Em meio a protestos da comunidade acadêmica da UMSA (Universidade Mayor de San Andrés) e a repressão a um levante popular no norte do departamento de La Paz, que deixou um morto, chamou atenção a greve geral indefinida convocada pela COB (Central Obreira Boliviana) na última quinta-feira (6/5) para hoje (10/5). Em La Paz, moradores de Caranavi bloqueavam estradas há mais de uma semana
para reivindicar a instalação de uma planta industrial processadora de
cítricos.
Essa é a primeira greve geral convocada em pouco mais de quatro anos de governo Evo Morales. Em contraposição ao aumento de 5% do salário mínimo anunciado pelo governo, os sindicalistas reivindicam 12%, bandeira levantada pela COB nos atos realizados no 1º de maio e na paralisação feita na última terça-feira (4/5).
Javier Mamani/Efe (09/05/2010)
Em Caranavi, protestos após a polícia reabrir a estrada que liga La Paz com a Amazônia boliviana,
fechada há três semanas
“Estamos pedindo os mesmos 12% dados no ano passado. Disso não deveria baixar, mas sim subir de maneira escalonada. Mas, temos que pedir algo real, por isso os 12%. Por outro lado, estamos rechaçando a Lei de Pensões e o Código Geral de Trabalho”, explicou Pedro Calderón, secretário da Federação Regional dos Trabalhadores de Fábricas da cidade de El Alto. Os fabris, considerados a ala mais radical da COB, também sustentam uma greve de fome há 15 dias.
Uma marcha que percorrerá durante toda esta semana cerca de 140 quilômetros de Caracollo, tradicional cidade mineira no departamento de Oruru, até a capital La Paz é o marco inicial da greve.
Leia também:
Central sindical convoca greve geral na Bolívia
Opinião: Greve geral e crise no governo boliviano
Longe de casa, mães bolivianas recebem amparo em hospital de São Paulo
Através do vice-presidente e então presidente em exercício, Álvaro Garcia Linera, o governo taxou a mobilização de contra-revolucionária e insinuou que há participação dos Estados Unidos.
“Pelo contrário, queremos aprofundar esse processo de mudanças. Não é para tirar o governo, mas para colaborar com ele e corrigi-lo para que seja um verdadeiro processo de mudanças em favor dos pobres desse país”, disse Calderón.
Com a chegada de Evo Morales, que estava em Nova York para um reunião com Ban Ki-moon, na ONU, as negociações se iniciaram no fim de semana.
“Estamos dispostos a chegar a acordos com a COB sobre a Lei de Pensões, reduzindo a idade de aposentadoria de 65 para 60 anos e com um aporte tripartite: uma parte do Estado, outra do setor patronal e outra dos trabalhadores, incluindo uma renda solidária que incrementa o montante mínimo de aposentadoria. A renda solidária virá de um fundo constituído pela taxação de altas riquezas, do Fundo de Riscos Profissionais não usados no passado e do aporte patronal, que descoloniza a Lei de Pensões anterior. Porém, não negociamos os 5%”, declarou o ministro de Economia e Finanças, Luis Arce.
De acordo com o ministro, essas mudanças permitirão um crescimento de mais de 36% na renda mínima dos aposentados.
Organizações de peso que integram a COB, como a CSUTCB (Confederação Sindical Única de Trabalhadores Camponeses da Bolívia), a CNMCIOB-BS (Confederação Nacional de Mulheres Camponesas Indígenas Originárias da Bolívia “Bartolina Sisa”) e as seis federações de cocaleiros do trópico de Cochabamba anunciaram que não vão aderir à greve. A COD (Central Obreira Departamental) de Santa Cruz anunciou que realizará uma marcha para defender o aumento de 5% anunciado pelo governo.
Ruptura
Para o analista político Hugo Moldiz, os protestos não representam uma ruptura com o “proceso de cambio” (processo de mudança), porque não questionam a liderança de Evo Morales, mas a forma como se está administrando nos níveis médios o aparato estatal. “Há um pedido de humildade ao governo, de geração de espaços de tomadas de decisão com participação dos setores sociais e de aplicação de uma política econômica que, apesar das nacionalizações, ainda mantém certos traços neoliberais, como medir a economia com parâmetros do FMI [Fundo Monetário Internacional].”
Moldiz aponta que desde o princípio do ano e especialmente nas eleições regionais de abril – que apresentaram algumas fissuras na base social de Morales – o governo cometeu alguns erros por ausência de direção política do partido governista MAS (Movimento ao Socialismo) e do gabinete de governo, sobretudo com a saída de Juan Ramón de Quintana do Ministério da Presidência.
“Isso faz com que o presidente esteja mais exposto, sendo possível que em 2013 tenhamos um questionamento da própria figura presidencial. A direita e os EUA trabalham para isso, mas com ajustes no aparato estatal, na direção do MAS e com a busca de uma relação com os sindicatos de trabalhadores que não seja de subordinação, o resultado, ainda que pareça contraditório, pode ser de fortalecimento”, concluiu.
Siga o Opera Mundi no Twitter
NULL
NULL
NULL