A revelação pelo Wikileaks dos mais de 250 mil relatórios produzidos por funcionários do governo norte-americano em todo o mundo entre 2003 e fevereiro de 2010 provocou um desconforto diplomático internacional, porém, não terá qualquer impacto na segurança de funcionários dos Estados Unidos ao redor do mundo, na opinião de especialistas entrevistados pelo Opera Mundi.
A afirmação contraria o que a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton e congressistas dos EUA disseram ontem (29/11) após o escândalo, que os fundadores da organização “têm as mãos sujas de sangue por criarem riscos a diplomatas e agentes de inteligência”. O senador Peter King chegou a pedir a Hillary que inclua o Wikileaks na lista de terroristas internacionais.
Para Stephen Zunes, professor de Política Internacional na Universidade de São Francisco, os documentos e vídeos publicados anteriormente pelo mesmo site, falando sobre segredos de guerra no Afeganistão e no Iraque, eram muito mais perigosos para a segurança das pessoas envolvidas e que “dessa vez, se criou uma situação desconfortável para o governo e seus diplomatas, mas não coloca ninguém em risco.”
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Alison Peters, professora de Relações Internacionais da Universidade de Nova York e especialista em diplomacia, contou que mais de 500 mil pessoas tinham acesso aos documentos diplomáticos confidenciais que foram publicados pelo Wikileaks. “Depois dos atentados de 11 de setembro, ficou claro que o grande erro da inteligência e da diplomacia norte-americana foi a falta de comunicação entre as agências. Para remediar esse problema, foi criado um novo: a falta de segurança para informações confidenciais.”
“Se você tem um segredo e quase um milhão de pessoas têm acesso irrestrito a ele, já não é mais um segredo”, disse.
Zunes passou os últimos anos pesquisando arquivos diplomáticos em Washington. Segundo ele, o que foi publicado pelo Wikileaks é muito parecido com o que lê diariamente. “No entanto, eu pesquiso documentos com pelo menos 30 anos de idade, e com o tempo o impacto é bem menor. Ler esse tipo de comentários feitos por diplomatas que ainda são embaixadores e ainda estão nos países onde esses comentários foram feitos, cria uma situação infinitamente mais delicada.”
Para os especialistas é evidente que algumas regras terão que mudar a partir de agora. “Nem tudo está perdido. Entre as informações que vazaram não há nada classificado como 'top secret'. Mesmo assim, é uma situação extremamente embaraçosa para o governo. Imagino que um sistema paralelo, com menos participantes, terá que ser criado para evitar que isso se repita no futuro”, afirmou Peters.
“Existe uma série de diplomatas furiosos com o governo, principalmente o anterior, do ex-presidente George W. Bush, por tê-los obrigado a cumprir algumas funções de inteligência, reunindo informações especiais”, explicou Zunes. “De certa forma, a publicação desses documentos é ainda uma reação contra o ex-presidente, por ele ter mentido tanto para justificar suas ações, como a guerra no Iraque.”
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Reduzindo o impacto
O governo norte-americano passou toda a segunda-feira tentando remediar o embaraço criado. Hillary afirmou que a publicação de 250 mil documentos confidenciais do Departamento de Estado dos EUA não representa somente um ataque à diplomacia do país, mas sim à toda a comunidade internacional. Ela também relatou que encontrou bom humor em uma conversa realizada com o oficial de um outro país, quando ele disse: “Não se preocupe, você não pode imaginar o que nós falamos de vocês”.
Porém, entre diplomatas estrangeiros nos EUA, o dia foi de silêncio total. Além de duas ou três linhas oficiais demonstrando apoio ao governo dos EUA, diplomatas não quiseram comentar as informações publicadas. Opera Mundi contatou as embaixadas do Reino Unido, Arábia Saudita, Rússia, Itália e França, mas nenhuma delas quis comentar o vazamento.
O porta-voz da embaixada paquistanesa em Washington, Abdul Basit, afirmou que seu país não considera verdadeiros os arquivos do Wikileaks. “A veracidade desses documentos ainda deve ser comprovada”. Basit negou que Islamabad tenha vendido ou transportado material nuclear ao Irã, conforme diz um dos arquivos vazados no domingo. “O nosso programa de energia nuclear existe desde os anos 1960 e ninguém, além dos engenheiros paquistaneses, pode tocá-lo”, disse Basit, que não quis falar sobre os supostos comentários negativos do rei saudita Abdullah sobre o presidente paquistanês. “O Paquistão e a Arábia Saudita têm uma relação de respeito e irmandade, esse documento não vai modificar isso”, concluiu.
Espionagem na ONU
Uma das afirmações mais delicadas para Washington foi a de que Hillary Clinton teria pedido a diplomatas na ONU (Organização das Nações Unidas) que investigassem o secretário-geral da organização, Ban Ki Moon, e outros alto funcionários. Em um comunicado oficial, a ONU também levantou dúvidas sobre a veracidade dos documentos, mas lembrou que a convenção que estipulou a criação da organização garante imunidade e privilégios.
A assistente do porta-voz de Ban Ki Moon, Eri Kaneko, disse que a ONU planeja realizar uma investigação rigorosa para descobrir se as informações vazadas pelo Wikileaks são verdadeiras. Kaneko não quis comentar o que a ONU planeja fazer depois disso, caso as informações sejam comprovadas.
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