Sexta-feira, 11 de julho de 2025
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Os seguidos meses de agitação política em Madagascar, que culminaram hoje (17) com a queda do presidente Marc Ravalomanana, são capítulos de uma crise que promete se desenrolar por mais algum tempo, talvez levando a uma guerra civil. A opinião é de Stephen Ellis, especialista em história e política de Madagascar do Centro de Estudos Africanos em Leiden, Holanda.

“Apesar de diversos setores magalxes – cidadãos nascidos na ilha africana – terem demonstrado insatisfação com o governo de Ravalomanana desde a sua primeira eleição, em 2002, tampouco há uma percepção no país de que o provável novo líder tenha condições de assumir o poder”, afirmou o especialista ao Opera Mundi, por telefone.

Ellis refere-se ao prefeito da capital Antananarivo, Andry Rajoelina, de 34 anos, que se proclamou chefe de uma “alta autoridade de transição”, prometendo elaborar uma nova Constituição e convocar eleições dentro de dois anos. Pela Constituição atual, ele não pode ser o presidente, já que a idade mínima é 40 anos.

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Presidente é deposto

Segundo o especialista, há uma clara divisão no país. “Há tanto a possibilidade de a população assistir a esta situação anômala, de um vácuo de poder prosseguir até que eleições sejam convocadas, ou que seja iniciado um conflito interno, o que não é difícil em um país que já vivenciou momentos terríveis de guerra no passado”.

Histórico

Madagascar é uma ex-colônia francesa e se tornou independente em 1960. De 1972 a 2001, um regime ditatorial e isolacionista governou o país, deixando o poder somente após a eleição de Ravalomanana, que assumiu o poder em 2002 com um discurso progressista e focado na “mudança”.

O presidente, que antes de ser eleito era um bem-sucedido homem de negócios, adotou uma política corporativista em sua gestão, o que acabou desagradando a muitos, explica Ellis. “Ravalomanana enfatizava a eficiência e aquele que não atendesse às suas expectativas era logo demitido. Em um ambiente político, essa lógica normalmente não funciona. Conquista-se muitos inimigos”.

Ravalomanana também começou a tecer estreitos laços com o Ocidente, principalmente com os Estados Unidos, o que desagradou às alas mais antigas da política magalxe. “Era um grande amigo da administração Bush”, diz o especialista.

Segundo ele, no entanto, seu maior erro foi ter contrariado a estrutura política, baseada nas tradições do país. “Há uma organização orientada pelos diferentes grupos étnicos que vivem na ilha, que têm tarefas muito bem distribuídas. Ravalomanana se posicionou contra isso, o que para ele era um atraso, e deixou de contentar importantes setores, como o Exército, que hoje está contra ele”.

Rebelião começou na caserna

Grande ator da história magalxe, o Exército se manteve isento das decisões políticas do país desde a volta da democracia. O posicionamento atual denuncia o descontentamento generalizado. “O presidente pouco fez pelos soldados, que vivem em condições ruins nos quartéis. Por isso observamos que eles foram os primeiros a se rebelar”.

Aproveitando-se da situação, Rajoelina, um ex-DJ que se revelou um político “fraco e despreparado”, na avaliação de Stephen Ellis, angariou apoiadores e conseguiu, após três meses de intensos combates que deixaram 100 mortos, forçar a renúncia do presidente. Ele sabia que conquistaria apoio. “É conhecida em Madagascar a máxima de que a população, inevitavelmente, acaba apoiando aquele que está no poder, quem quer que seja”.

Pronta para morrer

O futuro da ilha africana é incerto. “Duvido que Rajoelina consiga permanecer por muito tempo no poder, isso se ele realmente for apontado como o novo presidente, o que ainda é incerto. O apoio do Exército e dos setores descontentes com Ravalomanana reside sobre uma fina camada de gelo: a qualquer momento, ela pode se romper”.

“Estou totalmente desencorajada. Essa é uma situação que eu nunca experimentei antes. Estamos à beira de uma guerra civil”, disse uma dona de casa entrevistada pela BBC, identificada apenas como Rindra, de 34 anos, que foi para o palácio presidencial com outras 2.500 pessoas para proteger o presidente.

“Não tínhamos armas, nada. Pensei: 'Se os soldados atirarem em nós, morreremos. Mas seria pelo bem do meu país”, declarou. “Sou casada e tenho um filho de 4 anos, mas estou pronta para morrer pelo meu país”.

O presidente Marc Ravalomanana está foragido no palácio presidencial de Iavoloha, a cerca de 15 quilômetros da capital, segundo a agência EFE.

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