A Bolívia está passando pela pior crise de saúde pública em dez anos e a mais abrangente epidemia de dengue em mais de duas décadas. Cinco pessoas já morreram de dengue hemorrágica e mais de 8 mil casos foram registrados desde o início do ano, superando o total de 2008. Oficiais de saúde estimam que haja outros 4 mil casos ainda não detectados. A região mais afetada é a meia-lua, zona oriental que faz fronteira com o Brasil.
“A epidemia de dengue está fora de controle e o alerta em quatro regiões (Santa Cruz, Beni, Pando e Cochabamba) passa da situação de emergência”, disse recentemente o ministro da Saúde, Ramiro Tapia. “É um grande surto, não podemos mentir para as pessoas”.
As autoridades acreditam que a causa da epidemia seja a grande quantidade de chuvas após uma seca implacável, que criou uma quantidade incomum de água parada nas planícies. Poças d’água, pneus velhos e pilhas de lixo em áreas residenciais possibilitam a situação perfeita para reprodução do Aedes aegypti, mosquito que transmite a dengue.
O combate ao problema tem, portanto, dois eixos: fumigação para matar os mosquitos adultos e eliminação dos excessos de lixo e água parada, para matar os ovos, que não são afetados pelos produtos químicos. O governo de Evo Morales destinou mais de US$ 1 milhão para a assistência hospitalar e esforços de prevenção postos em prática por 18 mil membros das Forças Armadas.
Apesar de os casos terem sido detectados nas terras mais altas do ocidente, a doença foi “importada”, ou seja, contraída por pessoas que estavam na planície e a levaram para o outro lado do país.
Apesar da acirrada disputa entre os governos opositores da planície e Evo Morales, as diferenças políticas foram colocadas de lado. Aviões do governo entregaram remédios, mosquiteiros, larvicidas, aparelhos de fumigação e outros equipamentos em Santa Cruz, epicentro do surto. A administração regional aceitou com prazer a assistência de La Paz.
“Nesses casos, não há política que vingue”, disse o líder de oposição e prefeito de Santa Cruz, Rúben Costas. “É por isso que insisti para que chegássemos a acordos necessários”.
Faltam remédios e dinheiro
Mas apesar da ajuda, faltam suplementos básicos de medicina para assistir os doentes e ajudar na prevenção. Em Riberalta, no norte da Amazônia boliviana, as zonas urbanas enfrentam as piores situações. “Parece que a doença gosta de mulheres e crianças, porque elas que estão ficando mais doentes aqui”, contou Alvaro Montero ao Opera Mundi, por telefone.
Ele disse que a epidemia virou o foco de toda a região, pela sua severidade. “Há somente um hospital e uma clínica aqui, ambos estão cheios. E não há remédios para todos. Acabaram vários medicamentos e estão receitando [o antiinflamatório] ibuprofeno”. As autoridades locais disseram que não existe mais dinheiro, segundo Monteiro.
“Não é possível controlar a epidemia sem a ajuda da própria população. Esses mosquitos são os mais limpos da região. Gostam de água fresca, água de chuva e nascem em qualquer água disponível. Pneus empilhados são geralmente os maiores recintos de criação. Um estudo que fiz mostrou que em um ano, em Chapare [província boliviana], 67% dos mosquitos nascidos vinham da água parada em pneus”, afirmou Roberto Rdriguez, perito em dengue e doenças transmitidas por mosquito, que trabalha com o Ministério da Saúde de Cochabamba.
“Pode ser que a situação fique bem pior antes de melhorar. É bem provável que tenhamos 10 mil ou 12 mil casos em nossas mãos em breve. E não seremos capazes de impedir que a dengue se espalhe até que todos cuidem de suas casas adequadamente”, disse. Outros especialistas já preveem que o total chegue a 50 mil casos antes que a epidemia seja controlada.
Brasil não “importou” nenhum caso
O Ministério da Saúde do Brasil, consultado sobre a possibilidade de a epidemia se espalhar pela fronteira, disse que não foi registrado nenhum caso de dengue “importada” da Bolívia por enquanto. A respeito de medidas tomadas nas fronteiras, a assessoria de imprensa afirmou que há unidades-sentinela para análise laboratorial de casos suspeitos e que não há necessidade de nova estrutura ou recursos específicos, uma vez que as ações de prevenção e assistência já são rotina nos serviços de saúde.
* Colaborou Sarah Germano, da redação.
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