O conflito na Faixa de Gaza deixou cerca de 1.400 palestinos e 13
israelenses mortos, além de um rastro de destruição. Para que tanto
sofrimento? Segundo Fred Halliday, da London School of Economics, um
dos analistas com maior reputação para falar sobre o Oriente Médio, a
guerra não serviu para praticamente nada.
Em entrevista exclusiva ao Opera Mundi,
o irlandês Halliday avalia que Israel tem razão em se declarar
vitorioso ao forçar que o grupo palestino Hamas, que controla Gaza,
retome o cessar-fogo que havia expirado em dezembro. Mas ressalta que o
Hamas saiu fortalecido politicamente, ao contrário da facção rival
Fatah, que controla a Cisjordânia, desprestigiada por não ter feito
nada para deter os ataques israelenses.
Tudo isso ocorre tendo como pano de fundo a disputa
regional entre Israel e Irã, que apóia tanto o Hamas quanto o Hizbollah
no Líbano. Disputa que, na opinião dele, não deve terminar tão cedo.
Sobre a possibilidade de haver alguma esperança de paz
na região no mandato do novo presidente dos Estados Unidos, Barack
Obama, Halliday responde com um convicto “não”.
Como está o Hamas após o conflito em Gaza?
O
Hamas segue existindo, garante que ganhou a guerra e não vai deixar o
comando de Gaza, especialmente se receberem muito dinheiro da Arábia
Saudita e outros países para a reconstrução. Israel conseguiu uma
vitória militar: é impossível evitar totalmente o lançamento de mísseis
contra o território israelense, mas conseguiram impor um cessar-fogo,
ainda que a um preço alto demais para os palestinos.
O Hamas obteve êxitos políticos, por ter resistido e posto [Mahmoud] Abbas [líder do Fatah]
em evidência. O próximo objetivo é reconstruir a unidade política
palestina entre Hamas e Fatah, mas o resultado vai ser muito
superficial. Vai durar alguns meses, um pouco mais se houver dinheiro.
Mas a longo prazo é impossível, porque ambos competem pelo poder.
O Hamas segue controlando a agenda, os demais têm que
atuar baseados no que eles fazem. Conseguiram fazer com que outros
países da região, como o Egito, negociem com eles. A invasão de Gaza
pelos israelenses, por exemplo, foi provocada pelo Hamas, por sua
provocação (ao recusar renovar o cessar-fogo), e agora os palestinos na
Cisjordânia são mais solidários em relação a eles.
Mesmo assim, não acho que o Hamas vai tentar tomar o
poder na Cisjordânia. Tem recursos para tentar, mas acho que não vai
fazê-lo porque criaria muitos problemas com os israelenses e todo o
mundo. A ANP [que domina a Cisjordânia e tem o Fatah como braço armado]
é muito débil, está muito desacreditada, sobretudo após essa crise,
porque não fez nada para ajudar seus próprios cidadãos. Abbas é visto
como um lacaio dos israelenses.
O que o Hamas busca?
O
Hamas continua querendo tudo. Busca um estado islâmico, busca dominar o
tema palestino, mobilizar mais ajuda e apoio do mundo islâmico a nível
popular e estatal. E, a longo prazo, eliminar Israel.
Jeremy Bowen, editor
de Oriente Médio da BBC, comentou que o Hamas tem elementos moderados,
embora estejam debilitados pelo bloqueio israelense a Gaza, que dura 18
meses, e pela guerra. Você concorda?
Sendo a política
como é, pode ser que o Hamas mude algum dia, mas neste momento eles não
pensam nisso. Aguentaram, sobreviveram e seguem em frente. Esse pessoal
é muito durão e muito tranqüilo.
Qual a real influência do Irã sobre o Hamas?
O
Irã tem um sistema de alianças na região com a Síria e grupos como
Hamas e Hezbollah, além de grupos no Iraque e Afeganistão. Tenta
promover seus interesses regionais como país hegemônico na região e
país revolucionário. O Irã, como todo país revolucionário, tem uma
política a dois níveis: formal e revolucionário.
Irã e Hamas mantêm não só relações políticas e
estratégicas, como também econômicas e militares. No caso do Hezbollah,
no Líbano, essa relação é direta através da Síria. No caso do Hamas, é
mais indireta. O Irã não comanda o Hamas nem o Hezbollah, mas acho que
o Hamas coordena sua política internacional com o Irã através de seus
representantes na Síria. A longo prazo, a relação entre Irã e Israel é
o eixo central de toda a zona.
Há alguma esperança de paz para a região?
Não
acho que haverá grandes mudanças. Esse problema poderia ser solucionado
em cinco minutos, mas há divisões muito fortes entre as duas facções
palestinas e dentro da sociedade israelense. Não adianta nada outros
países impondo a paz. Enquanto não houver mais unidade entre os
palestinos e entre os israelenses, podem assinar o que quiserem que não
vai durar.
Nem sequer com o governo Obama?
Obama
não terá êxito. Ele e Hillary Clinton (nova secretária de Estado
norte-americana) estão sob controle dos israelenses e da opinião
pública judia nos Estados Unidos. Mesmo que façam pressão sobre os
israelenses, não acho que terão sucesso.
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