No próximo dia 25 de novembro, o ex-capitão do Exército Augusto Pinochet III apresentará à sociedade chilena um novo partido político. Em evento para mais de mil convidados em bairro nobre de Santiago, o neto do general que comandou a ditadura militar no Chile entre 1973 e 1990 lançará — no dia em que Pinochet avô completaria 99 anos — uma nova agremiação partidária. O objetivo do Partido da Ordem Republicana Minha Pátria, ou apenas “Minha Pátria”, como os militantes da causa preferem chamá-lo, será defender a obra e o legado do regime militar.
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O ditador Augusto Pinochet, que ficou no poder entre 1973 e 1990, em fotografia com a esposa Lucía Hiriart
Uma das representantes da nova legenda, a advogada Stefani Landeros, em conversa com Opera Mundi, ressalta que “este será um partido nacionalista, e se um de nós diz ‘vou defender esse ou aquele ideal pela Minha Pátria’ é porque a defesa do país e de seus interesses é algo realmente primordial para nós”.
Na prática, o partido já foi formalmente inscrito no Serviço Eleitoral chileno e aguarda a análise das assinaturas entregues para ter o registro confirmado, muito embora já conte com pequenos escritórios na capital e em outras cinco cidades. O lançamento da legenda neste mês aproveita o momento ideal, segundo os organizadores, para anunciar uma agenda de eventos em 2015, ano em que o centenário do ditador será lembrado.
[Neto do ditador, Augusto III aparece como liderança do partido “Minha Pátria”, cujo objetivo será defender legado do regime militar]
Projeto político
Em suas primeiras declarações à imprensa local sobre o ideário por trás do novo partido, os representantes do Minha Pátria se esforçaram em mostrar um partido aberto ao diálogo em temas considerados importantes para a direita tradicional. O próprio Augusto Pinochet III, em entrevista ao canal CNN Chile, pediu aos chilenos que “busquem conhecer primeiro as propostas que defendemos antes de julgar o nosso projeto pelo meu sobrenome”.
Efetivamente, certos princípios declarados pelo Minha Pátria causaram alguma surpresa por sua “moderação”, como a defesa do aborto em casos de risco de vida para a mãe e a inclusão de casais homossexuais na lei de união estável. Em outros assuntos, porém, o discurso do partido se aproxima da direita. Apesar de ser favorável ao uso medicinal da maconha, o novo partido propõe a adoção de um rigoroso protocolo de controle das fronteiras, no esforço de combater o tráfico de drogas e coibir a imigração clandestina.
Outro assunto inevitável para o partido é o dos direitos humanos, e a versão defendida pelos membros do Minha Pátria é bastante controversa. Landeros admite que “no trabalho do restabelecimento da ordem, necessário naquele momento do país, houve alguns excessos, e os responsáveis por isso foram julgado”. No entanto, para Landeros, é “exagero falar em algo sistemático, como uma política de perseguição, como existe em Cuba e na Coreia do Norte, por exemplo”.
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Segundo números da Secretaria Nacional de Direitos Humanos do Chile, durante a ditadura, o Exército e os órgãos de repressão do país sequestraram e torturaram mais de 40 mil cidadãos chilenos e estrangeiros (entre os quais muitos brasileiros). Além disso, a ditadura pinochetista deixou um rastro de 3,3 mil desaparecidos, sendo que menos de um terço dos corpos foi encontrado em trabalhos de busca iniciados somente após a redemocratização.
Na contramão da renovação da direita
Para o sociólogo Eugênio Guzmán, do ILD (Instituto Liberdade e Desenvolvimento), o novo partido vai na contramão da renovação da direita chilena após a derrota eleitoral de 2013, uma de suas piores votações históricas da direita, e que provocou dissidências nos dois partidos tradicionais (RN, mais moderado, e UDI, mais radical), formando novos movimentos, como Amplitude e Evópoli (Evolução Política).
“Os 40 anos do golpe tiveram um peso grande nesse último pleito, e esses novos movimentos na direita surgiram tentando se desligar da imagem da ditadura, apostando no discurso liberal. A própria UDI tentou reformar sua versão sobre o regime e não teve sucesso. O Minha Pátria tentará buscar esse nicho, os órfãos do pinochetismo. Não creio que vá alcançar muito sucesso eleitoral nessa linha”, comenta Guzmán.
O sociólogo lembra ainda que não é a primeira tentativa do nacionalismo pinochetista de criar um novo referente político. Em 2012, foi relançado o partido Avançada Nacional, o único partido no qual o ditador militou, nos anos 1980. Seu único candidato, em 2013, foi justamente Augusto Pinochet III, que tentou ser deputado no distrito de Concepción, mas abandonou a campanha semanas antes do dia da votação.