Efe
Policiais em Moscou prendem líder do movimento LGBT da Rússia e organizador do evento, Nikolai Alekseyev
A tentativa de organizar neste domingo (27/05) uma parada gay em Moscou foi mais uma vez frustrada pela forte ação policial. Religiosos também se concentraram no centro da capital russa para impedir que os ativistas LGBT protestassem contra o projeto de lei anti-propaganda gay que está sendo discutido em Moscou. A lei já entrou em vigor em cinco regiões da Rússia.
Ao todo, dez pessoas foram detidas – três membros da Igreja Ortodoxa Russa e sete ativistas gays -, incluindo o principal líder do movimento LGBT da Rússia e organizador do evento, Nikolai Alekseyev. Todos foram liberadas em seguida. Alguns membros da Igreja Ortodoxa chegaram a exibir cartazes provocativos com frases como “Moscou não é Sodoma”.
As autoridades de Moscou negam desde 2006 a autorização para a realização da parada gay, mas alguns poucos ativistas, geralmente não mais do que 20, se reúnem na praça Manej, ao lado do Kremlin, e caminham até a Duma, a câmara baixa da Assembleia Federal da Rússia. A cena se repete todos os anos e o desfecho é sempre o mesmo.
Uma pesquisa realizada em julho de 2010 pelo Centro para Pesquisa de Opinião Pública da Rússia revelou que 74% dos russos acreditam que gays e lésbicas têm um desvio moral ou um problema mental. Dos entrevistados, 39% acreditam que os homossexuais devem ser tratados à força para que mudem a sua orientação sexual e 24% acreditam que devem ser enviados a psicólogos.
Quando o assunto é a igualdade de direitos, as respostas são menos negativas. 45% dos russos acreditam que gays e lésbicas devem ter os mesmos direitos dos cidadãos heterossexuais. No entanto, apenas 14% apóiam o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Quase a totalidade dos entrevistados – 84% dos russos – é contrário à parada do orgulho LGBT.
Em uma de suas capas, em abril, a revista Bolshoi Gorod (Grande Cidade) colocou o polêmico título: “Neste número, nas páginas 18-31, mostramos que a orientação homossexual também é normal, como a heterossexual. Não mostrem esta edição aos idiotas e aos deputados de São Petersburgo”. As cores do arco-íris na borda completaram a capa.
NULL
NULL
No entanto, a diversidade sexual não é um tema comum na mídia russa e quando é exibido pelos grandes meios de comunicação, geralmente é retratado de maneira estereotipada – como o gay afeminado e engraçado – ou como um “mal do Ocidente”.
“Artistas e estrangeiros podem ser gays porque já são excêntricos ou diferentes, mas com o vizinho ou colega de trabalho, o tema não existe”, explica Fyodor, um jovem gay que foi à parada de Moscou. “Até mesmo entre a população jovem moscovita o tema é um tabu e os gays preferem esconder sua sexualidade ou revelá-la apenas aos mais próximos”, diz.
Tema proibido
Andrei e Aleksei têm 32 anos e estão juntos há sete. Mas vivem uma vida dupla. Para os amigos próximos, são um casal. Para a sociedade, apenas dividem apartamento como bons amigos. A cumplicidade que os dois compartilham é proibida na Rússia.
Sandro Fernandes/Opera Mundi
Andrei (direita) com o parceiro Aleksei: “queremos ter filhos, mas provavelmente teremos que fingir que as crianças têm pais divorciados”
“Aqui é um tema proibido. Não falamos sobre isso porque tememos a reação das pessoas”, afirma Andrei. “Eu contei aos meus pais há 11 anos e eles demoraram muito para aceitar. Ficaram tristes, confusos, perdidos, deprimidos”. Ele quer contar a verdade à tia, mas também tem medo de que ela tenha uma reação negativa. “Gostaria de falar com ela abertamente sobre este lado da minha vida, mas não sei como tocarei no tema”, diz.
O medo do ostracismo social é a principal preocupação da comunidade LGBT e suas famílias. “Quando falamos com nossos pais sobre a nossa relação, a primeira pergunta foi a respeito dos netos”, conta Andrei. Na Rússia, os jovens ainda sonham com o casamento tradicional, mesmo nas grandes cidades, e poucos chegam aos 30 anos solteiros.
“Nós também queremos ter filhos, mas provavelmente teremos que fingir que as crianças têm pais divorciados e o outro rapaz é o tio ou amigo. Para o nosso círculo de amigos, seremos uma família homoparental. Para a sociedade, seremos amigos vivendo juntos e criando uma criança. Se ficarmos na Rússia, esta é a maneira mais fácil para que um casal gay tenha filhos”, explica Aleksei.
Os problemas do casal se estendem ao dia-a-dia. Alugar um apartamento como um casal, por exemplo, é algo impensável. Os rapazes precisam fingir que são solteiros querendo dividir o apartamento e a cama de casal. Os russos fecham os olhos diante da obviedade e preferem fingir que a situação não existe. Não é um preconceito direto, mas geralmente, uma discriminação que força ao mútuo consentimento da invisibilidade. “Nós temos sorte porque nossos amigos não olham para a nossa sexualidade. Temos amigos gays e heterossexuais e isso nunca foi um problema”.
O mexicano Enrique é apaixonado pela Rússia, por um russo e pela praça Vermelha. Namora há um ano e meio o tímido Dima, nascido na cidade de Chelyabinsk, perto dos Montes Urais, fronteira geográfica da Europa e da Ásia.
A família de Enrique sabe que os dois jovens moram juntos e são um casal. A família de Dima não. E nem vai saber. Para eles, Enrique é o seu melhor amigo e Dima prefere assim. “Acho melhor tratar o tema como algo privado, sem envolver a minha família. Se eles soubessem que sou gay, não seria fácil para ninguém”, justifica.
Sempre que estão na rua, Dima pede a Enrique, de coração e gestos latinos, que não demonstre seu afeto. “Tenho medo da discriminação e até mesmo de agressões físicas”, revela o russo.