É evidente que não estamos sob a vigência plena de um regime policial-militar, o que em principio é demonstrado pelo simples fato de que (ainda) posso escrever esta coluna sem prever que ela seja censurada ou que eu venha a ser preso pelo que aqui esteja dito.
Também é evidente que Bolsonaro e o bolsonarismo avançam diariamente nesse sentido e, quanto maior a redução de seu apoio social, maior o esforço por solapar o que ainda nos resta de estado democrático de direito.
A atenção da chamada opinião pública identifica esse solapamento cotidiano e progressivo no descrédito e nas ameaças às instituições representativas formais (Tribunais, Congresso, Imprensa, Partidos, etc.).
Menos atenção se dá, pela própria pulverização dos fatos, ao processo de corrosão das normas mais elementares de convivência social civilizada. Meras opiniões ou posicionamentos são punidas com ameaças virtuais ou físicas, inclusive com o envolvimento de familiares e crianças.
Se você leitor recebesse ameaças à sua família, pelas redes, você se sentiria seguro em ignorá-las, acreditando que não passariam da ameaça aos fatos? Quantas pessoas nos últimos anos passaram à condição de exilados, não por meio de processos formais, mas para proteger a sua vida e de suas famílias? O que deve fazer uma mãe que, por sua atividade política, recebe ameaças de estupro de sua filha de 5 anos?
Isac Nóbrega/PR
Carlos Ferreira Martins: ‘Se não estamos em plena vigência de um regime policial militar, podemos dizer que ainda vivemos em democracia?’
Se não estamos em plena vigência de um regime policial militar, podemos dizer que ainda vivemos em democracia? Eu provavelmente não sofrerei um processo criminal pelo que aqui escrevo, mas tenho a obrigação de saber que o que me “protege” é o pouco alcance da minha manifestação individual.
Neste momento há dezenas de jornalistas perseguidos judicialmente com base em legislação anacrônica ou simplesmente sem base nenhuma, quando não fisicamente ameaçados de morte. E já estamos no ranking dos países em que a liberdade de imprensa está sob severa ameaça.
A insatisfação coletiva cresceu a ponto de levar dezenas de milhares de manifestantes às ruas de todo o país, preocupados em manter os cuidados com a pandemia, mas convencidos de que o governo é mais perigoso que o vírus ou a receber com sonoro panelaço mais uma manifestação de cinismo e desprezo.
Como vimos, a resposta variou do vergonhoso silencio da grande mídia (com o honrosa exceção da Folha), à intensificação das articulações da tal terceira via ou às balas de borracha disparadas aleatoriamente contra manifestantes e não manifestantes pela Policia Militar de Pernambuco.
Os democratas de quaisquer vias podem ter todas as divergências do mundo, mas precisam entender uma coisa vital: o bolsonarismo existe para destruir a democracia, e seu Führer já avisou que a única eleição que vai respeitar é aquela em que ele vencer.