A Justiça de El Salvador libertou nesta segunda-feira (17/01) uma mulher presa há nove anos por ter sofrido um aborto, considerado homicídio qualificado no país. As autoridades salvadorenhas haviam sentenciado Kenia, ainda adolescente, a 30 anos de prisão pela emergência obstétrica.
A ONG Associação dos Cidadãos para a Descriminalização do Aborto Terapêutico, Ético e Eugênico (ACDATEE), um dos principais movimentos que lutou pela libertação da jovem, comemorou a decisão.
“Celebramos que Kenia seja libertada depois de passar nove anos na prisão. Continuaremos a lutar incansavelmente e coletivamente para libertar as mulheres que ainda estão injustamente detidas”, disse Morena Herrera, diretora da organização.
Segundo a ACDATEE, Kenia era uma das 17 mulheres salvadorenhas presas por complicações e emergências na gravidez que desencadearam um aborto. A Justiça do país centro-americano, que tem uma das legislações mais rígidas sobre os direitos das mulheres, classifica o aborto como ilegal em diversos casos, seja por conta de um estupro, má-formação fetal ou gravidez de risco.
Kenia tinha 17 anos e estava no início da faculdade quando foi vítima de violência sexual. Aos 18, enfrentou uma emergência obstétrica sozinha em um celeiro ao lado da casa que dividia com o pai, que a encontrou sangrando e em estado grave.
Quando a emergência chegou, em vez de ser socorrida, a adolescente foi denunciada, presa e condenada por homicídio qualificado a 30 anos de prisão.
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De acordo com a ACDATEE, de 2000 a 2011, mais de 100 mulheres foram sentenciadas por crimes de aborto em El Salvador
Antes de Kenia, outras três mulheres salvadorenhas conseguiram liberdade. Karen, Kathy e Evelyn tinham acusações similares de homicídio após sofrerem emergências obstétricas e abortos.
De acordo com a ACDATEE, de 2000 a 2011, mais de 100 mulheres foram sentenciadas por crimes de aborto em El Salvador. Em luta pela liberdade de outras mulheres presas pelos mesmos motivos, a organização criou a campanha “Nos Faltan Las 17” (Nos Faltam as 17, em tradução livre), em referência ao número de salvadorenhas que seguem detidas.
O movimento também tem como objetivo conscientizar o tratamento e punições injustas que as mulheres salvadorenhas recebem devido à complicações obstétricas.
Apesar da luta dos movimentos feministas e por direitos humanos no país, a gestão do presidente de El Salvador, Nayib Bukele, dificulta a descriminalização da interrupção da gravidez.
Em 2021, o mandatário retirou artigos de uma nova proposta de reforma constitucional que visava a legalização do aborto e outras questões, como o casamento igualitário e a eutanásia.