“A América Latina tem uma alma própria de urbanização, com todos os erros que tivemos nos últimos 30, 40 anos. Essa especificidade de hoje, para o bem ou para o mal, é o que eu chamaria de a dualidade da nossa cidade, onde o mais moderno e o mais precário convivem juntos. É uma sociedade desigual. E isso precisa de uma solução”, afirma a Opera Mundi o colombiano Elkin Velásquez, Diretor da ONU-Habitat para América Latina.
No início desta semana, Velásquez esteve em São Paulo para participar do 2º Colóquio Sul-Americano de Cidades Metropolitanas, o MSUR, cujo principal eixo temático foi o debate acerca do desenvolvimento urbano e das desigualdades socioespaciais na região.
Patrícia Dichtchekenian/OM
“Uma cidade eficiente é também mais integrada e diversa em cada bairro”, diz Velásquez
Para o diretor da entidade das Nações Unidas, o investimento em políticas urbanas de bairro a bairro é uma estratégia importante para a redução das desigualdades históricas na América Latina. “Nas cidades latinas, há bairros tradicionais consolidados, mas com muita infraestrutura que não é bem aplicada. Por exemplo, aqui onde estamos: é incrível a riqueza do centro de SP, mas ela está subutilizada”, compara.
Aos seus olhos, nessas “cidades duais” é preciso intervir em bairros informais não regularizados em que há uma dívida social histórica, mas é essencial também revisitar as áreas já consolidadas das metrópoles para dar uma “nova vida” a elas.
De acordo com Velásquez, há ao menos cinco adjetivos que caracterizam juntos uma cidade urbanisticamente sustentável: eficiente, compacta, integrada, diversificada e inclusiva. Mas como avançar neste modelo de metrópole? Para a ONU-Habitat, não há um só modelo ou uma só solução que resolva esta questão, mas bons projetos e princípios bem-sucedidos testados em cidades latinas que podem servir de referências a outros municípios da mesma região.
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Contrastes de cores na cidade colombiana de Medellín: metrópoles latinas tiveram crescimento urbano desordenado
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“O que é uma cidade eficiente? É um funcionamento que dá acesso a todo mundo. Tem a ver também com o adensamento inteligente e sustentável da cidade. Quando você tem uma cidade mal planejada, ela fica ineficiente no consumo de energia, o que tem impacto maior na mudança climática”, argumenta.
“Uma cidade eficiente é também mais integrada e diversa em cada bairro. Uma cidade onde tudo está mais perto de tudo, a gente fala mais. E se a gente fala mais, com mais pessoas e com diferentes perspectivas individuais, produzimos mais inovação”, acrescenta.
Em prática, cidades eficientes buscam proporcionar bairros com diversidade social e econômica através, por exemplo, de instrumentos do próprio setor público, que pode utilizar a terra da qual o Estado é proprietário para promover moradia social — algo semelhante ao que o prefeito Fernando Haddad (PT) tem feito nos últimos tempos.
Divulgação/Vigliecca & Associados
Parque Novo Santo Amaro V, em São Paulo
Naturalmente, políticas públicas que dão prioridade aos bens coletivos em lugar de soluções individuais geram resistência de parcela da população. “Em democracia, isso é normal. Na perspectiva da ONU-Habitat, isso tem que ser feito para gerar bairros mais diversos, mas é preciso muito diálogo para construir convivências e acordos sociais. Isso passa por um processo participativo”, reflete o diretor da entidade.
Na aplicação de toda politica inclusiva e no processo de ressignificação de espaços públicos, Velasquez acredita que são necessárias pedagogia e paciência. “Você tem que demonstrar cientificamente o impacto final e o resultado positivo — direta ou indiretamente para todos — do que você vai fazer. E comunicar bem tudo isso é outra arte”, sintetiza.