Atualizada em 24/07/2017 às 11:33
No dia 31 de julho de 1968, um golpe de Estado perpetrado pelo general Ahmed Hassan al-Bakr pôs fim a uma década de agitação política no Iraque. Durante os 10 anos que se seguiram à derrubada da monarquia hachemita pelo general Kassem, o Iraque foi de golpe de Estado em golpe de Estado.
A desordem tinha como protagonistas os curdos ao norte e os xiitas ao sul, assim como as ambições ocidentais e soviéticas sobre os imensos recursos petrolíferos do país.
Wikicommons
Ahmad Hasan al-Bakr (à direita) e Alexej Kossygin (esquerda) assinam tratado de cooperação entre Iraque e URSS
Podia-se pensar que esta anarquia teria fim com a chegada ao poder do general Hassan al-Bakr e do partido Baath, um assim chamado partido socialista, modernista e laico.
O partido Baath – que em árabe significa renascença – havia sido fundado em 1942 em Damasco pelo cristão Michel Aflak e o muçulmano sunita Salahedine Bitar. O partido queria superar as clivagens religiosas e promover o “arabismo”. Para isso, lançou um programa anticolonialista, socialista, laico e pan-arábico, propondo-se nada menos que reunir todos os países árabes numa vasta federação moderna. Sua consigna era: “Unidade, Socialismo, Liberdade”.
O Baath seduziu a burguesia urbana do Iraque e da Síria, instalando-se no poder desses dois países nos anos 1960. Todavia, prontamente o sentimento pan-arábico se esgarça sob pressão das realidades.
Saddam Hussein
Desde o começo dos anos 1970, em Bagdá, o general Hassan al-Bakr transformou o Baath em partido único, organização calcada nos partidos comunistas, embora tenha eliminado os comunistas da vida pública. Apoia-se num jovem primo, Saddam Hussein, originário de Tikrit, cidade de Saladino, situada no Curdistão, 250 km. Ao norte da capital.
[Saddam Hussein durante a guerra do Iraque| Wikicommons]
O novo vice-presidente, Saddam Hussein, nascera em 28 de abril de 1937. Muito cedo órfão de pai, tornou-se vítima de seu padrasto e do bullying das outras crianças de seu bairro. Porém logo iria mostrar o que significava seu nome, Saddam – o briguento, em árabe. Sem formação superior, mostra-se um agitador nato. Em 1959, participa de uma tentativa de golpe de Estado contra o general Kassem. Ferido na perna consegue fugir para o estrangeiro. Regressa para conspirar em 1964 contra o general Aref. Preso, logra evadir-se.
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À sombra do general al-Bakr, Saddam reorganiza a toque de caixa os serviços de segurança. Índole cruel e fria, não hesita em ameaçar e massacrar os opositores do governo. Em 1969, catorze pretensos conspiradores sionistas são enforcados numa praça de Bagdá e seus corpos suspensos ficaram balançando dias a fio sob os olhares dos passantes.
Vale-se também de sua posição para eliminar, sem pestanejar, seus potenciais rivais, surgindo aos olhos de todos como o número 2 do governo.
Por outro lado, al-Bakr e Saddam nacionalizam os recursos petrolíferos em 1972. Seu exemplo é prontamente imitado pelos Emirados Árabes do golfo Pérsico e pela Arábia Saudita. De resto, os dirigentes do Baath modernizam audazmente o país e lançam a primeira campanha de alfabetização maciça no mundo árabe.
As democracias ocidentais não se manifestaram porque viam no governo iraquiano, laico e modernizador, uma chance para o mundo árabe.
Em 16 de julho de 1979, al-Bakr cai doente, se retira, e Saddam se arroga a totalidade do poder. Torna-se oficialmente o presidente da república iraquiana.
Novo governo
Dois dias apenas após sua subida ao poder, reúne numa sala de conferências todos os membros do Conselho da Revolução e do partido, ou seja, centenas de pessoas.
Com uma encenação espetacular, deplora com tristeza um pretenso complô inspirado pelos comunistas e pelos sírios. O secretário-geral do Conselho da Revolução, que havia sido torturado, surge à cena, reconhece a existência do complô e denuncia um a um os presuntos traidores. Estes últimos, 60 no total, são retirados da sala pelos guardas para serem executados.
Os iraquianos passaram a saber que doravante não poderiam desobedecer ao novo chefe. Sustentado pela minoria sunita, Saddam desprezava os curdos que aspiravam independência ou autonomia, bem como menosprezava a maioria xiita, próxima do Irã vizinho. Em contrapartida tolerava as antigas comunidades cristãs que não tinham qualquer projeto político.
Apaixonado pela história árabe, Saddam Hussein era guiado pelo desejo exacerbado de se inscrever na longa linhagem de chefes míticos da história iraquiana, de Nabucodonosor a Saladino.
A vitoriosa revolução islâmica no Irã suscitou forte preocupação entre as potências ocidentais assim como entre os soviéticos. Em 1980, ninguém protestou quando Saddam atacou o Irã, levando a guerra ao seu turbulento vizinho. Era o começo de um colossal mal entendido entre o ditador iraquiano e o Ocidente, em especial, os Estados Unidos.
Todos acreditavam poder doravante contar entre si.