A decisão da Standard and Poor’s de rebaixar, pela primeira vez na história, a nota da dívida pública norte-americana, provocou uma série de críticas de diversos chefes de Estado no mundo, como a presidente do Brasil, Dilma Rousseff e o próprio líder norte-americano, Barack Obama, que questionaram os critérios da instituição.
O presidente norte-americano disse que seu país não precisa de uma agência de classificação para dizer que necessita de uma abordagem de longo prazo equilibrada para redução do déficit. Já Dilma chamou a medida de “precipitada” e “incorreta”.
A decisão foi questionada também por especialistas consultados por Opera Mundi, que relembraram os erros das agências de risco no passado, principalmente em 2008, quando S&P, Fitch e Moody’s não previram a crise derivada da alta captação dos bancos aos títulos podres do mercado imobiliário dos EUA.
Mercado x Estado
O professor de Economia da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos), Pedro Chadarevian, contesta a idoneidade e a relevância dada a esses grupos. Para ele, há um conflito de interesses nas avaliações dessas instituições. “As agências de risco são instituições privadas financiadas por grupos de grande porte, que tem uma posição própria sobre como deve ser tratada a questão da dívida. Há razão nas críticas feitas por chefes de Estado”, afirma.
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“As agências têm um histórico bem controverso. Não alertaram, por exemplo, o mundo sobre a crise dos créditos podres nos EUA, porque os bancos que as financiam não tinham interesse. Até o último momento, elas sustentaram que os créditos tinham qualidade. O resultado desse rebaixamento acabará afetando todos os mercados globais. Mas, a longo prazo, esse episódio reduzirá a importância das agências”, acredita.
Para o economista, o objetivo das agências com o rebaixamento da nota da dívida norte-americana é um só: “derrubar o presidente (Barack) Obama. Isso faz parte de uma queda de braço entre mercado e Estado. Estamos no ápice de uma crise econômica e ideológica que questiona o neoliberalismo como modelo de Estado, pois o mundo começou a procurar novas alternativas”, afirmou. Para Chadarevian, isso pode ocorrer com qualquer governo que ousar, por exemplo, taxar a classe alta ou propor um programa priorizando o aumento de receita ao corte de despesa. “Para isso, é necessário que quem tenha mais contribua mais. Nos EUA, eles reduzem essa participação dos mais ricos desde o governo Bush”, disse.
Chadarevian acredita que, após a crise, as agências sofrerão sérias reformas. Acima de tudo, teriam uma regulação bem maior sobre elas, o que as obrigaria a se tornarem mais independentes do setor financeiro. “O próprio mercado fornecer as regras para sua própria avaliação é algo que não faz sentido. Tem de haver uma avaliação por uma agência minimamente independente”, afirma. Para que isso ocorra, Chadarevian propõe uma maior participação da sociedade civil já que apenas o sistema financeiro se encontra representado.
Outro lado
O economista-chefe da Austin Ratings, Alex Agostini, discorda dessa visão, embora também defenda uma maior regulação dessas instituições. Ele já havia criticado o rebaixamento da nota a dívida norte-americana, ocorrida na última sexta-feira (05/08), classificando-a de “um erro para justificar o outro”, em referência à crise de 2008.
“Há erros sucessivos de análises, como em 2008 e agora. Estamos conscientes que é preciso ter órgãos reguladores e fiscalizadores. A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) realiza audiências para debater a regulação das agências de rating. Não é possível que o mercado de avaliação de risco perca credibilidade. O objetivo é, com o tempo, o mercado internacional se fortaleça muito em um ambiente de governança, através de operações mais rigorosas, como ocorre no mercado financeiro brasileiro. Uma avaliação deve ser feita com bastante cautela, e não arbitrária. No Brasil já temos uma regulação grande, o que reduz a possibilidade de erros ou fraudes. Os EUA, no entanto, são um mercado bem mais liberal”, diz Agostini.
Entretanto, Agostini discorda de Chadarevian em relação à possibilidade à entrada de novos atores no grupo das principais agências de risco. “É difícil isso ocorrer, pois o mercado depende muito de credibilidade, e isto só se conquista ao longo do tempo. E essas [três] agências são centenárias [a Fitch completará cem anos em 2013]”.
Já em relação à “democratização” das agências, ele é taxativo: “Uma total utopia. Não é assim que as coisas funcionam. Imagine chamar um líder sindical ou um empresário do setor produtivo para participar desse tipo de decisão. Há necessidade de conhecimento técnico. As agências têm metodologias diferentes. Avaliar uma empresa é totalmente diferente de uma nação, são condições diferentes. Um país não quebra, não fecha as portas. Ele se endivida, mas não vai parar por causa disso. Um quadro desses só aumentaria muito mais as imprecisões. O ideal seria um acompanhamento mais próximo da situação pelas autoridades competentes”, avaliou.
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