Em 1916, em plena 1ª Guerra Mundial, alemães se opuseram a britânicos e franceses às margens do rio Somme na batalha que ficou marcada como uma das mais mortíferas da história: pelo menos 1 milhão de baixas, entre mortos, feridos e desaparecidos. Alem da enorme quantidade de sangue derramado, o confronto de 1916 ficaria conhecido por outro motivo: foi a primeira vez em que o cinema acabou sendo utilizado como ferramenta de propaganda e marketing político-militar.
Abaixo, assista a trechos das imagens gravadas na batalha de Somme, em 1916; no fim, material virou documentário e foi exibido para 20 milhões de pessoas no Reino Unido:
Inicialmente concebida em dezembro de 1915 pelo general francês Joseph Joffre, a ofensiva de Somme teve de ser reconsiderada após a eclosão da batalha de Verdum, em fevereiro do ano seguinte, adiando, então, o que seria a primeira operação conjunta franco-inglesa.
No plano militar, o balanço da batalha foi pouco convincente. Os ganhos territoriais para os aliados foram modestos e o front alemão não foi rompido por completo. Sem grandes vencedores nem vencidos, os combates acabaram exaurindo as duas partes.
Foi no plano tático, contudo, que a batalha de Somme se destacou, produzindo duas inovações de relevo. Além de usar ter sido a estreia, no campo de batalha, do carro de assalto, arma jamais utilizada até então, o confronto de 1916 alinhou cinema e propaganda militar.
O filme A batalha de Somme (1916) colheu grande parte dos horrores da guerra moderna em imagens rodadas nos primeiros dias do combate. Ao retratar a rotina do Exército britânico no front, o documentário pioneiro foi considerado um grande sucesso: mais de 20 milhões de pessoas assistiram à película. Prova do acerto é que a memória coletiva dos franceses não guardou traços da batalha de Somme; já entre o imaginário dos britânicos, o conflito de 1916 tem lugar cativo.
Como teve início o conflito
Depois de dezembro de 1914, na sequência da corrida ao mar, o front ocidental se estabilizou. A região de Somme era um setor relativamente calmo no curso de 1915 e os alemães lançam uma grande ofensiva sobre Ypres.
Joffre, o general francês, se inquietava com as perdas humanas, com a falta de unidade de visão e com a dispersão dos esforços militares dos aliados, ansiando pelo reforço da cooperação franco-britânica e preconizando uma grande ofensiva para 1916.
A conferência interaliada da Entente Cordiale em Chantilly, em 6 de dezembro de 1915, concluiu que era necessário atacar os Impérios Centrais em todos os fronts a partir de 1916: na Rússia, na Itália e sobre o front ocidental. Apenas não havia sido fixada uma data e foi necessário esperar junho ou julho, aguardando a participação russa.
WikiCommons
Frame do filme 'A batalha de Somme' (1916) mostra soldado ferido sendo carregado por companheiro no front — o homem morreu meia hora após chegar nas trincheiras
Em 1916, faltava experiência ao Exército britânico na França. Sua parte profissional — 6 divisões — havia sido dizimada entre 1914 e 1915. A maior parte de seus efetivos era composta de voluntários e do chamado “Novo Exército”, criado por Lord Kitchener, secretário britânico de Estado e Guerra. Os oficiais foram promovidos rapidamente e lhes faltava formação e experiência.
Joffre monta então esta ofensiva, com o Exército francês como ator principal, ao sul de Somme, que deveria ser apoiado pelos corpos expedicionários britânicos entre Somme e Arras. Nomeia Foch comandante do grupo de exércitos do norte, responsável pela operação. Uma outra conferência em Chantilly, em 14 de fevereiro de 1916, fixa o início da ofensiva em 1º de julho de 1916.
NULL
NULL
Do lado alemão, o general Erich von Falkenhayn não toma qualquer disposição especial. O Estado-Maior alemão esperava uma ofensiva aliada em Artois ou na Alsácia e os preparativos aliados lhe pareciam um blefe.
O “Novo Exército”
Com data fixada para atingir o objetivo e romper as linhas alemãs no sul da França, o enfrentamento, levado a cabo pelo Exército britânico, também significou o primeiro envolvimento maciço de voluntários desse “Novo Exército” do Reino Unido. Antes da investida da infantaria, a artilharia se preparou por uma semana para realizar um ataque sincronizado, articulando a partida das linhas britânicas com a explosão de muitas minas gigantescas.
Do lado aliado, a retaguarda havia sido transformada pelos exércitos em gigantesco entreposto de aprovisionamento em que a cidade de Amiens era o centro nevrálgico. Caminhos, ferrovias de bitola estreita foram construídos, aeródromos foram arrumados, assim como fábricas de construção de aeronaves. Nos territórios que ocupavam, os alemães faziam reinar o terror: deportação da população, requisições em dinheiro e em bens, pilhagens e destruições.
WikiCommons
Frame do filme 'A batalha de Somme' (1916)
Assim, no início da manhã de 1º de julho de 1916, os soldados britânicos saem das trincheiras e começam a atravessar a terra em ritmo lento e regular. São rapidamente expostos ao desencadeamento das metralhadoras e dos fuzis alemães que sobreviveram ao bombardeio. Logo no primeiro dia, as baixas são enormes.
Na noite deste mesmo 1º de julho, parecia claramente que o ataque havia sido um desastre completo para os britânicos: 19.240 homens, entre os quais 1.000 oficiais, foram mortos em 12 horas de enfrentamentos. Foi uma das jornadas mais trágicas de toda a história da nação. O impacto foi particularmente forte sobre a sociedade, pois o “Novo Exército” havia sido organizado com base nas comunidades, que perderam em poucas horas parte importante de sua juventude.
Números
Na Batalha de Somme, os franceses totalizavam 14 divisões em linha, 4 de reserva e 4 de cavalaria sobre um front de 15 quilômetros. A artilharia alinhava 696 peças de campanha, 732 peças pesadas, 122 peças de artilharia pesada de grande poderio e 1.100 morteiros de trincheira, com um aprovisionamento de 6 milhões de obuses de 75 milímetros, 2s milhões de munições para a artilharia pesada e 400 mil para a artilharia de trincheira. Os britânicos compunham um efetivo de 26 divisões em linha e 3 de cavalaria sobre um front de 25 quilômetros, com apoio de 868 peças de campanha e 467 peças pesadas, aprovisionadas, respectivamente por 2,6 milhões e 1,16 milhão de disparos. As tropas britânicas eram compostas por ingleses, escoceses, galeses, irlandeses do norte, canadenses, australianos, neozelandeses e sul-africanos, aos quais se juntavam corpos de trabalhadores chineses, encarregados da carga, descarga e do armazenamento dos armamentos e mercadorias.
Ao final, foi uma das batalhas mais mortíferas da história — sem contar as vítimas civis. As baixas entre os beligerantes: 420 mil britânicos (207 mil mortos); 203 mil franceses (67 mil mortos); e, 437 mil alemães (170 mil mortos).