Dois dias depois do início da apuração das eleições parlamentares na
Colômbia, os resultados definitivos ainda parecem longe de ser
conhecidos. Com a contagem paralisada por problemas técnicos,
computados 93% dos votos, a coalizão uribista se confirma como
principal vencedora. Somados, os dois principais partidos governistas –
o Partido de la U e o Conservador – passaram de 38 para 50 cadeiras no
Senado.
Mas a situação desses dois partidos é peculiar. Há quatro anos, o
Partido de la U elegeu 20 senadores e o Partido Conservador, 18. No
entanto, ao longo do mandato, as agremiações chegaram a contar com 31 e
23, respectivamente, graças a senadores de outros partidos que se
uniram aos uribistas no debate sobre o referendo da reeleição, depois
de uma reforma que permitiu essas transferências. O paradoxo é que,
apesar da vitória aparentemente esmagadora, o uribismo na verdade perde
12 cadeiras em relação ao pleito de quatro anos atrás, quando obteve
70, no auge do apoio ao governo.
Leia também:
Partidos de direita conquistam maioria no Congresso colombiano
Ex-ministro da Defesa de Uribe lança candidatura à presidência
Colômbia fecha fronteira com Venezuela e Equador para eleições
Promotoria colombiana recebe denúncia de fraude nas eleições legislativas
Por quanto tempo esses partidos continuarão sendo “uribistas”? A
história da Colômbia mostra que as lealdades de um setor do Congresso
são proporcionais ao poder burocrático e, por isso, enquanto não se
resolve quem será o presidente, é impossível garantir a solidez da
bancada.
Com relação à disputa interna no Partido Conservador entre Andrés
Felipe Arias e Noemí Sanín, o resultado só será conhecido no próximo
sábado e a diferença parece ser de poucas centenas de votos. A campanha
dos dois pré-candidatos foi tão inflamada, incluindo as polêmicas do
dia das eleições, que muitos analistas chegam a falar em uma possível
divisão do partido. De um lado, ficaria o ex-ministro da Agricultura,
inclinado a uma aliança com Juan Manuel Santos, candidato do Partido de
la U; do outro, ficaria Sanín, cujas alianças ainda não estão definidas.
Há um terceiro partido uribista, o PIN, que alcançou um resultado
surpreendente, com cerca de 8,15% dos votos. O PIN, que não existia em
2006, é a soma de três partidos aniquilados pelo escândalo da
“parapolítica” – Colômbia Viva, Colômbia Democrática e Convergência
Cidadã. As três agremiações contavam com 12 cadeiras e o PIN deverá
obter 8, tornando-se a quarta força política do país.
Esses três partidos, com 67 candidatos sob investigação, processo ou já
condenados por envolvimento com a “parapolítica”, eram a expressão do
crime organizado – e as coisas não mudaram. Será interessante conferir
se os candidatos presidenciais uribistas acolherão o questionado PIN em
suas fileiras.
Um estudo do analista Pedro Medellín, do think tank Centro Toledo,
apontou entre 25 e 40 eleitos que têm problemas judiciais ou são
parentes de políticos detidos por envolvimento com paramilitares ou
traficantes, dos quais herdaram os votos e, presumivelmente, os
vínculos. Isto sem contar os males endêmicos da compra e venda de votos
em alguns dos setores mais pobres da sociedade. Em certas regiões do
país, os votos são vendidos a 10 mil pesos (seis dólares). Uma
reportagem da emissora colombiana Caracol documentou como expoentes
conservadores de Cartagena compravam pacotes inteiros de votos.
Vale do Cauca
Um dos departamentos onde o PIN obteve mais votos é o Vale do Cauca. A
escritora e jornalista Aura Lucia Mera, nascida na região, comentou:
“No Vale do Cauca, a política deixou há vários anos de ser um exercício
intelectual para se tornar um negócio financiado por fontes de
procedência duvidosa, quando não dos próprios recursos do Estado,
departamento ou município. Parece que este departamento, ao qual
pertenço por origem e afeto, já estava condenado a jamais se livrar da
cultura do dinheiro fácil do narcotráfico e outras atividades ilícitas.
Dói ver o PIN surgir como um monstro de mil cabeças, um aborto gestado
e provocado nas próprias entranhas do uribismo. Ver a incompetência do
registro civil, da procuradoria e de outros órgãos, que passa
despercebida sem que ninguém reaja”.
Entre os personagens que usaram sua influência para conquistar espaço
no Senado, estão a polêmica empresária Enilce López, ligada aos
paramilitares, que elegeu dois senadores (seu filho Héctor Julio
Alfonso López e Antonio José Correa); o ex-governador de Santander e
coronel da reserva Hugo Aguilar Naranjo, também ligado aos
paramilitares, elegou seu filho Mauricio; e Álvaro García, condenado em
fevereiro a 40 anos de prisão pelo massacre de Macayepo, deixou votos
para a irmã Teresita.
Oposição
Na frente antiuribista, as coisas não vão muito bem. O Polo Democrático
passou de 11 cadeiras para 8. Segundo o senador Jorge Enrique Robledo,
a queda foi culpa dos “ataques presidenciais, que se concentraram em
estigmatizar o Polo por supostas doações do exterior em vez de condenar
a corrupção, a ‘parapolítica’ e as outras aberrações que vimos na
legislatura passada”.
O Polo também paga o preço de uma divisão interna entre a facção do
prefeito de Bogotá, Samuel Moreno, e a do candidato à presidência
Gustavo Petro, que surge como ganhadora no pleito parlamentar – o que
sugere uma postura mais coesa do partido nas próximas eleições, em 30
de maio. É interessante notar que Ivan Cepeda Castro, porta-voz do
Movimento de Vítimas de Crimes de Estado, conquistou uma
cadeira na Câmara pelo partido.
Os liberais do candidato presidencial Rafael Pardo mantiveram a marca
de 18 cadeiras no Senado, como há quatro anos – uma pequena vitória
para um partido da oposição que poderia ter mergulhado no abismo graças
à falta de personalidade de seu principal nome. Os liberais estão fora
do poder e da partilha burocrática há 12 anos e começam a pagar por
isso perdendo apoio nas zonas rurais, seus redutos históricos.
Três prefeitos
Enfim, quanto aos independentes, houve grande interesse pelo Partido
Verde, dos últimos três prefeitos de Bogotá. A consulta interna para
escolher o candidato à presidência atraiu um milhão e meio de votos,
quantidade enorme para um partido jovem com uma máquina política quase
inexistente. O candidato presidencial será Antanas Mockus, que poderá
contar com quatro ou cinco senadores. Os verdes se tornaram uma
alternativa real para a presidência. O maior obstáculo foi derrubado: a
impressão de que votar neles seria desperdiçar o voto. Mockus torna-se
atraente para os uribistas legalistas, a esquerda e os independentes
com uma campanha saudável, coerente, humilde, comedida e prudente.
A campanha dos “três tenores” do Partido Verde foi renovadora, a
começar pela união de líderes de tradições, ideologias e grupos
diferentes que conseguiram destacar suas afinidades, e não suas
divergências. Cada um deixou a Bogotá um legado diferente, mas
complementar, o que vendeu a imagem de uma grande equipe. Eles trocaram
elogios nos debates, percorreram o país juntos e apareceram lado a lado
na publicidade. Segundo o jornalista Rodrigo Pardo, ex-diretor da
revista Cambio, “os verdes se transformaram no fenômeno de opinião mais
importante do país e em uma alternativa presidencial real”.
Já o candidato independente Sergio Fajardo ficou sem representantes de
seu partido no Congresso, o que dificultará sua candidatura, que
contava até agora com um bom apoio popular. Ele provavelmente está
arrependido de ter deixado o Partido Verde.
Siga o Opera Mundi no Twitter
NULL
NULL
NULL