Duas semanas após ter pedido perdão à população paraguaia pelo escândalo provocado pelos supostos casos de paternidade, Fernando Lugo tenta retomar a iniciativa política no cenário internacional. O presidente chega hoje (7) a Brasília para encontrar Luiz Inácio Lula da Silva num encontro que já foi adiado duas vezes.
Numa entrevista coletiva, Lugo anunciou que ia propor ao presidente brasileiro uma nova agenda de relação e de integração, “procurando remover as dificuldades que provocam as assimetrias entre os dois países”. O ex-bispo voltará a expor as reivindicações paraguaias a respeito do aproveitamento da usina hidrelétrica binacional de Itaipu, assim como de um imposto único para o comércio entre Ciudad del Este e Foz do Iguaçu.
Para o assessor presidencial Ausberto Rodriguez, Fernando Lugo já superou a crise das últimas semanas. Numa entrevista concedida terça-feira ao Opera Mundi, ele sublinhou que a popularidade do presidente continua alta, apesar dos escândalos.
“Segundo uma pesquisa feita há apenas dois dias, cerca de 55% dos paraguaios avalia de maneira positiva a gestão do presidente. É menos do que tinha antes (mais de 60%), mas tendo em conta a intensa campanha que sofreu, é uma queda insignificante”, declara Rodriguez. Ele interpreta este número como “uma boa compreensão pelo povo das explicações públicas do presidente e do seu pedido de perdão”.
O assessor considera que a atuação da oposição, que chegou a ameaçar o presidente com uma tentativa de impeachment, demonstra sua vontade de desestabilização. Algumas semanas depois da posse, em agosto passado, Lugo denunciou publicamente a realização de reuniões de opositores para derrubá-lo.
Logo depois dos casos de paternidade, surgiu um “testemunho” que pretendia associar Fernando Lugo ao sequestro e assassinato de Cecilia Cubas, filha do ex-presidente Raúl Cubas, em 2004. “Essa estratégia de desestabilização fracassou: o tal “testemunho” reconheceu ter recebido certa quantia de dinheiro do ex-presidente [Nicanor] Duarte Frutos para fazer uma denúncia falsa”, diz Rodriguez.
Três poderes
O reconhecimento da paternidade de pelo menos uma criança e a crise provocada pela revelação tiveram um lado positivo. O medo do impeachment e de um enfraquecimento da Aliança Patriótica pela Mudança (APC, na sigla em espanhol) revelaram a necessidade de retomar as relações com os movimentos sociais para organizar uma resistência. Para o assessor presidencial, “esta situação serviu para todos, não apenas o presidente, tomarmos consciência da urgência de rearticular os movimentos sociais e populares um pouco dispersos e perdidos desde a chegada ao poder”.
A reativação da APC é também uma prioridade. Fernando Lugo tem que preservar o apoio do Partido Liberal Autêntico Radical (centro-direita), maior agremiação da aliança governista, embora a sua relação com o principal expoente liberal do governo, o vice-presidente Federico Franco, tenha se deteriorado nos últimos dias.
O vice-presidente reclamou das últimas mudanças no gabinete, que marginalizaram seus seguidores. “Franco quer um papel nas decisões do Executivo mais importante do que deveria. Também reivindica mais cargos para seus partidários, o que não dá para satisfazer. Todos os componentes da APC receberam sua parte de cargos no governo. Se a gente oferecer mais para alguns, isso provoca um desequilíbrio muito perigoso”, analisa Rodriguez.
O presidente acabou de convocar uma reunião dos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) para facilitar a governabilidade. Para Rodriguez, os atritos entre Lugo e Franco não são uma surpresa. “Infelizmente, isso é política. A APC é um conglomerado de forças políticas e sociais com origens ideológicas muito diversificadas, e as contradições surgem. Tudo agora depende da inteligência e da serenidade dos principais atores para superar as divergências”, declara.
Máquina pública
Olhando o último ano desde a eleição de Lugo, em abril de 2008, Rodriguez pede um pouco de paciência e compreensão. Ele reconhece que poucas medidas prometidas – especialmente a reforma agrária – foram cumpridas. Mas alega que o governo usou esse tempo para se tornar íntimo dos bastidores da administração pública. “Isso parece uma desculpa, mas é uma experiência totalmente nova para nós. Temos que lembrar que durante 60 anos a oposição monopolizou toda a máquina pública. Aprender a lidar com essa estrutura é um ponto extremamente positivo”.
O assessor presidencial, que trabalha há muitos anos com Fernando Lugo, acrescenta que situações de emergência impediram a execução de qualquer programa de governo. Ele se refere à longa seca que afetou o Chaco e a chamada Região Oriental.
“Existem problemas graves de fome e sede nas comunidades mais desfavorecidas, sobretudo indígenas. Além disso, os habitantes foram afetados pelo forte declínio da produção agrícola de produtos exportáveis, como soja e gergelim”, explica. A queda consequente na entrada de divisas foi acentuada pela crise econômica mundial.
Rodriguez assegura que com a nova equipe, mais homogênea, o segundo ano de mandato vai começar com uma estratégia mais clara. “Até agora, não deu para executar os projetos inicialmente previstos. Mas a mudança prometida vai acontecer”.
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