A relação entre as Coreias ficou mais tensa esta semana, quando a Coreia do Norte declarou o fim do armistício de 1953, que interrompia o conflito com o vizinho do sul. O país também lançou mísseis de curto alcance e ameaçou realizar um ataque militar. Tudo isso após Seul aderir a um tratado contra o tráfico de armas de destruição em massa que permite a abordagem de navios suspeitos. Mais que uma guerra, no entanto, o que Pyongyang pretende é demonstrar força para conseguir um lugar de maior destaque na comunidade internacional, segundo analistas.
O pesquisador do Grupo de Análise da Conjuntura Internacional (Gacint, da USP), Alexandre Uehara, aponta a política anti-terrorismo do governo George W. Bush, adotada após os atentados de 11 de setembro de 2001, como um dos fatores responsáveis por isso, ao ignorar a Coreia do Norte.
“Quando Bush assume, ele coloca a Coreia do Norte no eixo do mal, e com isso prejudica a relação entre as Coreias, que estavam tentando se aproximar, abrindo processos para visitas de famílias que foram separadas”, avalia Uehara. Isolada e desprestigiada, Pyongyang passa a buscar protagonismo mundial à força. “Essa falta de atenção do governo americano em relação ao coreano gerou a demonstração de força. Eles querem e merecem atenção, e estão dando motivos para isso”.
O russo Yury Fedorov, especialista em Coreia do Norte do centro de pesquisas Chatham House, em Londres, tem a mesma impressão, mas acha que ainda não é possível saber por que o país de Kim Jong-Il passou a agir desta forma. “Talvez seja devido a problemas domésticos, talvez seja porque eles estão à beira de uma sucessão de governos, talvez seja uma moeda de troca que pretendem usar com as potências ocidentais, enfim, ainda não dá para ter certeza de nada”.
Fedorov crê que Pyongyang está se firmando como nova potência nuclear, e que a comunidade internacional permitiu que isso acontecesse. “O Grupo dos Seis [conselho formado por Rússia, EUA, China e Japão, além das Coreias] foi muito ameno, e eu não acho que este grupo conseguiu fazer muita coisa pelo processo de paz devido às interferências de Rússia e China”. Os dois países têm o costume de barrar resoluções mais duras em relação a Pyongyang.
Alexandre Uehara acha que o isolamento da Coreia ajuda a acirrar os ânimos na região. “A China foi um interlocutor importante a partir da Guerra Fria e fazia a Coreia do Norte ter posições mais moderadas. Depois de 2006, com a bomba atômica norte-coreana, Pequim se sentiu contrariada”.
Para ele, o fato de a China ter desaprovado os testes de mísseis e teste nucleares de 2008 e 2009 demonstra que as decisões da Coreia do Norte são isoladas. “O governo chinês não tem conseguido influenciar de maneira significativa no governo norte-coreano, que é, digamos, meio irresponsável”.
Segundo Uehara, a atitude chinesa quanto a uma possível guerra depende de geopolítica. Se o conflito acelerar a liderança da China no mundo, Pequim ficará a favor; se retardar, ficará contra. “Nesse momento, a grande incógnita é a posição da China. Para manter seu crescimento, Pequim não tem interesse em fazer guerra, mas também pode acontecer que nesse momento, por interesses de buscar afirmação externa e liderança regional, ela acabe se posicionando ao lado da Coreia do Norte”.
Embaixador brasileiro
Em razão dos últimos acontecimentos, o Brasil decidiu adiar a chegada do embaixador Arnaldo Carrilho a Pyongyang, por prazo indefinido. A embaixada brasileira será a primeira de um país sul-americano na Coreia do Norte.
O Itamaraty divulgou nota condenando os testes nucleares e pedindo a continuidade do diálogo. Segundo a chancelaria brasileira, o país não irá participar das negociações porque não faz parte do Grupo dos Seis, mas acredita que a abertura de uma embaixada em Pyongyang contribui para o diálogo.
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