Às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais, marcadas para este domingo (24/01), milhares de haitianos têm tomado as ruas para protestar contra a realização do pleito. Nesta quarta-feira (20/01) foi realizado o terceiro ato consecutivo contra o que os manifestantes consideram ser “eleições fraudulentas”. A mobilização, no entanto, foi duramente reprimida pela polícia.
“Essa semana é uma semana de rebelião contra o regime de Michel Martelly e contra o CEP [Conselho Eleitoral Provisório]. A população não vai recuar, ela vai até o fim para conseguir seus objetivos”, disse Volcy Assad, secretário-executivo do partido Pitit Desalin. “Não houve eleições em 9 de agosto, nem em 25 de outubro de 2015. Não poderá haver eleições em 24 de janeiro”, acrescentou ele.
EFE
Protestos convocados pela oposição criticam atuação do governo no processo eleitoral
Na mesma linha, o ex-deputado Jean Danton Léger, afirmou que caso o CEP prossiga com a intenção de realizar o segundo turno no próximo domingo, a população irá agir “em nome da legítima defesa”.
Apesar da mobilização, o presidente do país, Michel Martelly, afirmou que o segundo turno das eleições não será adiado. Na segunda votação, concorrem Jovenel Moïse — que tem o apoio do presidente e está à frente da disputa — e o opositor, Jude Celestin, que se retirou da disputa.
Em meio à tensão gerada pela situação, na última segunda-feira (18/01), carros e escritórios eleitorais foram apedrejados e incendiados em diversas cidades do país.
Diversas organizações civis pedem não apenas o adiamento das eleições do próximo domingo, mas também o cancelamento do primeiro turno, entre elas a SOFA (Solidariedade às Mulheres Haitianas). Em uma carta aberta, a entidade pede a anulação do pleito, citando os dados da comissão como indicativo do “mascaramento e fraude” do processo eleitoral.
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Sem oposição
Celestin anunciou nos últimos dias que irá boicotar as eleições, porque, segundo ele, a atuação do governo e de países estrangeiros tornou impossível uma competição justa. “Eu não vou participar dessa farsa, não vai ser uma eleição, mas uma seleção porque haverá apenas um candidato”, afirmou em entrevista à agência France Presse. Ele diz ainda que existe uma “enorme fraude” em favor do candidato governista, Jovenel Moïse.
O nome de Celestin, no entanto, aparecerá nas urnas normalmente, uma vez que, de acordo com o CEP, o candidato não retirou formalmente sua candidatura.
EFE
A polícia haitiana reprimiu as manifestações contra o governo em Porto Príncipe, capital do país
No primeiro turno, em 25 de outubro, Celestin obteve 25,29% dos votos, contra 32,76% do candidato apoiado pelo governo, Jovenel Moïse.
A comissão de monitoramento das eleições indicada pelo governo emitiu um relatório no qual cita que 57% dos votos do primeiro turno não tinham assinatura ou impressão digital e 30% não tinham o número de identificação nacional (equivalente ao RG), exigências da legislação eleitoral.
Nenhuma mulher no Legislativo
Entre os 14 assentos do Senado haitiano que foram renovados nas últimas eleições, em outubro, não há nenhuma mulher. “Apesar de todos os anos de existência da nossa nação, somos incapazes de eleger uma mulher para o Senado. Seremos 30 homens decidindo sobre o futuro deste país, enquanto 53% da população é composta por mulheres e elas assumem todas as responsabilidades econômicas”, afirmou o presidente do Senado, Andris Riché, ao jornal norte-americano Miami Herald.
Na Câmara dos Deputados também não houve nenhuma mulher eleita entre os 92 assentos da nova legislatura. O cenário de desigualdade de gênero ocorre apesar de uma recente emenda constitucional estabelecer uma cota de 30% dos cargos para mulheres, incluindo os eletivos.
Veja a íntegra do manifesto da SOFA:
A anulação das eleições de 09 de agosto e 25 de outubro é o caminho para encontrar solução na crise que abraça o país.
Nós cidadãos mulheres e homens que lançamos a presente petição para exigir anulação das eleições desperdiçamos todas as tentativas possíveis pra fazer o povo haitiano valorizar as eleições de 09 de agosto e 25 de outubro
Três de janeiro de 2016 a comissão “cabeça de gato” que o poder executivo montou para avaliar as eleições lançou um relatório mostrando que em cada 100 votos o Conselho Eleitoral Provisório (CEP- Tribunal de Justiça) considerou 57 destes não possuíam assinatura ou impressão digital tal como o artigo 158.1 do decreto eleitoral exige.
Já que o artigo 158 do decreto eleitoral pede que o presidente do escritório (sessão eleitoral) verifique a carteira de identidade de cada eleitor que aparece para votar o relatório mostra que de cada 100 votos, existe 30 sem número de identificação nacional ](rg).
No que diz respeito aos processos verbais (procedimento de defesa), mais de 43 em cada 100 processos a comissão eleitoral controlou e reformulou a seu critério. O Conselho Eleitoral Provisório desrespeitou a lei e agiu a sua maneira “chapa branca”
As recomendações feitas pelo CEP, e uma Comisso especial “independente” criada para gerir a crise, geraram ainda uma confusão maior. Após constatações de fraudes denunciadas o poder público tentou frear qualquer meio destas obterem visibilidade e realizou pesquisas de opinião para desmascarar as dimensões do escândalo eleitoral de 09 de agosto e 25 de outubro. Para se ter uma ideia pediu-se a demissão de alguns membros do CEP e a realização de um diálogo nacional para entrosar todos para seguir o processo. Quando eles farão tudo isso? Se entendemos bem essa Comissão seu objetivo e tentar garantir que essas eleições se legitimem apesar de todo o mascaramento e fraude.
Apesar de tudo nós nos mantivemos críticos sobre a forma que o poder executivo organizou essa Comissão. As cifras que surgiram nos relatório e suas recomendações começaram dar luz a todo o mascaramento e fraude das eleições mesmo que a Comissão, ilegítima, quisesse mostrar isso como eventuais “irregularidades” transformando essa palavra em palavra da moda após as eleições de 09 de agosto e 25 de outubro.
O relatório veio confirmar através de diversas testemunhas que denunciaram o “recheio” das urnas e dos boletins de votação. Isso mostrou de forma muita clara e não há correções possíveis para esse tipo de situação. Portanto, as informações procedentes desse relatório nos colocam em situação confortável para exigir a anulação das operações realizadas no dia 09 de agosto e 25 de outubro. Nesse sentido, todas as tentativas para salvar as eleições mergulhou o país de cabeça nesse lamaçal. É por isso que convidamos, uma vez mais, todos os cidadãos mulheres e homens que amam o país, que tem conexão com a luta e gostariam de ver o país tomar o caminho do progresso e sonharmos e de maneira muito séria acabarmos com a corrupção e fraudes nas no Haiti.
Aproveitamos para lembrar que essa petição para cidadãos e cidadãs possibilite um acordo sobre a anulação das eleições está aberta a assinaturas. Ela está disponível nas universidades, organizações de mulheres, nas rádios, Partidos Políticos democráticos e nas organizações de direitos humano.
“Não houve eleições em 09 de agosto e 25 de outubro”
Marie Frantz JOACHIM
Coordenadora geral – SOFA (Solidariedade as Mulheres Haitianas)