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Política e Economia

"Le Petit Haiti": cidade chilena concentra recente onda de imigração haitiana

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Histórias de tráfico de imigrantes são comuns em Quilicura, lar da maior comunidade de haitianos no país

Victor Farinelli

2013-03-02T12:16:00.000Z

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Victor Farinelli/Opera Mundi

Ally Lydiems mora desde 2007 em Quilicura, onde trabalhou como pintor e soldador antes de abrir seu próprio negócio 

Menos de 20 há dez anos, os haitianos atualmente já são quase quatro mil em todo o Chile. A maioria vem da República Dominicana, entusiasmados pelas promessas de emprego e prosperidade, mas que logo são abandonados à própria sorte em um país de clima frio e com pouca receptividade aos novos moradores.

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Entre 2009 e 2011, entraram 2,6 mil novos haitianos no país sul-americano, contra pouco mais de 700 saídas. Somente em 2011, foram 1.056 os que conseguiram ficar em terras andinas, entre os 1.369 que chegaram.

Há muitas razões para o fenômeno, mas um dos principais é a atuação de quadrilhas de tráficos de imigrantes. Embora muitos haitianos que vivem na América do Sul tenham passado antes por países como Peru, Argentina e Brasil, o grosso do fluxo para o Chile veio diretamente da República Dominicana. De lá operam pelo menos duas quadrilhas que os levam diretamente a Santiago.

Segundo a PDI (Polícia de Investigações, equivalente à Polícia Civil brasileira), nos últimos cinco anos foram realizadas sete detenções relacionadas às quadrilhas de tráfico de haitianos. Cristíán Lucero, assessor de comunicações da PDI, afirma que os envolvidos fazem parte de dois bandos diferentes. “Pelo menos uma delas operou também em outros países, como o Brasil. Em colaboração com a Polícia Federal brasileira e de outros países, além da própria polícia da República Dominicana, estamos desmontando essa conexão”, explica Lucero.

De forma legal ou não, fato é que os haitianos já deixaram de ser uma novidade no Chile. De acordo com o Serviço Nacional de Imigração, a onda de imigração haitiana já é comparada à de colombianos e equatorianos – numerosas.

Le Petit Haiti

O ponto de aglutinação desses caribenhos é a zona central do país, em especial Quilicura, município na zona noroeste da Grande Santiago. Lar do maior parque industrial do país, a cidade conta com quase três mil haitianos legalizados, segundo dados da Embaixada do Haiti no Chile.

Quilicura fica próxima do aeroporto internacional de Pudahuel, o maior do país, mas é desconhecida para a maioria dos estrangeiros. O PDI se questionou sobre a preferência, pois muitos deles chegavam dizendo vir por motivos turísticos. Diferente dos haitianos de bairros do centro de Santiago, que chegam ao Chile por redes de tráfico, os de Quilicura também são estimulados por parentes ou amigos.

Os pioneiros dessa comunidade lembram dos tempos difíceis. Ally Lydiems, morador da cidade desde 2007, trabalhou por quatro anos como soldador e pintor, e inspirado pela chegada de novos conterrâneos, abriu o próprio negócio. Seu salão de beleza era exclusividade da comunidade, mas hoje atende também chilenos e outros imigrantes, todos interessados em penteados afro. “Sabia que teria um público cativo”, conta ele, comentando que a exemplo dele outros estabelecimentos haitianos foram sendo inaugurados.

A imigração haitiana transformou a cidade e introduziu a presença dos negros nas ruas, algo incomum no Chile. A relação, apesar de não ser conflituosa, é distante. Em comparação com outros imigrantes, como peruanos e colombianos, os haitianos relatam dificuldade de integração dos chilenos, descrevendo uma “barreira social”.

Comércio haitiano

Antes do crescimento do fluxo imigratório, os haitianos do Chile frequentavam principalmente estabelecimentos de peruanos, sobretudo centros telefônicos, devido ao preço baixo. Hoje esse cenário começa a mudar.

Victor Farinelli/Opera Mundi

Entre 2009 e 2011, 2,6 mil novos haitianos entraram no Chile; somente em 2011, mais de mil conseguiram se instalar no país

O ex-professor de literatura francesa Youry Fillien, de 35 anos, abriu o restaurante La Belle Etoile, especializado em comida típica haitiana. Ele também vem incentivando outras iniciativas para reunir compatriotas, entre as quais a criação, em 2009, da AESCFCH (Associação Educativa e Sociocultural Flambeau de Chile). Trata-se de uma entidade que auxilia recém-chegados, com dicas de moradia e emprego, além de servir de referência para o fomento da cultura haitiana na cidade.

Fillien desembarcou em 2007 e explica a preferência por Quilicura. “Santiago em si é uma cidade difícil para os imigrantes, não só para os haitianos. Em Quilicura o custo de vida não é tão alto e não existe a hostilidade que se sente no centro”, diz.

“A mais organizada do mundo”

A desconfiança dos haitianos no Chile com a embaixada do país-natal é frequente, não sendo raro encontrar aqueles que dizem não ter nenhum contato - sobretudo porque, segundo os que conhecem a realidade dos imigrantes em diferentes países, nenhuma missão consular do país entrega ajuda efetiva.

A Embaixada do Haiti em Santiago está localizada em Las Condes, um dos bairros nobres da capital, a quilômetros de distância de onde vive a maioria dos compatriotas. Até 2009, os atendentes sequer sabiam falar francês. Porém, a mudança se deu com a chegada do novo embaixador Jean-Victor Harvel, que além de aperfeiçoar os serviços consulares, também começou a atuar junto às comunidades.

“Os haitianos que chegam ao Chile não sabem o que encontrar, mas os que já estão aqui são muitos, e estão capacitados para ajudá-los”, afirma Harvel, que impulsionou a criação de diversos centros comunitários em Santiago e em Quilicura. Seu objetivo é ambicioso: “quero que a do Chile seja a comunidade haitiana melhor organizada do mundo”.

O diplomata trabalhou na Embaixada do Haiti em Brasília entre 1996 e 2001. Desde então passou por missões em outros países da região, e diz que desde meados da década passada, os haitianos começaram a olhar para esta região com outros olhos.

“Talvez tenha sido o contato com os militares chilenos e brasileiros que os fez pensar nesses países como alternativas a destinos como França e Canadá, embora esses continuem sendo os mais buscados ”, comenta Harvel.

O diplomata prevê um futuro melhor para os imigrantes: “somos muitos. Os recém-chegados não estão sozinhos e estamos nos organizando melhor em um país que aos poucos vai perdendo aquela estranheza dos primeiros anos. Há motivo para esperança”.

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Análise

Patentes na OMC é uma derrota para os países do Sul Global

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Pandemia de covid-19 reativou a debate sobre a quebra de patentes para medicamentos e vacinas. Apesar de sua união em torno do tema, países subdesenvolvidos sofreram uma derrota

Alessandra Monterastelli

Outras Palavras Outras Palavras

2022-07-06T22:35:00.000Z

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No dia 17 de junho, saiu fumaça branca das chaminés da Organização Mundial do Comércio (OMC). A entidade, responsável pela regulação de patentes internacionais, anunciou que chegara a uma conclusão sobre as vacinas contra o coronavírus. Tratava-se do pedido de isenção do acordo TRIPS – sigla em inglês para Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Firmado na virada do século, tal compromisso obriga os países-membros da OMC a adotar padrões mais rigorosos de proteção patentária. Consequentemente, encarece o acesso às inovações tecnológicas, inclusive no setor farmacêutico. Mas a decisão final foi amplamente criticada por ativistas da saúde e movimentos populares em todo o mundo, já que a OMC rejeitou a isenção total do TRIPS. 

Em 2020, diante da disseminação do novo coronavírus, África do Sul e Índia protocolaram a proposta de isenção do Acordo, que obteve amplo apoio dos países em desenvolvimento e de baixa renda – com exceção do Brasil. A nova decisão foi saudada pelo Secretariado da OMC e por representantes de países ricos como um resultado sem precedentes, mas ativistas condenam que, na prática, a decisão não atende as necessidades mínimas da maior fatia do mundo. “Houve um esvaziamento da proposta pelos países mais ricos. O texto perdeu totalmente sua força, não trouxe nada novo”, explica Felipe Carvalho, Coordenador Regional da Campanha de Acesso do Médicos Sem Fronteiras ao Outra Saúde.

A conclusão do órgão concedeu uma exceção temporária à restrição das quantidades de vacinas que podem ser exportadas sob licença compulsória; diagnósticos e tratamentos não estão incluídos e devem obedecer ao limite de exportação durante o tempo de licença compulsória – decretada durante emergências sanitárias, como é o caso da pandemia. Além disso, a concessão vale apenas para responder à covid-19 e não tem validade diante de outras crises de saúde. O acordo final não inclui o compartilhamento de segredos comerciais e know-how de fabricação, o que prejudicará a produção de vacinas com tecnologia avançada por países de baixa renda – como é o caso dos imunizantes de RNA.

Carvalho conta que o problema é abordado com frequência em reuniões escpecais da OMS e da ONU.  “Existe um consenso entre especialistas e órgãos multilaterais de que as patentes causam constantes crises de acesso e inovação na saúde”. Em maio, o The Guardian divulgou que a Pfizer lucrou 25,7 bilhões de dólares só no início de 2022 – mais da metade do valor está relacionado à venda de vacinas contra a covid-19. Tim Bierley, ativista do Global Justice Now, denunciou ao jornal britânico que apesar do apelo da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de outras organizações, a farmacêutica seguia se recusando a compartilhar a tecnologia de produção do imunizante. O diretor da OMS, Tedros Adhanon, afirmou em 2021 que a pandemia estava sendo prolongada por uma “escandalosa desigualdade” diante do acúmulo de doses de imunizantes por países ricos enquanto países pobres não conseguiam avançar em sua meta de vacinação em massa. 

“Desde a criação do acordo TRIPs nós temos um cenário de constantes crises de acesso a medicamentos essenciais”, conta Felipe. Ele relembra o caso emblemático da epidemia de HIV/AIDS, na década de 1990. “Em 1996 surgiu a primeira terapia para a doença. As pessoas pararam de morrer e passaram a conviver com o vírus. Mas essa terapia não chegou nos países onde o cenário era mais grave”, explica. O ano de 1996 foi também quando o acordo TRIPS entrou em vigor, após sua criação em 1994 e preparação em 1995. “A partir daí se criou uma coalizão na sociedade civil, da qual fazemos parte, chamada Movimento de Luta pelo Acesso a Medicamentos. A pergunta era: por que os preços eram tão altos e o tratamento se tornava inacessível para milhões de pessoas? Nos aprofundamos no sistema de patentes e entendemos que o monopólio era a causa”, relembra.

Apesar do TRIPS possuir cláusulas que permitem flexibilizações, elas são de difícil utilização devido a dois fatores principais: sua não-incorporação completa em leis de países-membros e a pressão que as farmacêuticas exercem sobre as decisões da OMC. Na década de 1990, diante da grave situação vivida na África do Sul – país com maior número de mortes pela AIDS na época – o governo então liderado por Nelson Mandela aprovou uma das medidas previstas no TRIPS para importar genéricos. Na ocasião, Mandela sofreu o processo de 39 farmacêuticas que se opuseram à decisão tomada para conter a crise de saúde pública. Apesar da derrota das corporações na justiça, “esse é um exemplo de como essas empresas e seus países-sede tentam barrar as normas legítimas existentes no TRIPS”, exemplifica Carvalho.

A OMC é uma instituição formada por 164 membros e opera com base na tomada de decisões por consenso. “A OMC falhou em fornecer uma isenção. O acordo coloca os lucros à frente das vidas e mostra que o atual regime de propriedade intelectual falha em proteger a saúde e promover a transferência de tecnologia. Essa não-renúncia estabelece um mau precedente para futuras pandemias e continuará a colocar vidas em risco” declarou Lauren Paremoer, médica e integrante do Peoples’ Health Movement na África do Sul. 

A Health Action International, referência no trabalho para expandir o acesso a medicamentos essenciais, argumentou em nota que a decisão da OMC impõe obstáculos ao licenciamento compulsório, uma das poucas flexibilidades existentes no TRIPS, em troca de uma abertura tímida para a facilitação da exportação de vacinas. Outras entidades representantes da sociedade civil já denunciaram a atuação dos países ricos e vêm aumentando a pressão sobre os governos. O objetivo, segundo seus porta-vozes, é que sejam tomadas medidas concretas para desafiar as regras de monopólio farmacêutico da OMC e garantir mais acesso a medicamentos e tecnologias. 

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