O governo chileno lançou na última segunda-feira (25/01) o novo Plano de Políticas Sobre o Lítio e Governança dos Salares, que estabelece um novo marco regulatório para o metal no país. Entre os principais pontos da nova legislação está o fato de declarar o lítio como um recurso estratégico cujas jazidas não podem ser concessionadas e de definir um papel mais destacado da Codelco (mineradora estatal chilena) em sua exploração.
O plano foi apresentado em cerimônia protagonizada pela presidente chilena, Michelle Bachelet. Ela afirmou que o plano se baseou integralmente no documento final divulgado em janeiro de 2015 pela Comissão Nacional do Lítio, criada pela mandatária em 2014 para guiar a nova política.
Esta é a primeira vez que um governo chileno apresenta uma política específica sobre o lítio, embora o caráter estratégico que o novo plano confere ao metal não seja uma novidade – até mesmo a ditadura realizou decreto semelhante nos anos 1980, em um dos episódios que marcou as desavenças entre alguns militares nacionalistas que formavam parte da Junta Militar de Governo e a equipe de economistas neoliberais que apoiavam o ditador Augusto Pinochet.
Agência Efe
A presidente chilena, Michelle Bachelet, em cerimônia de lançamento do Plano de Políticas Sobre o Lítio e Governança dos Salares
O plano lançado por Bachelet deve incluir parâmetros específicos para a governança dos salares, já que a maior parte das reservas do país se localiza em desertos de sal nas regiões de Atacama e Antofagasta. Com isso, o país inicia um processo para criação de uma nova entidade estatal que será responsável pelas políticas a respeito da exploração econômica dos salares. A política com respeito aos salares deve ser o centro das atenções nos primeiros meses deste ano, já que a Codelco não possui 100% de propriedade dos salares chilenos, embora detenha a maior parte.
O lítio é um metal alcalino de elevado potencial eletroquímico, o que faz com que sua aplicação para a fabricação de baterias elétricas de longa duração esteja em crescimento. O Chile projeta um aumento da procura e do valor de mercado nos próximos anos, especialmente devido a esse tipo de uso. Também é utilizado na elaboração de medicamentos para o tratamento de transtornos psiquiátricos, como a depressão.
A tríplice fronteira entre o Chile, a Bolívia e a Argentina é conhecida como “triângulo do lítio”, por possuir em torno de 85% das reservas globais do metal. Entre esses três países, o Chile é o que tem a segunda maior reserva, menor apenas do que a da Bolívia.
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Codelco
A nova política chilena para o lítio pretende dar maior protagonismo à mineradora Codelco (Companhia do Cobre), estatal especializada na extração do cobre – responsável por 65% do produto interno bruto do país. O plano outorga à Codelco o papel de impulsor dos programas de fomento à produção que serão elaborados a partir deste ano.
O novo Plano de Políticas Sobre o Lítio e Governança de Salares estabelece um marco regulatório parecido ao que o governo brasileiro criou no Brasil a respeito do petróleo durante a gestão de Luiz Inácio Lula da Silva. Ele garante a presença da Codelco como protagonista na produção de produtos derivados do lítio no Chile e impede a concessão de jazidas, mas não a criação de projetos de exploração envolvendo empresas estrangeiras, desde que trabalhem em conjunto com a estatal chilena.
Ainda assim, essa participação ainda depende de um maior investimento estatal, que o governo pretende transformar num impulso à industrialização, ao menos segundo palavras da presidente Michelle Bachelet. Durante a cerimônia de lançamento do novo plano, a presidente chilena fez uma autocrítica em relação à situação econômica do país, devido aos problemas causados pela queda do preço do cobre.
“A conjuntura atual é a melhor prova de que não podemos depender de uma única matriz produtiva, ainda mais uma que é limitada, e muito menos nos acomodarmos à exportação de commodities. Temos experiências de acertos e erros em nossa história de oportunidades de desenvolvimento, e agora podemos fazer com que essa experiência se traduza num trabalho mais oportuno”, comentou a mandatária.
Nicolas de Camaret / Flickr CC
Salar de Atacama contém as reservas chilenas de lítio
A presidente chilena também anunciou a criação de um Comitê Nacional do Lítio, que contará com a participação da ministra de Mineração, Aurora Williams, o presidente da Codelco, Óscar Landerretche, e o ministro de Economia e diretor do Conselho Corfo (Corporação de Fomento da Produção), Luis Felipe Céspedes.
Escândalo recente
Embora o Chile seja um dos maiores produtores mundiais de lítio, apenas 12% das suas reservas são exploradas, e a maior parte dessa produção é realizada pela empresa SQM, uma antiga estatal privatizada durante a ditadura de Pinochet.
O vencedor do leilão da empresa, trinta anos atrás, foi o empresário Julio Ponce Lerou, que era então genro do ditador. Atualmente, a SQM é responsável por dois terços das 14 mil toneladas anuais de lítio produzidas pelo Chile.
Em 2012, o governo de Sebastián Piñera (2010-2014) lançou um plano de privatização de reservas de lítio que terminou em escândalo, já que a SQM, vencedora do primeiro leilão, foi denunciada por utilização de informação privilegiada. Meses depois, o economista Pablo Wagner, então subsecretário de Mineração de Piñera, foi acusado de ser lobista da empresa SQM. O caso levou à suspensão de todo o processo de privatização.