Uma manifestação em apoio aos protestos no Brasil ocorrida em Paris neste sábado (22/06) foi marcada por confusões e divergências de opinião entre os participantes. O evento foi cancelado na última hora pelos organizadores, mas não impediu que cerca de 600 a 900 pessoas se reunissem na Place de la Nation, tradicional palco de mobilizações da capital francesa.
Na manhã de sábado, os organizadores enviaram um comunicado aos participantes informando terem cancelado o protesto em razão “ da mudança de cenário político, já que a principal reivindicação – a revogação do aumento da tarifa de transporte – foi conquistada”. Por essa razão, eles decidiram anular o pedido de autorização concedido pela prefeitura parisiense, gerando revolta em algumas pessoas, que afirmaram terem se sentido “traídas”.
Amanda Lourenço/Opera Mundi
Cerca de 600 a 900 brasileiros se reuniram na Place de la Nation, em Paris
Virgínia Ferreira, uma das organizadoras, explicou à reportagem de Opera Mundi que o cancelamento foi um ato político com o objetivo de “chamar atenção”: “Nosso objetivo era fazer um contraponto. Uma manifestação política que não incomoda ninguém é apenas um passeio. Nós criamos um incômodo que as manifestações internacionais não estavam criando”.
Outra razão apontada foi a insatisfação com os rumos dos protestos nas cidades brasileiras. Os organizadores acusaram a “grande imprensa” e a direita brasileira de “sequestro das pautas progressistas levantadas inicialmente pelos movimentos populares” e destacaram a violência e hostilização contra os manifestantes de esquerda.
Divergências
Ferreira garante que sabia que a manifestação aconteceria de qualquer forma, tanto por causa do curto tempo de aviso sobre o cancelamento, quanto pela euforia demonstrada pelas mais de sete mil pessoas que confirmaram o evento pelo Facebook. “Por isso fomos até lá de qualquer jeito, para explicar nosso ponto de vista e evitar que pessoas fossem presas”, disse a organizadora.
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Para se organizar um protesto em Paris é necessária uma permissão da prefeitura, que demora cerca de três dias. Com o cancelamento, os manifestantes não tinham nenhum direito legal e o temor era de que polícia francesa pudesse dispersar os manifestantes com agressividade.
Maurício Fontanetti Aguiar, cientista político que não fazia parte do grupo organizador, comprou a briga para o protesto acontecer e acabou negociando com a polícia: “Disse a eles que as pessoas não sabiam da anulação e apareceriam de qualquer forma, então como teria uma concentração anormal na Place de la Nation, a polícia abriu uma exceção”.
Débora, uma das manifestantes que está há 14 anos na França, disse que é importante mostrar solidariedade às iniciativas no Brasil e dispensou qualquer rótulo: “Somos brasileiros acima de tudo. Protestar contra o governo não significa ser de direita, significa apenas que a esquerda está pisando na bola neste momento”.
Amanda Lourenço/Opera Mundi
Cartazes em apoio aos protestos no Brasil colorem a estátua “O Triunfo da República”, de Aimé-Jules Dalou
Leandro Siqueira, que não sabia que a manifestação havia sido cancelada, concorda: “Esse é um momento de revolução. Temos que mostrar apoio. Moro na Europa há 12 anos e mês que vem volto para o Brasil. Esse protesto tem um significado especial pra mim”.
As demandas do protesto não estavam claras e havia espaço para muitas reinvindicações. No entanto, grupos políticos não foram hostilizados como aconteceu em protestos no Brasil e era possível ver pessoas ostentando símbolos políticos, como um rapaz com uma camisa do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).
Repercussão
A imprensa francesa deu pouco espaço ao protesto. A exceção foi o jornal Le Monde, que publicou um artigo intitulado “Confusão e mobilização no encontro dos expatriados brasileiros em Paris”, descrevendo-o como um ato de “reivindicações variadas”, que incluia corrupção, sistema de saúde e o alto custo da Copa do Mundo, evidenciando que, mesmo do outro lado do Atlântico, o foco dos protestos não parecia tão claro.