No próximo domingo, 4 milhões de bolivianos irão às urnas para aprovar ou rejeitar a nova Constituição do país mais pobre da América do Sul. O referendo nacional, evento que mais mexe com o país desde a histórica eleição de Evo Morales, em dezembro de 2005, deve aprovar o novo texto, segundo os prognósticos. Mas os governistas percorreram uma estrada sinuosa para chegar a esse ponto e, apesar da vantagem, as campanhas continuam em marcha acelerada.
Os bolivianos são bombardeados diariamente por partidários do governo e da oposição com cópias da Constituição, composta por 411 artigos, e outros itens de propaganda em praças do país. À noite, oito em cada dez comerciais de tevê atacam ou defendem o texto. Os outros dois contentam-se em pedir às pessoas que votem.
A campanha do partido governista MAS (Movimento ao Socialismo) destaca elementos progressistas da Carta Magna, como a expansão dos direitos e da autonomia indígenas, os limites à privatização de recursos naturais e a posse de terras. Também procura desacreditar mitos criados pela oposição, como a eliminação dos diretos de propriedade privada e a proibição do casamento gay.
Os líderes da oposição, baseados nos estados ricos das planícies orientais, apontam perigos no aumento do poder indígena e lamentam que o governo federal mantenha controle sobre a legislação referente à terra e aos royalties do gás. A direita fez de tudo para transferir essas responsabilidades para os departamentos, num movimento pró-autonomia defendido através de várias greves de fome, que provocou confrontos violentos nos últimos tempos, ao mesmo tempo em que lutou para derrubar a proposta de reforma constitucional.
A controvérsia sobre o novo texto não é nova. A Assembléia Constitucional, cujos 255 membros foram eleitos por voto popular em julho de 2006, passou os primeiros nove meses debatendo regras e os três seguintes decidindo se Sucre deveria se tornar sede do governo – atualmente é La Paz. Ao cabo de 15 meses, os delegados haviam chegado a poucos acordos, mas ataques violentos haviam se tornado freqüentes.
Em novembro de 2007, uma primeira versão do texto foi aprovada num quartel do Exército – local escolhido para evitar sabotagens –, provocando fortes protestos da oposição e violentos conflitos que ceifaram a vida de duas pessoas. No mês seguinte, apesar dos protestos da oposição, a proposta foi enviada ao Congresso, mas concessões foram feitas e o teor da versão final foi alterado.
Além da Constituição propriamente dita, os eleitores vão poder escolher se as propriedades rurais serão limitadas em 5 mil ou 10 mil hectares por proprietário – cada hectare equivale a um campo de futebol. Num país onde menos de 1% da população é dona de mais de dois terços da terra, a limitação, seja em 5 mil ou 10 mil, representa um avanço significativo para a maioria pobre.
Pesquisas recentes conduzidas pelo instituto governista Observatório de Gestão Pública apontam que 65% dos eleitores devem votar a favor da Constituição e o “sim” deve perder em apenas três dos nove estados (Santa Cruz, Tarija e Pando). Se isso ocorrer, será uma vitória significativa de Evo Morales, que sempre prometeu uma nova Constituição. A oposição não costuma divulgar pesquisas.
É provavelmente por isso que ele aparenta tranqüilidade. Numa rara entrevista ao canal de tevê estatal, ontem à noite, ele concluiu. “Estou seguro de que no próximo domingo, a essa hora, o povo estará festejando o triunfo, a consolidação de um processo constituinte, de mudança e pela igualdade no qual todos os bolivianos estamos apostando”.
Até o dia do referendo, o Opera Mundi vai abordar os principais aspectos da nova Constituição proposta por Evo Morales. Leia o texto na íntegra.
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