Após a divulgação do teor da proposta enviada pelo primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, aos credores da troika (Banco Europeu, Comissão Europeia e FMI) nesta quinta-feira (09/07), o premiê e seu partido, o Syriza, passaram a ser criticados por diversos setores. A tônica é: o “oxi” (não) vence, mas Atenas implementa proposta do “sim”. Para o professor de Relações Internacionais da UFABC (Universidade Federal do ABC) e ex-candidato a governador do Estado de São Paulo pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) Gilberto Maringoni “é uma precipitação e uma irresponsabilidade dizer que o Syriza capitulou” diante dos credores.
Em entrevista a Opera Mundi, o também jornalista e chargista ressaltou que a “desqualificação do Syriza por suposta capitulação é funcional à troika, pois infunde desconfiança no meio do combate”. Durante a conversa, Maringoni também avaliou o cenário político francês com base em sua participação, na última semana, do congresso do Parti de Gauche, ou Partido de Esquerda da França, realizado em Paris.
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Aposentados se informam sobre mudanças nas pensões contidas na proposta enviada à Comissão Europeia
Com relação ao referendo realizado no último domingo (05/07), no qual o “não” ao acordo que vinha sendo proposto pela Comissão Europeia venceu com mais de 60%, Maringoni diz que foi “duríssimo” o plebiscito. “Eles tiveram 35% dos votos nas eleições e foram para a decisão [do referendo] contra toda a pressão da Comissão Europeia. Venceram”. E acrescenta que “o plebiscito não era para suspender pagamentos ou coisa que o valha e sim para dar legitimidade interna às negociações”.
Assim, a votação não deu carta branca à Grécia, que segue isolada internacionalmente, diz. “Não houve nenhum movimento no tabuleiro externo [para apoiá-la]. Ao contrário, quem se movimentou e consolidou foi a Comissão Europeia.” Isso porque, segundo Maringoni, apesar de apoios pontuais – principalmente vindo dos sul-americanos – nenhum país grande se movimentou. “O governo Dilma [Rousseff] fez cara de paisagem. A Dilma poderia ter salvado a Grécia ao romper o isolamento”, avalia.
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Com bandeiras do “Nai” (sim), gregos se manifestaram ontem em apoio a um acordo e à permanência do país na zona do euro
Da mesma forma, “Rússia e China também não se moveram”. Então, a “situação da Grécia segue complicada. “[O referendo] foi uma vitória interna”, ressalta. Por outro lado, ele aponta que um dia após a consulta, a chanceler alemã, Angela Merkel, voou para Paris para fechar posição com o presidente francês, François Hollande. “Eles endureceram ainda mais o jogo e conseguiram tirar o [ex-ministro das Finanças] Yanis Varoufakis da negociação”.
A questão de fundo da decisão de Tsipras está relacionada à possibilidade de que a falta de acordo entre as partes resultasse na saída do país da zona do euro, o “grexit”.
Com relação ao tema, Maringoni aponta que setores da esquerda, o Partido Comunista Francês, inclusive, “apostam na saída do euro para resolver os problemas das crises econômicas de vários países”. Mas, isso, segundo ele, é “uma formulação ilusória”, uma vez que “sair do euro significa jogar os países da periferia — como a Grécia — na situação de párias internacionais. E de dividir internamente suas sociedades”.
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Euclidis Tsakalotos (esq.) substituiu Yanis Varoufakis (dir.) no cargo de ministro das Finanças da Grécia
Esquerda francesa
Fundado em 2008, o Parti de Gauche, ou Partido de Esquerda, foi o núcelo da Front de Gauche (articulação de 12 legendas, entre elas o Partido Comunista Francês) nas eleições presidenciais de 2012, obtendo 11% dos votos. “A França é o único país hoje em que se vê o crescimento da esquerda partidária. Isso não ocorre na Itália, nem na Inglaterra”, aponta Maringoni.
Ele pontua que o crescimento do Partido de Esquerda “não quer dizer que a França esteja indo para a esquerda. Ao contrário, nós vimos as manifestações islamofóbicas que ocorreram após o ataque à revista Charlie Hebdo”.
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Com relação à possibilidade de o Partido de Esquerda se tornar uma força competitiva nas eleições presidenciais de 2017, ele pontua que isso seria “algo inusitado”. “Ele cresce, mas não sabemos se conseguirá disputar as eleições porque a direita e a Frente Nacional [comandada pela ultranacionalista Marine Le Pen] são muito fortes, assim como a direita representada pelo [ex-presidente Nicolas] Sarkozy. Já [o Partido Socialista, do presidente] Hollande é essa esquerda que não sabe para que lado vai”.
Para Maringoni, o “Parti de Gauche está muito mais à esquerda do Podemos [partido antiausteridade espanhol], que não tem uma definição clara do que quer. O Podemos é um partido dos direitos, da vida melhor, do bem viver. Já o Partido de Esquerda está muito mais próximo do Syriza [partido do primeiro-ministro grego] e considero o discurso do [líder do Parti de Gauche, Jean-Luc] Mélenchon mais radicalizado do que do [premiê grego Alexis] Tsipras”, opina.
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Hollande deve deixar “posição vergonhosa de fazer coro com Merkel, que oprime um país-irmão como a Grécia”, defendeu Melanchon
Outro aspecto levantado durante a entrevista foi a falta de pluralidade nos meios de comunicação franceses. “Aqui no Brasil, a gente reclama da grande imprensa, que é de direita, mas a França já não tem grandes jornais nem de centro-esquerda. O Le Monde, que já foi o jornal da centro-esquerda, hoje é conservador, mais conservador que o Le Figaro, que é um jornal tradicional da direita francesa. Já o Libération, que vocalizava mais ou menos a linha do Partido Socialista, é um jornal de direita hoje. Então você não tem nenhum grande jornal, ou televisão à esquerda. O pluralismo na imprensa francesa está muito comprometido”, conclui.
Ao final do Congresso, participantes entoaram a Internacional Comunista:
NA BOA TRADIÇÃOEmocionante encerramento do Congresso do Parti de Gauche neste domingo decisivo para o mundo
Posted by Maringoni Gilberto on Domingo, 5 de julio de 2015