Após meses de negociações, os 27 líderes da União Europeia (UE) preferiram um consenso de baixo perfil a fazer escolhas mais prestigiosas, e potencialmente polêmicas. Ontem (19), eles nomearam, por unanimidade, o belga Herman Van Rompuy, atual primeiro ministro do seu país, como primeiro presidente da organização, enquanto a britânica Catherine Ashton será a alta representante para política externa e segurança.
A decisão foi tomada após o primeiro-ministro Gordon Brown aceitar desistir da candidatura de Tony Blair ao cargo de presidente da UE. O ex-primeiro-ministro britânico era rejeitado por vários países, por conta de seu apoio à invasão do Iraque em 2003, em um movimento que rachou a Europa.
Van Rompuy, centro-direitista e atual premiê da Bélgica, é um homem praticamente desconhecido fora do seu país, sem nenhuma experiência internacional. O anuncio do nome pegou de surpresa todos os enviados especiais da imprensa européia em Bruxelas: “Herman quem?”, repetiam nos corredores do Breydel, o prédio do conselho europeio em Bruxelas.
Aos 62 anos, Van Rompuy tem fama de ser discreto, hábil negociador e especialista em conseguir consensos. Ele dirige a Bélgica há 11 meses, quando herdou de uma situação muito agitada, provocada pelas brigas entre os flamengos e os francófonos. Ele conseguiu obter a volta à normalidade do pequeno país europeio.
Em seu primeiro discurso diante da imprensa, Van Rompuy se comprometeu a “levar em conta os interesses e sensibilidades de todos”, e a tratar de garantir o consenso nas decisões dos 27 países da UE. “Uma negociação na qual uma parte termina derrotada nunca é uma boa negociação”, disse.
Facilitar o diálogo
O cargo que exercerá Rompuy foi criado pelo Tratado de Lisboa, o qual entrará em vigor em 1º de dezembro, mas, por enquanto, suas responsabilidades não estão bem definidas. Eleito por dois anos e meio – com possibilidade de renovar o mandato por mais uma gestão – o presidente terá como tarefa de dirigir as reuniões dos líderes, de facilitar o consenso, e de representar à União diante de líderes mundiais. Não será o “presidente da Europa”, porque a UE “não é um Estado e nem quer ser”, destacou José Manuel Durão Barroso, o presidente da Comissão Européia, o órgão executivo do bloco.
Com sua nomeação, estréia finalmente, após oito anos de negociações, tratados e referendos, a nova arquitetura institucional que pretende aumentar a influência da UE nos assuntos mundiais.
Foi também o jogo político entre os principais líderes da União que garantiu a cadeira de chanceler à baronesa britânica Catherine Ashton, 53, atual comissária da UE para comércio. Até então um nome fora da lista, ela derrotou o grande favorito, o ex-premiê da Itália Massimo d’Alema. Mesmo depois de sua designação ontem pelos governantes comunitários, ela ainda terá que obter a aprovação do Parlamento Europeu.
Equilíbrios
Muito próxima ao primeiro-ministro Gordon Brown, ela chegou a Bruxelas no final do ano passado, depois de Brown enviá-la para substituir Peter Mandelson, que voltou a Londres para ajudá-lo na perspectiva das eleições do próximo ano. Antes, Ashton ocupou vários cargos intermédios no Governo de Brown, nos ministérios de Educação, Direitos Humanos, Justiça e Igualdade, mas não tem experiência em questões de política internacional.
A nomeação de Ashton tem também como objetivo calar as críticas sobre a ausência de mulheres no executivo europeio. É também uma maneira de equilibrar entre a esquerda e a direita, já que a baronesa é membro do Partido Trabalhista britânico. A britânica substituirá neste 1° de dezembro o alto representante espanhol Javier Solana, mas terá poderes ampliados, já que será também vice-presidente da Comissão, e presidirá mensalmente o Conselho de Relações Exteriores – as reuniões dos ministros. Será responsável pela coordenação de toda a política externa da UE e do orçamento e do novo serviço diplomático comum europeu criado pelo Tratado de Lisboa.
Agora, todas as regiões européias são representadas: o Sul com Barroso, o Leste com o polonês Jerzy Buzek, presidente do Parlamento, os paises fundadores da União, com Van Rompuy, que tinha o apoio da Alemanha e da França, e a Europa do Norte com Catherine Ashton.
“Caricatura”
As escolhas foram muito criticadas, tanto pelo baixo perfil do belga e da britanica que por razoes politicas. O ex-primeiro-ministro socialista Michel Rocard achou a escolha de Van Rompuy “ruim”. Numa entrevista concedida hoje (20) a rádio francesa France Inter, ele afirmou que “a Europa política está morta”. Segundo ele, todos os países europeus, e especialmente o Reino Unido, querem “preservar seus territórios e impedir que a Europa se torne uma entidade realmente capaz de fazer política em seu lugar”.
Para ele, “o senhor Van Rompuy é provavelmente um homem charmoso, tudo o que dizem sobre ele é absolutamente delicioso, mas o Presidente da Europa deve ser alguém que conhecemos, e que vimos trabalhar por quinze ou vinte anos. Uma cara nova não vai dar conta do cargo”.
Rocard é ainda mais decepcionado pela escolha de Catherine Ashton para o novo e reforçado posto de Alta representante europeia para política externa e segurança. “A idéia de confiar a diplomacia da Europa à Inglaterra, ou seja, a um país que nega a idéia de uma diplomacia europeia, é simplesmente uma caricatura”, conclui.
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