“Foi muito trabalho para chegar aqui. Muito trabalho da minha equipe no Brasil e da equipe do museu”. Foi assim que o artista brasileiro Ernesto Neto resumiu os meses de preparação que antecederam sua exposição inaugurada nesta sexta-feira (14/02) no Museu Guggenheim, na cidade espanhola de Bilbao. Intitulada “O corpo que me leva”, a mostra traz para o público espanhol algumas das mais conhecidas obras do brasileiro.
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O artista plástico contemporâneo carioca Ernesto Neto na inauguração no Guggenheim de Bilbao
As esculturas e instalações de Neto têm grandes dimensões e se adaptam ao local de exposição, isso obriga o artista a rearranjar as obras sempre que são expostas em uma nova galeria. É preciso redimensionar o trabalho e acomodar a sequência das obras de acordo com a dimensão do recinto e com a disposição das salas. “Quando vim aqui em setembro, a ideia original é que fossem menos salas, mas depois de avaliar os locais e a organização das obras, eu pedi mais duas salas e o museu concedeu todo o segundo andar”, conta Neto.
Por ser um resumo de todo o seu trabalho, além de ter que ambientar as obras ao local, Neto também teve que revisitar suas esculturas mais antigas. “Quando fazemos um trabalho, estamos muito envolvidos na obra […] e quando refazemos esta obra 10, 15 anos depois, é diferente. […] Tive que voltar a muitas coias, repensá-las e refazê-las”, explica.
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Visitante observa obra de Ernesto Neto; instalações ocupam salas inteiras
O Brasil de Neto
O entorno no qual vive o artista é algo fundamental para Neto. Nascido no Rio de Janeiro, o brasileiro carrega em parte de suas obras sua visão da cidade e do país. Na instalação “Baleiro Bala”, ele expõe objetos característicos do Brasil, como instrumentos de percussão, e referências a sua vida na cidade maravilhosa, como o forno improvisado para assar queijo coalho utilizado por vendedores ambulantes nas praias cariocas.
As recentes manifestações que tomaram o país a partir de junho de 2013 também aparecem em sua obra. Em três quadros expostos em uma das paredes do museu, o artista trouxe elementos que se tornaram comuns no Brasil com os diferentes protestos que ocuparam as ruas das principais cidades, como garrafas de vinagre e máscaras de gás.
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Instalação “Baleiro Bala”: Neto utiliza referências e objetos característicos do Rio de Janeiro e da cultura brasileira
A cultura brasileira está presente em praticamente toda a exibição. No espaço “Borda Doce”, Neto cria um ambiente que fomenta a interação das pessoas, com almofadas e instrumentos musicais, o artista convida os visitantes a trocar experiências. A inspiração para esta instalação foi uma viagem que Neto realizou à Amazônia. Durante uma semana ele visitou uma tribo no Acre e tentou recriar o ambiente de culto dentro do espaço do Guggenheim.
A viagem marcou tanto o artista que ele levou dois integrantes da tribo de etnia Huni Kuim para cantar e dançar durante a abertura da mostra. Fabiano Txana Bane e Dalva Axani chamaram a atenção da imprensa estrangeira, o que podia ser um reflexo tanto da originalidade do artista como do reforço aos estereótipos brasileiros gravados no imaginário europeu.
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Fabiano Txane Bane e Dalva Axana, da tribo acreana de etnia Huni cantam no Guggenheim: originalidade ou reforço de estereótipos?
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Formas, cheiros e interação
Outra das características de Neto é o papel central que o artista confere aos visitantes em suas obras. Todos os espaços destinados à exibição do artista possuem manuais de instruções, explicando às pessoas como se pode e se deve desfrutar do trabalho do brasileiro. Suas esculturas são feitas para serem tocadas, pisadas, cheiradas e vivenciadas. O próprio artista admite que “agora as obras não são mais minhas, do artista, elas pertencem ao povo de Bilbao” e de todos aqueles que vieram ao museu.
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O consumo da arte de Ernesto Neto é sensorial: instalações são feitas para serem tocadas, pisadas, cheiradas e vivenciadas
E é no espaço “Troca Troca” que esta frase de Neto assume seu sentido de forma mais literal. O artista disponibilizou diversos objetos que trouxe de sua casa no Brasil. Eles estão à disposição para que as pessoas os troquem por um objeto pessoal. Assim, a obra ficará em constante mudança enquanto os objetos vão sendo trocados entre os visitantes provenientes dos mais distintos lugares.
Neto sempre deixou claro que suas esculturas têm como grande inspiração o corpo e a natureza. As formas predominantemente arredondadas que por vezes lembram gotas que caem do teto instigam os visitantes. A imensa instalação “O corpo que cai (Le corps) fêmea (de Leviathan Thot)” ocupa quase todo o átrio de entrada do museu e demonstra que, possivelmente, nunca a arquitetura de Frank Gehry tenha combinado tanto com um trabalho exposto no Guggenheim.
*O jornalista foi a Bilbao a convite do Museu Guggenheim