A história começou com Viviana Carrillo, 26 anos, mãe do menino Guillermo, de dois anos. Em seguida, apareceu a jovem Benigna Leguizamón, 27 anos, com uma criança de seis. A última a surgir foi a jornalista Damiana Morán, 39 anos, com seu filho Juan Pablo, de dezesseis meses. Em menos de duas semanas, três mulheres disseram que o presidente paraguaio Fernando Lugo era o pai de seus filhos.
Elas apresentaram um processo de reconhecimento de paternidade contra o mandatário, que tinha ganhado o apelido “bispo dos pobres” quando era membro da Igreja Católica antes de renunciar a seu estado clerical, em 21 de dezembro de 2006, para entrar na política.
Damiana Morán assegura que há, no total, seis denúncias de paternidade em andamento. A jornalista esclarece que não pede nada a Lugo e que decidiu tornar pública sua história “apenas para que se saiba a verdade” sobre esta “grande história de amor”.
Na semana passada, o presidente paraguaio surpreendeu a opinião pública reconhecendo que Guillermo, que nasceu em 4 de maio de 2007, era fruto do seu relacionamento com Viviana Carillo quando ainda era bispo de São Pedro, a região mais empobrecida do país. A confissão causou uma queda na popularidade do presidente, um ano após sua eleição histórica. Em 20 de abril de 2008, Fernando Lugo acabou com 61 anos de hegemonia política do Partido Colorado, então a mais antiga formação política no poder no mundo.
Contradição
Com a aparição de outras crianças, cuja paternidade não foi nem reconhecida nem negada pelo ex-bispo, o cenário se torna mais complicado. “O Paraguai, é um país machista, como o resto da região. Uma parte da população não esconde sua admiração por esta marca de virilidade”, avalia Marcelo Coutinho, diretor do observatório político sul-americano do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ).
No entanto, o fato de o político ter sido membro da Igreja na época dos relacionamentos pode provocar incompreensão na população. O primeiro caso podia ser visto como um erro bastante comum no seio da igreja. Dois, três, ou tal vez seis, podem instilar uma dúvida na opinião pública. “Não é uma questão de matemática. Mas se outras revelações forem publicadas, o eleitorado pode achar que é uma conduta contraditória com a imagem de honestidade e transparência que ajudou Lugo a se eleger”, diz Coutinho.
Reforma agrária e Itaipu
O escândalo surge numa situação política e econômica já precária. A crise mundial provocou um aumento do desemprego no país, como no resto da América Latina. Enquanto isso, as reformas prometidas pelo mandatário, inclusive a reforma agrária, não avançaram. E por uma boa razão: Lugo foi eleito à frente de uma coligação que, apesar de ser integrada por diversos grupos sociais e de esquerda, é liderada pelo PLRA (Partido Liberal Radical Autêntico), de centro-direita. Seus membros são adversários declarados de qualquer redistribuição de terras.
Com o escândalo que abalou a sua credibilidade, Fernando Lugo é mais do que nunca um refém dos seus aliados do PLRA. O maior representante do partido no governo é o vice-presidente Federico Franco, que teve muitos atritos com o chefe de estado. Franco considera que a reestruturação ministerial anunciada nesta terça (20) marginalizou seus seguidores. Se o PLRA deixar o governo, Fernando Lugo perderia a maioria no Congresso, tornando-se um alvo fácil para qualquer tentativa impeachment orquestrada pela oposição.
A crise também complica as conversas que o presidente paraguaio tentava estabelecer com o Brasil sobre a revisão do Tratado de Itaipu. “É uma demanda que é maior que Lugo, e que continuará qualquer seja o contexto, mas é claro que o ele não esta numa posição de força para negociar, ainda mais contra um presidente tão popular como Lula, que tem o apoio da sociedade civil e do empresariado”, diz Coutinho.
O analista afirma que para o Brasil, “não interessa colocar lenha na fogueira. Por um lado, é verdade que as denúncias enfraquecem as reivindicações sobre Itaipu, mas o governo brasileiro quer evitar uma desestabilização política do Paraguai”.
Piadas
Nas ruas de Assunção, os boatos se multiplicam, assim como as piadas. Já virou famosa a anedota segundo a qual Lugo teria sido eleito “pelo voto de seus filhos”. Um grupo de músicos compôs uma “cumbia”, o ritmo mais popular no país, desviando o principal slogan da campanha eleitoral do ex-bispo: “Lugo tiene corazón” (“Lugo tem coração”), acrescentando “pero no uso el condón” (“mas não usou a camisinha”).
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