O tempo passa e a via jurídica para o presidente Alvaro Uribe tentar outra reeleição e concorrer ao terceiro mandato não se pavimenta. A proposta de emenda constitucional sofreu um revés na Justiça e a discussão pode se prolongar por mais 60 dias, ou seja, até abril, mês que antecede a eleição, marcada para 30 de maio. Além disso, no que se refere ao posicionamento perante a opinião pública, o governo levou golpes de dois outros setores da sociedade nos últimos dias.
No dia 3 de fevereiro, a ONG Human Rights Watch (HRW) apresentou seu informativo mais recente: “Herdeiros dos Paramilitares: A Nova Cara da Violência na Colômbia”, que estuda a transformação dos antigos grupos paramilitares nas gangues criminosas que surgiram em várias regiões do país. Segundo Maria McFarland, pesquisadora senior da HRW que trabalhou nesse estudo por dois anos, “as novas gangues são integradas por paramilitares desmobilizados, por outros que nunca se desmobilizaram e por recrutas jovens”. Ou seja, os novos paramilitares são os mesmos de antes, mas com uma cara nova.
O diretor para as Américas da HRW, José Miguel Vivanco, confirma que estes novos grupos operam da mesma maneira e nas mesmas regiões dos antigos: “Vivem do narcotráfico, controlam o território e cometem abusos contra a população civil”.
O informe menciona a presença destes grupos em 24 dos 32 departamentos (estados) colombianos, com um total de 10.200 homens. Quase o mesmo número de paramilitares que eram registrados antes do processo de paz realizado pelo governo Uribe.
Ainda que normalmente seja utilizado o nome de “Aguilas Negras”, os novos grupos têm nomes locais como “urabeños”, “paisas” ou “nova geração”. Não parecem ter um comando nacional unificado, o que os diferencia da AUC (Autodefesas Unidas da Colômbia), o velho grupo paramilitar que se desmobilizou durante a presidência de Uribe.
O governo rejeitou o informe. “Reconhecemos o problema das guerrilhas emergentes, mas não estamos de acordo com a HRW sobre a natureza e o alcance do problema. Não acreditamos que seja uma extensão do paramilitarismo, mas sim um problema motivado pelo narcotráfico”, disse Carlos Franco, diretor do Programa Presidencial de Direitos Humanos.
Mas, segundo José Miguel Vivanco, também os velhos paramilitares deixaram a ideologia de lado e se dedicam ao narcotráfico. “Independentemente de como sejam chamados estes grupos (paramilitares, gangues criminosas ou outra denominação), não se deve minimizar o impacto que têm atualmente para os direitos humanos na Colômbia. As vítimas mais frequentes são sindicalistas, jornalistas, defensores de direitos humanos e civis que se opõe ao controle destes grupos”.
Estado de opinião
No mesmo dia em que a organização internacional denunciou estes fatos, acontecia o mais duro debate público da história republicana colombiana durante a visita de Uribe à Universidade Jorge Tadeo Lozano, como definiram alguns analistas. O presidente foi questionado duramente por acadêmicos respeitados, como a cientista política Claudia López, a decana Natalia Springer e o reitor José Fernando Isaza.
Este último atacou a ideia do “estado de opinião”: “Saddam Hussein foi também escolhido sob o estado de opinião. E, no estado de opinião, quando se perguntou se as pessoas preferiam Jesus ou Barrabás, escolheram Barrabás”. Claudia López questionou a autoridade moral do presidente, que respondeu: “Foi necessário que chegasse este governo para que os crimes fossem investigados e as ligações com o terrorismo e com o narcotráfico fossem reveladas. Não me questione a autoridade moral!”. Uribe disse também que nunca colocou o “estado de opinião” acima do “estado de direito”.
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Além disso tudo, a lei do referendo sobre o terceiro mandato, que se encontra sob análise da Corte Constitucional, recebeu, poucas horas depois, um duro golpe quando o juiz Humberto Sierra pediu que fosse declarada inconstitucional. No comunicado, de mais de 400 folhas, o magistrado alegou que os “vícios formais” foram tão graves que não poderiam ser relevados.
A corte tem até 60 dias para debater e votar a lei, e tudo pode mudar. Mas a possibilidade de Uribe concorrer nas eleições presidenciais do dia 30 de maio parecem ter diminuído ainda mais.
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