Poucas horas após as últimas urnas terem sido fechadas no Irã, a vitória do presidente Mahmoud Ahmadinejad foi anunciada, já no dia seguinte, 13 de junho. A vantagem numérica, conforme demonstrava a contagem dos votos, lhe garantia a reeleição com 64% do total. No entanto, a desconfiança de parte da população quanto à legitimidade das eleições e as denúncias de irregularidades que logo se seguiram – dentro e fora do Irã – tomaram imensas proporções, culminando nos violentos protestos nas principais cidades iranianas.
Para analistas entrevistados pelo Opera Mundi, é preciso ter cautela ao se analisar as acusações feitas ao sistema eleitoral iraniano. Durante debate realizado em São Paulo, o jornalista, mestre em Relações Internacionais e doutorando em Ciência Política Igor Fuser afirmou que, embora os protestos existam, os relatos de que houve fraude não são muito convincentes. “Para que exista uma fraude é necessária a participação de muitas pessoas, envolvidas no processo eleitoral e essas pessoas não apareceram até agora”, disse. Lembrou também o fato de existirem 15 mil urnas no país, com cerca de 860 eleitores em media para cada uma.
O cientista político especializado em conflito internacional Flavio Rocha não descarta em um primeiro momento a possibilidade de irregularidades, devido ao grande volume de urnas, cada uma coordenada por uma comunidade local o que, em sua avaliação, poderia dificultar uma rígida fiscalização. Todavia, ele duvida que uma alteração tenha sido tão grande a ponto de mudar os resultados. “A capacidade do discurso do Ahmadinejad foi menosprezada”.
Tecnologia
Fuser contestou o argumento levantado pela oposição de que o resultado teria saído rápido demais. Ele lembrou que, apesar de ter cédulas em papel, a contabilização dos votos é eletrônica. “No Irã, são utilizados mecanismos eletrônicos de contabilização dos votos. Além disso, foram contados votos de uma única eleição, para um único cargo. Não é porque o país vive em um regime teocrático que não há desenvolvimento tecnológico”.
O editor do site iraniano Tehran Avenue Sohrab Mahdavi explicou que essa eleição teve um diferencial: a identificação eletrônica de eleitores por meio de uma leitura de código de barras nas carteiras de identidade. A medida não é utilizada ainda para todas as pessoas e está sendo implementada aos poucos no país.
Essa foi a décima eleição presidencial e nunca houve denúncia de fraude eleitoral. Apesar disso, segundo o jornal The New York Times, muitas pessoas levam as próprias canetas por medo de que aquelas fornecidas pelo governo possam conter uma tinta que desapareça após o voto.
CIA
Durante o debate, Fuser afirmou não descartar a possibilidade de estar em curso no Irã uma operação chefiada pela CIA (Central de Inteligência Americana), conforme denunciou o ex-general paquistanês Mirza Aslam Beig. Em entrevista dada à Pashto Radio no dia 15 de junho, o militar afirmou que “há documentos que provam que a CIA investiu 400 milhões de dólares no Irã para incitar uma ‘revolução colorida’ subseqüente à eleição”.
“Não duvido que daqui a alguns meses venha a se falar em um ataque dos Estados Unidos ao Irã”, completou.
Fuser disse que um dos fatores que sustenta a hipótese de interferência da CIA é que a organização tem um “know how de golpes de Estado no mundo inteiro”, inclusive no Irã. Ele fez referência ao golpe orquestrado pela CIA e pela Inglaterra em 1953 no Irã, que derrubou o então primeiro-ministro eleito Mohamed Mossadegh quando o sistema político no país era um regime parlamentar democrático.
Furacão geopolítico
Os analistas acreditam que os protestos dos últimos dias enfraqueceram o regime islâmico, pois já não existe a motivação religiosa, presente entre aqueles que apoiaram os aiatolás em 1979.
“Há no Irã um forte movimento pela liberdade e pela democracia. Pessoas, em sua maioria jovens, têm saído as ruas mostrando insatisfação com uma ditadura teocrática. Ao lado dessa parcela da população iraniana que luta por liberdade existe um conjunto de interesses que vêm associados a isso. O Irã está no olho do furacão de um furacão geopolítico. Existem interesses externos muito fortes envolvidos e de setores domésticos, empresários iranianos, sistema teocrático iraniano”, afirmou Mahdavi.
Fuser criticou a postura maniqueísta em relação às manifestações que estão acontecendo no Irã. “As pessoas estão comprando ingenuamente uma visão que é veiculada sobre o Irã, que é uma visão totalmente maniqueísta. Como se houvesse no Irã uma luta entre o bem e o mal, os aiatolás maus e os aiatolás bons”.
O aiatolá Ali Khamenei aceitou na quarta-feira (23) a proposta do Conselho dos Guardiães de prorrogar em cinco dias o prazo para a apresentação de queixas relacionadas às eleições, mas a hipótese de uma nova eleição não é cogitada. No dia 16, o Conselho anunciou que estaria disposto a recontar os votos e a recontagem de 10% dos votos já foi iniciada.
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