar os Estados Unidos e os chineses que reclamam do país com estrangeiros.
“Nosso presidente já admitiu que temos corrupção, mas estamos progredindo e aprendendo. Não há corrupção no resto do mundo?”, indagou Chan em um programa da Phoenix TV, em Hong Kong, na semana passada. “América (sic)? O país mais corrupto do mundo”, concluiu o ator.
Chan já é conhecido por ser um porta-voz informal da China, um ávido defensor do Grande Irmão. Em 2005, ele estrelou um comercial de televisão para promover em Hong Kong o hino nacional chinês (“A marcha dos voluntários”). A peça, criada por oficiais mandarins, estava voltada à promoção do nacionalismo na ilha, com características da China continental.
Acostumada às liberdades moldadas por 150 anos de governo britânico, Hong Kong é palco de dezenas de protestos semanais contra a reunificação total à China, que acontecerá em 2049. E eles são também alvo de críticas do ator. Em uma entrevista concedida ao jornal Southern People Weekly, Chan reclamou de sua cidade natal, dizendo que “Hong Kong virou uma cidade de protesto”.
“As autoridades deveriam estipular os assuntos sobre os quais as pessoas podem protestar ou não”, acrescentou, referindo-se às críticas locais a Pequim. Desde que foi devolvida à China, em 1997, Hong Kong tornou-se uma Administração Especial chinesa sob a política “um país, dois sistemas”, em que mantém controle total sobre seu governo até ser reintegrada em definitivo à China continental.
Em outubro do ano passado, quando a censura sobre a internet na China foi aprofundada, Chan assumiu a postura de um representante extraoficial da Great Firewall (mecanismo usado pelo governo mandarim para bloquear o acesso a sites proibidos) e questionou se liberdade era algo positivo para um país. Já em 2009, durante um festival de cinema em Hainan, o ator dissera que “liberdade demais pode ser muito caótico. Os chineses precisam ser controlados ou eles farão o que quiserem. Se não podemos terminar como Taiwan”.
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As críticas aos Estados Unidos não abalam a fama de Jackie Chan. O ator tem uma fortuna estimada em US$ 130 milhões, construída fortemente em seus filmes produzidos por Hollywood. Para os fãs, as investidas políticas do astro não contam muito para a opinião pública norte-americana.
“Eu prefiro não comentar sobre as posições políticas do ator”, declara Joy C. Al-Sofi, presidente do Fã Clube de Jackie Chan, EUA. “Somos fãs de artistas em função do seu talento e da alegria que nos dão, e não por suas visões políticas e sociais”, acrescentou.
Soft power às inversas
Ao lado do diretor Ang Lee, Chan é um dos poucos artistas chineses reconhecidos no exterior como uma personalidade. Ainda que extraoficialmente, o ator serve como uma arma da China em sua busca por soft power (a diplomacia cultural). Analistas norte-americanos, porém, apontam que os comentários de Chan contra a Casa Branca e seus mandatários podem vir a jogar contra as relações entre os dois países.
Poderá Chan então estar prestando um desserviço ao Partido Comunista chinês em época de transição de governo – um momento sensível para a política nacional? É bem possível que a resposta seja sim. A China exporta produtos culturais em grandes quantidades, mas tem ainda pouca recepção no ocidente. A maior razão para isso é o envolvimento do Estado na venda da cultura chinesa ao mundo – ainda dominada por símbolos tradicionais, como a dança do dragão e os Institutos Confúcio.
Chan, com seu humor e habilidade no kung fu, é um representante positivo e alegre para um governo conhecido por sua incapacidade de sátira sobre si mesmo. O China Daily, o maior jornal oficial publicado em inglês (e com edições nos EUA, Europa e África), publicou em setembro do ano passado um editorial em que dizia que a política de soft power chinesa era incapaz de criar um Gangnam Style por sua falta de humor.
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