Em 2 de dezembro de 1804 – ou 11 Frimário, ano 13, segundo o calendário revolucionário – Napoleão Bonaparte é coroado imperador dos franceses na catedral de Notre-Dame de Paris, na presdença do papa Pio VII.
Nativo da Córsega e simples general da Revolução Francesa, com apenas 35 anos, buscou reconstituir em seu favor o império de Carlos Magno. Entre os franceses que temiam a restauração do antigo regime figuravam os ex-deputados da Convenção que haviam condenado à morte o rei Luis XVI e todos aqueles que tinham se apoderado de bens nacionais ou enriquecido durante a Revolução. A coroação lhes daria um respiro de dez anos antes do retorno da monarquia.
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Gênio da propaganda e do espetáculo, o novo imperador não se contentaria com uma simples ratificação de seu título pelo povo. Queria uma unção religiosa para se alinhar acima de outros imperadores do momento, o czar da Rússia e o chefe do Sacro Império Romano Germânico que reinava em Viena, assim como se demarcar do pretendente dos Bourbons, Luis XVIII.
Para o local da cerimônia, sonhava com Aix-la-Chapelle, antiga capital de Carlos Magno, porém acaba se fixando em Paris. Leva em conta o Champ-de-Mars, ainda palpitando de lembranças da Revolução ou a igreja de Saint-Louis-des-Invalides, pequena demais, mas acaba escolhendo a venerável catedral de Notre-Dame de Paris. O imperador queria fazer dela o símbolo da reconciliação da Nação com sua História.
A cerimônia de coroação é organizada pelo pintor Jacques-Louis David, adepto do neo-classicismo e do retorno ao estilo antigo. Deputado da Convenção e amigo de Maximilien Robespierre, votara a favor da morte de Luis XVI. Ligado depois a Bonaparte, tornou-se o pintor oficial do Império.
Auxiliado pelo pintor Jean-Baptiste Isabey, David concebe vestimentas engalanadas para os convidados especiais e para os rudes soldados tornados marechais do Império ou ainda dignitários que deveriam assistir à coroação. O próprio imperador deveria cobrir-se com um manto de 22 metros, todo bordado de abelhas.
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A partir das 6 horas da manhã, começava a aglomeração na praça Dauphine à entrada da Notre-Dame para tomar seus lugares na nave. O papa chega à catedral, aclamado pela multidão.
Chega então a vez de Napoleão e Josefina que deixam o Palácio des Tuileries montados numa luxuosa carruagem, escoltada por seis regimentos de cavalaria.
A cerimônia transcorre um pouco desordenada e totalmente despida de espiritualidade e recolhimento. Ela se eterniza durante mais de três horas em meio ao forte frio de dezembro. Pio VII dá a bênção a Napoleão e Josefina, umedecendo de óleos santos sua fronte e suas duas mãos. Após breve sermão, abençoa os emblemas imperiais: anel, espada e manto. O papa não estava numa posição acima do imperador.
David – Reprodução
A Coroação de Napoleão, obra de Jacques-Louis David
De acordo com o combinado com o Sumo Pontífice, Napoleão se coroa a si mesmo, de pé, voltado para a assistência, segundo um rito carolíngeo, e depois coroa a imperatriz. O Santo Padre se retira contrariado para a sacristia e, na sua ausência, o novo imperador presta juramento sobre o Evangelho, jurando preservar todas as conquistas da Revolução: ‘‘Juro manter a integridade do território da República, de respeitar e fazer respeitar a igualdade de direitos, a liberdade política e ciivil (…) de governar pela exclusiva via do interesse, da felicidade e da glória do povo francês’’.
Enquanto o séquito, aliviado, deixa a catedral, saudado por 101 tiros de canhão, a fanfarra militar ataca uma melodia muito popular que em outras situações era cantada com letra bastante vulgar. Este imprevisto não deixava de ser uma caçoada ao caráter sacrílego da cerimônia, nem cristã nem republicana.
Daquela jornada histórica chegou aos nossos dias uma tela grandiosa, pelo menos por suas dimensões – 6 metros por 9 metros. Obra do pintor David. que recebeu do imperador a encomenda (na verdade uma ordem), de fixar para a eternidade a lembrança do acontecimento, tarefa que levou a cabo tomando grandes liberdades em relação à realidade até para fazer figurar no centro do quadro a mãe do imperador que preferiu permanecer na Itália em vez de assistir à coroação.
Ao ver essa obra imensa no ateliê do pintor, dois anos após a cerimônia, Napoleão exclamou: ‘‘Como é imensa ! Isto não é uma pintura: pode-se caminhar por este quadro’’. A tela está exposta, em lugar privilegiado, no Museu do Louvre.
Mais nessa data:
1823 – Lançada a Doutrina Monroe, de 'América para os americanos'
1917 – Rússia firma Tratado de Brest-Litovski com as Potências Centrais
1942 – Físico Enrico Fermi dá início à era nuclear
1993 – Operação militar termina com a morte do chefe do trático em Medellín, Pablo Escobar