A decisão do governo federal de suspender as renovações automáticas para as licenças de importação de produtos perecíveis da Argentina, na semana passada, causou novos problemas nas relações comerciais com o país vizinho, mais visivelmente uma longa fila de caminhões esperando autorização para cruzar a fronteira.
A mercadoria começou a ser barrada pela alfândega brasileira há seis dias. Hoje (28), há cerca de 400 caminhões argentinos carregados de produtos frescos – como maçãs, pêra, alho, ração para animais, azeite e vinho –, além de 27 mil toneladas de farinha de trigo, das 600 mil toneladas desse produto que entravam anualmente no mercado brasileiro, informou a Federação Argentina da Indústria Moleira.
O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, afirmou hoje que a medida tomada pelo governo brasileiro tem como objetivo fazer uma análise mais profunda no comércio bilateral com a Argentina. Ele frisou que este é um direito soberano do país para ver como se comportam as importações.
O governo brasileiro espera que, com a exigência de licenças não-automáticas nas importações de produtos argentinos, a Casa Rosada volte atrás nas medidas protecionistas que tem tomado, que incluem o retardamento da liberação de mercadorias exportadas pelo Brasil.
A Argentina exige licenças prévias para a importação de 800 produtos brasileiros, que valem para sete setores: eletrodomésticos de linha branca (geladeiras, por exemplo), linha marrom (eletrônicos), autopeças, calçados, têxteis e confecções, vidros e siderúrgicos.
Segundo o especialista em comércio Dante Sica, ex-secretário de Indústria da Argentina que atualmente dirige uma consultoria, as medidas de restrição argentinas atingiram 17,3 % das importações locais feitas do Brasil.
Indagado sobre se as licenças não-automáticas seriam uma política de retaliação, o ministro Miguel Jorge respondeu que “não se pode falar em retaliação”.
O governo de Cristina Kirchner tem feito críticas ao Brasil e considera “inaceitável” a determinação brasileira de barrar as mercadorias. Em reunião realizada ontem em Buenos Aires, o secretário argentino de Relações Econômicas Internacionais, embaixador Alfredo Chiaradía, pediu ao embaixador do Brasil no país, Mauro Vieira, que libere os caminhões. Segundo fonte da chancelaria argentina entrevistada pela Agência Estado, Chiaradía classificou a medida como uma “retaliação desproporcional”, comparada às barreiras que a Argentina adota contra os produtos brasileiros, já que não incluem produtos frescos.
“A ausência de aviso prévio para frear a entrada de produtos perecíveis, os quais já saíram de suas origens e não podem regressar, torna a medida desproporcional”, disse.
Em nota emitida pela Embaixada do Brasil, Mauro Vieira afirma que “alertou para a inconveniência de que se perpetuem indefinidamente mecanismos de controle de importações, uma vez que podem acarretar desvio de comércio para terceiros países e entorpecer o fluxo comercial bilateral”.
Fluxo
O ministro argentino da Economia, Amado Boudou, disse que os dois países já estão dialogando para resolver o impasse, e que apenas parte das negociações bilaterais causa problemas.
“Nos demos conta de que apenas 6% do total de comércio bilateral apresentavam algum nível de conflito, e são justamente os temas que hoje ganham atenção porque são os que devemos resolver”, disse Boudou ao jornal argentino Página 12.
Apesar das declarações do ministro da Economia, os produtores de frutas estão preocupados. O Brasil recebe 30% da exportação da Argentina, embora o país venda também para outros 64 mercados.
As preocupações do governo brasileiro se fundamentam na diminuição de 43% das exportações para a Argentina no primeiro semestre de 2009, em comparação com a queda de 19% das exportações da Argentina para o Brasil no mesmo período.
Ainda assim, de janeiro a setembro, a balança comercial entre os dois países é favorável ao Brasil em 367 milhões de dólares.
Diplomatas em Buenos Aires, no entanto, consideram que existe “uma acentuada assimetria” entre as medidas do Brasil e as da Argentina, “que são anunciadas com tempo antes de entrarem em vigor”.
Argentina e Brasil mantêm uma política de monitoramento contínuo de seu comércio bilateral para ajustar eventuais desequilíbrios, através de um sistema do qual participam empresários dos dois países.
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