Cerca de 500 manifestantes se reuniram na região central de São Paulo, na manhã deste sábado (17/02), em mais um protesto contra o avanço bélico de Israel no território palestino.
A ação faz parte de um chamado global pelo cessar-fogo imediato no conflito e aconteceu simultaneamente em mais de 50 localidades espalhadas pelo mundo, segundo informações dos organizadores.
Em São Paulo, o ato foi convocado pela Frente em Defesa do Povo Palestino, em aliança com mais de 30 organizações da sociedade civil, tais como a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a União Nacional dos Estudantes (UNE), o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), além de coletivos e partidos políticos ligados à esquerda.
O tom foi de denúncia e indignação. Diversos cartazes mostravam números de mortos e imagens de pessoas mutiladas. Um dos manifestantes trazia um boneco que simulava um bebê ferido.
As crianças compõem quase metade da população palestina. Segundo autoridades de saúde do país, mais de 11 mil menores de 18 anos já foram mortos durante os quatro meses da ofensiva militar israelense à Faixa de Gaza. Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) apontam que uma criança é vitimada de maneira fatal na região a cada 10 minutos.
Enquanto lideranças das entidades presentes se revezavam para falar ao microfone, o público ecoava a palavra de ordem “Estado de Israel, Estado assassino, e viva a luta do povo palestino”.
Jamil Murad, integrante do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz, dissse em seu discorso que a “guerra é contra o povo palestino, e não contra o Hamas. As crianças que estão sendo mortas são palestinas, não são do Hamas – e estão sendo assassinadas aos milhares e milhares”.
“Precisamos tomar uma atitude, colocar prioridade nessa luta em defesa do povo palestino. Participamos dessas atividades porque precisamos defender uma civilização humanista, uma civilização de paz para todos e que não está sob o domínio de um pequeno grupo que impõe a exploração através da violência”, acrescentou.
Desta vez, o ato não contou com a presença de parlamentares, e também não foram vistas bandeiras de partidos políticos. O ex-presidente do Partido dos Trabalhadores (PT) e ex-deputado federal José Genoino foi um dos que esteve presente.
A manifestação na capital paulista acontece em um momento de aprofundamento do conflito entre Israel e Palestina, em que não se vê uma saída diplomática no horizonte, apesar da ameaça permanente ou do efetivo transbordamento da guerra, em alguns casos, para outros países da região.
Daniela Fajer, do coletivo Vozes Judaicas pela Libertação – grupo de judeus refratários à investida de Israel contra a Palestina –, explicou que o ato foi convocado “em um contexto cada vez mais grave. Vemos os ataques em Rafah e o isolamento do povo palestino, com mais de 80% da população deslocada, sem ter por onde retornar, passando fome e sede. É uma verdadeira crise humanitária”.
Quase um milhão e meio de palestinos encontram-se em Rafah, localidade que tem sofrido ameaças de uma invasão terrestre sem precedentes por parte de Israel. Tal situação tem feito crescer as tensões entre o país governado por Benjamin Netanyahu e o governo egípcio.
Patrícia de Matos
Manifestantes levaram bonecos, cartazes e trouxeram em suas falas denúncias ao que definiram como genocídio ao povo palestino
Enquanto isso, organizações têm se mobilizado para conter os danos ao povo palestino, como é o caso da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Oriente Médio (UNRWA). Ativistas denunciam, no entanto, que doações não têm chegado até a entidade. O presidente Lula afirmou na última quinta-feira (15/02), durante viagem ao continente africano, que irá realizar uma nova doação à UNRWA.
Ao Opera Mundi, Fajer disse que seu grupo apoia o posicionamento do Brasil, que classificou o que ocorre na guerra entre os dois países como um verdadeiro genocídio contra os palestinos, e vê com bons olhos o anúncio de envio de ajuda do Brasil à UNRWA. “Entendemos que essa é a ação principal que tem que ser feita porque essa organização tem sofrido com a falta de aporte em todo o mundo. Não faz sentido parar os aportes agora”, argumenta Daniela.
O grupo formado por judeus, do qual Daniela Fajer faz parte, surgiu com a deflagração do conflito, em outubro de 2023. Soraya Misleh, integrante da Frente em Defesa ao Povo Palestino, conta que desde que a guerra começou “há uma ampliação das organizações que têm se mobilizado em solidariedade à Palestina, o que inclui muitos judeus”.
Em sua fala aos presente, Soraya reforçou que esses grupos se uniram “aos chamados globais para denunciar essa Nakba [a palavra significa ‘catástrofe’ em árabe, e faz alusão ao êxodo palestino de 1948] e o Estado racista de Israel”.
“[A guerra] não começou agora, e nós temos um genocídio em curso. Exigimos o fim do apartheid e da limpeza étnica. O governo brasileiro admitiu que há um genocídio, mas agora precisa ir além e romper relações com o Estado de Israel”, argumentou a ativista.
Além do pedido de cessar-fogo imediato, os manifestantes defendem o enfraquecimento econômico de Israel por meio do movimento de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS), lançado em 2005. O objetivo é reduzir o que ativistas definem como uma profunda desigualdade entre os dois países, para interromper a ocupação de Israel no território palestino.
Os coletivos e entidades envolvidos na realização da manifestação deste sábado estão preparando “o mês do apartheid” para março, com uma agenda voltada à intensificação da campanha em torno do BDS, além da execução de formação sobre o tema da guerra entre Israel e Palestina.
Aprofundamento das tensões
Após o início do cerco à Faixa de Gaza, que inclui escassez de alimentos e bombardeios a hospitais, quase a totalidade dos palestinos que viviam no enclave foram forçados a fugir em direção ao sul.
Atualmente, cerca de 1,4 milhões estão abrigados em Rafah, região agora sob tensão com a iminente invasão de Israel – o que ameaça a estabilidade diplomática entre o Egito e o país governado por Benjamin Netanyahu, mantida desde 1979 através de um tratado de paz.
Na última quinta-feira (15/02), o presidente Lula reforçou críticas que vem fazendo ao que define como a incapacidade dos órgãos de governança global, sobretudo a ONU, na mediação de conflitos. O petista afirmou que a instituição “não tem forças suficientes” e que “Israel tem a primazia de descumprir, ou melhor, de não cumprir nenhuma decisão emanada pelas Nações Unidas”.
O presidente ainda disse que o Brasil condenou veementemente a posição do Hamas no ataque a Israel e o sequestro de centenas de pessoas, e que precisa haver um cessar-fogo imediato entre as duas forças.