De um lado, a colônia judaica de Elkana; do outro, o muro israelense, que corta o povoado palestino de Mas'ha, na Cisjordânia; no meio, a família de Hani Amre.
Aos 53 anos, Amre mistura em seu interior a firme convicção de que, apesar dos obstáculos, nunca abandonará sua terra, com a amargura de fazer várias vezes o relato de uma vida muitas vezes sombria.
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Apoiado em seu rudimentar cajado e com um gorro branco na cabeça, Amre não está disposto a reviver o passado de sua família, que engrossou a lista dos 750 mil palestinos que fugiram ou foram expulsos de seus lares entre 1947 e 1949, na guerra conhecida por como Nakba (“tragédia”, em árabe) e que levou ao estabelecimento do Estado judeu.
“Esta é minha casa e vou ficar. Não preciso pensar duas vezes. Sei que enquanto isso vou sofrer, mas escolhi ficar e viver com dignidade”, diz Amre ao lado de sua casa, onde mora com sua mulher e seus seis filhos, num caso excepcional de aprisionamento nos territórios palestinos ocupados por Israel.
Amre terminou de construir sua casa em 1982 num terreno comprado na década anterior. A poucos metros dali, ao mesmo tempo, os ultranacionalistas religiosos do movimento israelense Gush Emunim levantavam o assentamento judaico de Elkana.
Anos depois vieram as demolições: primeiro de uma ampliação que fez da casa e depois, em plena Segunda Intifada, que tinha começado em 2000, de uma floricultura onde há agora uma sucessão de blocos de concreto de oito metros de altura.
A construção do muro israelense pelo Governo de Ariel Sharon, em 2004, por causa de uma onda de atentados suicidas palestinos, transformou a casa de Amre em uma autêntica jaula, mas também reforçou sua determinação de resistir.
“Foi então que perdi a esperança de começar um novo negócio, mas ao mesmo tempo foi quando soube que nunca deixaria a casa”, lembra, enquanto se inclina para acalmar sua frequente dor nas costas.
Após anos de manifestações, pressão internacional e batalhas legais, Amre obteve do Exército israelense uma chave da comporta na barreira, que fica ao leste e ao sul de sua casa. À frente, há um posto militar, e ao oeste, a cerca que rodeia a colônia.
Assim, este palestino que normalmente demoraria cinco minutos a pé para chegar ao seu trabalho de manutenção de um antigo poço, se vê obrigado a usar seu carro para atravessar cinco povoados e uma reserva, em um trajeto que dura meia hora na melhor das hipóteses e entre uma hora e meia e duas horas no caso de complicações.
Suas convicções não só deixaram seu dia a dia dependente de cadeados – durante um mês, Amre ficou sem a chave por levar ativistas para sua casa -, mas também o levaram a rejeitar suculentas somas de dinheiro.
“Me propuseram muitas coisas e me ameaçaram para que deixasse minha casa. Uma vez me ofereceram US$ 25 mil. Em outra, puseram sobre a mesa um cheque em branco”, conta.
Além da falta de liberdade de movimento, Amre tem que enfrentar a hostilidade de alguns habitantes de Elkana, cujas bem cuidadas casas ficam a poucos passos da sua, mas separadas pela cerca que rodeia o assentamento.
“Nos atiram pedras, nos insultam. Uma vez quebraram nossas placas de energia solar e inclusive deram tiros para o alto para nos assustar”, resume um Amre de olhar cansado.
Das frases ofensivas que já teve que escutar, “não é bem-vindo” concentra a essência da colonização mais radical dos territórios ocupados palestinos.
Esta colonização baseada nos textos sagrados e na presença judaica na região há dois milênios confere mais direito sobre as bíblicas Judéia e Samaria do que uma história familiar palestina de gerações.
Amre se consola com a esperança de um futuro melhor, no qual grades, soldados e assentamentos sejam uma mera lembrança dos dias de conflito.
“Nunca penso no passado porque é horrível, só no futuro. Um dia, obterei meus direitos e ganharei minha luta. Não sei que preço pagarei, mas sou otimista”, afirma.
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