Nenhum nome se diferencia tanto dentro do elenco da seleção chilena de futebol quanto o do volante Jean André Emanuel Beausejour Coliqueo. Símbolo da miscigenação, ele é filho de pai haitiano e mãe mapuche, e se tornou ícone de duas comunidades que sofrem preconceito no Chile.
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Beausejour em partida entre Chile e Inglaterra, em novembro de 2013. Imprensa chilena o chama de “afro-mapuche”
Beausejour é um dos primeiros filhos de imigrantes haitianos nascidos em Quilicura – uma humilde comuna de Santiago que cresce ano após ano – e passou por altos e baixos na vida. Quando jovem, não foi convocado para seleções juvenis chilenas e passou quase despercebido pelas categorias de base de três times universitários no país: Universidad de Chile (onde ficou alguns meses), Universidad Católica (dois anos) e Universidad de Concepción.
Sua carreira só começou a ter algum destaque quando compôs no segundo semestre de 2005 o elenco do Grêmio, da cidade de Porto Alegre, onde ajudou na conquista do título da Série B.
Somente então começaram a surgir as primeiras convocações para a seleção chilena. E na África do Sul, em 2010, o volante se tornou o primeiro jogador negro a defender o Chile numa Copa do Mundo. Curiosamente, Beausejour marcou o primeiro gol do Chile no mundial realizado no continente negro, na vitória de 1×0 contra Honduras, na estreia dos sul-americanos no torneio.
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Não seria a única façanha com a camiseta vermelha. Na estreia do Chile nesta Copa, contra a Austrália, em Cuiabá, Beausejour fechou o placar do jogo com um chute cruzado, aos 44 do segundo tempo, para garantir a vitória por 3×1. Nunca um jogador chileno havia marcado gols em duas Copas diferentes.
A esperança de Quilicura
“Afro-mapuche”, é o apelido que a imprensa esportiva chilena costuma usar para Beausejour, que tenta conciliar a vida de jogador profissional com a do ídolo dessas duas comunidades. Atualmente no elenco do Wigan Athletic, da segunda divisão da Inglaterra, o jogador faz sempre duas visitas obrigatórias nos períodos de férias no Chile.
A primeira, na região de Alto Huilío, na Araucania (região patagônica chilena), onde estão os familiares maternos, de etnia mapuche. Beausejour não é o único jogador chileno com raízes indígenas – o atacante Alexis Sánchez e o meia Arturo Vidal, são descendentes de povos indígenas do norte do país – mas é sim o único cujas raízes são ligadas aos mapuche, a comunidade indígena mais numerosa do Chile atual.
Gol de Beausejour contra Honduras, em 2010:
Porém, é com os haitianos de Quilicura que ele se sente mais à vontade, ou pelo menos é o que diz Youri Filien, amigos pessoal e dono do primeiro restaurante haitiano do Chile e organizador de algumas das festas realizadas pela comunidade na comuna. Em algumas delas, Beausejour aparece como convidado surpresa para a alegria das crianças haitianas, que vêm nele o seu principal ídolo.
“Não sei se é o suficiente para que ele seja um ídolo haitiano, apesar de ele sempre ser muito enfático no orgulho que tem das suas raízes, mas não há dúvidas de que ele é o grande ídolo das crianças haitianas de Quilicura”, afirma Filien, ressaltando que Beausejour não é só um ídolo esportivo. “Ele também foi criança aqui na comuna, sofreu o mesmo preconceito e venceu na vida. Essa esperança é o que ele entrega de melhor pros pequenos. Vemos como alguns se emocionam nas visitas, sonham em ser como ele”.