Poucas horas antes de desembarcar na Cidade do México, hoje (16), o presidente Barack Obama indicou quais são os dois pontos prioritários nas relações bilaterais dos Estados Unidos com o vizinho do sul: nomeou um enviado especial para assuntos relacionados com a fronteira e colocou numa lista negra três organizações mexicanas suspeitas de envolvimento com o narcotráfico.
Isso parece mostrar que a prioridade deixou de ser a imigração ilegal e tornou-se a virtual guerra civil que ocorre nos estados mexicanos da fronteira, o tráfico de drogas e o contrabando de armas, assinalaram vários analistas.
“Estamos assistindo a um momento histórico, em que as prioridades parecem estar se movendo de uma área para outra. A imigração foi para um segundo plano. A segurança fronteiriça é, agora, o mais importante”, apontou o diretor de Diálogo Interamericano, Peter Hakim.
Obama já afirmou que o presidente mexicano, Felipe Calderón, está enfrentando duramente o narcotráfico, mas isso não o impediu de declarar o Cartel de Sinaloa, os Zetas e a Família Michoacana como organizações fora-da-lei e colocá-las numa lista negra nos Estados Unidos. Isso implica, em termos práticos, que os três passam a ser objetivos prioritários do governo norte-americano e que toda a ajuda ao México para combater o narcotráfico será aplicada no combate a esses grupos. É a primeira vez que isso acontece no México.
“Estamos absolutamente comprometidos a trabalhar em parceria com o México”, declarou Obama após encontro com Calderón. “Não é possível enfrentar essa guerra de um lado só. Não é possível ter o México se esforçando e os EUA, não”.
No discurso de boas-vindas, Calderón não tocou no assunto, mas uma fonte oficial mexicana, contatada pelo Opera Mundi, recordou que o México está à espera de uma decisão do Congresso para se pronunciar, e remeteu para as palavras da ministra do Exterior, Patrícia Espinosa, no mês passado, antes da visita da secretária de Estado, Hillary Clinton, ao país.
Segundo a ministra, o plano norte-americano de reforçar o número de agências policiais na fronteira “é congruente” com os planos comuns de enfrentar os cartéis da droga. Sobre o tema específico do envio de tropas norte-americanas à fronteira, ela afirmou apenas que seu governo “tomou nota” do fato e recordou que seu país pediu nos últimos meses aos Estados Unidos “uma maior responsabilidade” no assunto, tendo em conta que é “o primeiro mercado mundial de consumo de drogas”.
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Já a nomeação de Alan Birsin, um antigo funcionário do Departamento da Justiça, como representante para a fronteira, indica preocupação com a insegurança nos estados fronteiriços, que, na ótica da secretária de Segurança Territorial, Janet Napolitano, já começou a ultrapassar a fronteira.
“Não só vamos enfrentar a entrada de drogas, como impedir a saída de armas e dinheiro”, disse Obama numa entrevista ontem (15) à noite.
América Latina
Mas Obama também levou ao México outro objetivo importante: recuperar a confiança da América Latina, uma área geográfica que os Estados Unidos abandonaram por mais de uma década. Ao longo desses anos, uma série de países elegeu governos de esquerda, muitos com uma política anti-EUA.
A viagem acontece também em um momento em que muitos nos Estados Unidos, em particular os militares, pensam que o México é um “Estado fracassado”, pela incapacidade de combater o narcotráfico, que, em muitas cidades fronteiriças, controla populações inteiras.
Cinco meses atrás, o Pentágono publicou um relatório em que fala da possibilidade de o México entrar em colapso. Inclusive, em termos de cenários violentos, o documento afirma que, no mundo, somente o Paquistão é mais inseguro que o país vizinho.
Os mexicanos se indignaram com o relatório. A administração Obama procurou se desvincular do fato mas, dois meses depois, mandou a secretária de Estado, Hillary Clinton, à Cidade do México para acalmar os ânimos. “A responsabilidade pelo tráfico de drogas é de ambos os países. Os Estados Unidos não escondem sua parcela de culpa nesse assunto”, disse Hillary na época.
Ontem, ela voltou a mencionar o assunto, o que dá uma ideia de que não foi esquecido. “De maneira nenhuma os Estados Unidos consideram que o México é um estado fracassado”, afirmou.
Parcela de culpa
Também há divergências. Obama não parece inclinado a cumprir a promessa de campanha de proibir a venda de armas automáticas, um desejo dos mexicanos, que consideram as armas uma das razões para o banho de sangue na fronteira. Desde 2006, quando Calderón enviou soldados para tentar garantir a segurança, já morreram 10 mil pessoas.
Também há problemas em termos comerciais. Calcula-se que cerca de 80% das exportações mexicanas são destinadas ao vizinho do norte, mas esse número tem baixado.
A favor dos norte-americanos, está o limite que os Estados Unidos colocaram ao uso das auto-estradas do país por caminhões mexicanos. Em contrapartida, o México aumentou em 9% diversas tarifas alfandegárias.
Obama passará a noite na Cidade do México, antes de voar para Trinidad e Tobago, para a 5ª Cúpula das Américas, onde terá a oportunidade de conhecer seus pares da região. Lá, uma intensa agenda o espera, incluindo o tema de Cuba e o embargo econômico.
No México, o presidente afirmou que a suspensão das restrições de viagens e remessas de dinheiro para Cuba representa “uma demonstração de boa vontade” e que espera que o governo cubano responda. Disse que a mudança não ocorrerá de repente e que “uma relação congelada durante 50 anos não derrete da noite para o dia”.
Felipe Calderón, por sua vez, pediu a Obama que reflita sobre a eficácia do embargo dos EUA a Cuba, o que para ele foi uma medida “pouco útil”. Em vigor desde 1962, o embargo econômico ainda não foi suspenso pelos EUA.
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