Israel Defense Forces / Flickr CC
Soldado nos arredores de Nablus, na Cisjordânia: cidade está sob controle da Autoridade Palestina mas Israel controla seus arredores
Ano passado, entre os meses de julho e agosto, a ofensiva militar de Israel em Gaza estabeleceu recordes por vários motivos. Foi a mais longa entre as três campanhas militares israelenses desde 2008. Foi a mais sangrenta. E também a que contou com o maior número de mulheres em posições de combate em toda a história das ações militares israelenses.
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As Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês) adoram celebrar suas combatentes. Os porta-vozes do exército israelense são sagazes nas mídias sociais e frequentemente postam perfis de mulheres israelenses servindo em unidades de minas, instrução de tiro e patrulhas de fronteira. Há algumas semanas a IDF celebrou um novo marco para as mulheres: a primeira soldado no Comando de Fronte Interior.
Meet one of the 1st female combat soldiers of the Home Front Command serving in Nablus. pic.twitter.com/IY4TlnxD3s
— IDF (@IDFSpokesperson) 24 julho 2015
À primeira vista, este tweet parece um anúncio de relações públicas do governo de Israel. Preste atenção à locação da soldado. Nablus fica na Cisjordânia, e é na realidade a maior cidade palestina na Área A – supostamente sob total controle palestino. Entretanto, Israel controla quase todo o território nos arredores da cidade e frequentemente envia tropas a cidades palestinas mesmo que no papel não tenha nenhuma jurisdição nesses locais. Quando três garotos judeus de um assentamento na Cisjordânia desapareceram, a IDF invadiu casas, prendeu centenas de pessoas em operações nos arredores de Nablus e matou nove civis palestinos. Estas ações foram classificadas como punição coletiva e criticadas por grupos internacionais de direitos humanos.
O Exército dos Estados Unidos já buscou em Israel exemplos de como aumentar a presença de mulheres nas Forças Armadas. E não apenas mulheres – a IDF se gaba por aceitar soldados gays, lésbicas e trans e até veganos. Olhando o feed do Twitter da instituição, não me surpreenderia se um leitor casual considerasse a IDF um bastião de valores progressistas. E não é só o que o Exército israelense diz oficialmente. Foi criada toda uma cultura pop sobre mulheres na IDF, incluindo romances infantojuvenis para adolescentes judeus sobre garotas norte-americanas que se realizam ao abandonar o lar e se alistar no Exército (acompanhados por estranhos ainda que hilários vídeos promocionais).
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Mas políticas de representação não são o suficiente. Feministas nos EUA, por exemplo, reconhecem que o fato de haver mulheres que militam contra os direitos reprodutivos no país não torna o movimento antiaborto feminista. Do mesmo modo, apenas contar o número de mulheres e pessoas LGBT no Exército não é uma causa a ser celebrada, quando aquele Exército é responsável por décadas de ocupação militar e brutalidade. Um feminismo que comemore a aceitação de mulheres e pessoas LGBT em sistemas de opressão e violência não é um feminismo justo.
Não há nada de progressista nas Forças de Defesa de Israel, onde soldados de qualquer gênero e sexualidade violam direitos humanos. Eles arrancam pessoas palestinas de suas casas no meio da noite e as detêm indefinidamente sem direito a julgamento. Não há nada de progressista nas bombas que caíram sobre Gaza durante a campanha militar de 2014, quando Israel assassinou mais de 2.000 pessoas palestinas, mais da metade delas civis e mais de 500 crianças, além de ter deixado milhares feridas e mutiladas. E não há nada de justo nas ações da IDF: enquanto os veículos de mídia do Estado israelense justificam tudo em nome da segurança, na realidade é a ocupação militar e o apartheid imposto por Israel sobre a população não-israelense e palestina de Cisjordânia e Gaza as verdadeiras ameaças à vida e à propriedade. E com o recente ataque durante a Parada do Orgulho Gay de Jerusalém, o fanatismo profundamente arraigado na sociedade israelense mostra sua face mais do que nunca. Vídeos recentes mostram que, mesmo caminhando casualmente pelas ruas de cidades israelenses, homens gays enfrentam homofobia.
A vida não é segura para pessoas palestinas sob a ocupação e o apartheid, sejam elas mulheres, LGBT ou veganas. São dois pesos e duas medidas: a celebração da diversidade nas Forças de Defesa de Israel e a negligência deliberada da terrível qualidade de vida das pessoas palestinas de qualquer gênero e sexualidade sob a ocupação. Todos os tweets positivos do mundo sobre soldados mulheres e gays não vão compensar isso.
Tradução: Carolina de Assis
Artigo original publicado no site norte-americano Feministing.