Grupos da oposição egípcia afirmaram neste domingo (23/12) que o referendo sobre o texto constitucional no país foi repleto de irregularidades e fraudes. A declaração veio momentos depois do Partido da Liberdade e Justiça, o braço político da Irmandade Muçulmana, ter anunciado que 64% dos eleitores aceitaram a proposta.
Agência Efe (23/12)
Fiscais contam votos do referendo constitucional do Egito
Os resultados oficiais da votação apenas serão conhecidos nesta segunda-feira (24/12). Mas, o conflito político sobre a consulta popular e a nova Constituição do país devem se prolongar por muitos meses. Milhares de pessoas tomaram as ruas egípcias nas últimas três semanas em protestos favoráveis ou contrários a nova Carta Magna e a administração de Mohamed Mursi, que deixaram dezenas de mortos e feridos.
O polêmico texto recebe o apoio do presidente Mursi e da Irmandade Muçulmana, mas foi muito criticado por um conjunto heterogêneo de grupos. Os oposicionistas temem a imposição de preceitos muçulmanos e a criação de uma nova ditadura no país, que passa por uma transição democrática desde a queda do regime de Hosni Mubarak por protestos populares.
“Nós esperamos que a aprovação da nova Constituição será uma oportunidade histórica para reunir forças nacionais, baseadas no respeito mútuo e no diálogo sincero, com a finalidade de atingir a estabilidade nacional e completar as instituições”, afirmou o Partido da Liberdade e Justiça em nota neste domingo (23/12).
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Mas, a Frente de Salvação Nacional disse que os resultados foram assegurados por “fraude, violações e problemas organizacionais”. A organização, que fez campanha pelo “não” na votação, foi um dos grupos da oposição que decidiu apoiar a consulta popular, boicotada por outros.
Os resultados preliminares e não oficiais mostram que 36,2% dos eleitores votaram contra a proposta constitucional e apenas 32% dos 52 milhões de eleitores registrados compareceram às urnas. Os baixos índices alimentaram suspeitas entre os grupos opositores de fraude.
De acordo com relatos colhidos pelos opositores, alguns locais de votação abriram horas depois do previsto, islâmicos continuaram a fazer campanha pelo “sim”, mesários influenciaram o voto de eleitores e a lista de eleitores contava com a presença de pessoas não elegíveis, incluindo o nome de homem morto.
A consulta popular foi dividida em duas etapas – no sábado passado (15/12) e ontem (22/12) – pela falta de juízes disponíveis a supervisionar o pleito uma vez que muitos permanecem em greve pela discordância com a proposta, classificada pela principal associação da magistratura no Egito como um “ataque à Justiça”.
Agência Efe (18/12)
Ativistas muçulmanas participam de protesto contra o presidente Mohamed Mursi e a nova proprosta constitucional
“O referendo não é o jogo final. É apenas uma parte da batalha desta longa luta pelo futuro do Egito”, disse a frente opositora. “Nós não vamos permitir uma mudança na identidade do Egito ou o retorno da tirania”.
Uma nova ditadura?
A crise política teve início no dia 22 de novembro, quando o presidente aprovou um decreto lhe garantindo poderes extraordinários, imunidade em relação ao Legislativo e Judiciário e a impossibilidade de dissolver a atual Assembleia Constituinte de maioria islâmica. A medida, entendida por muitos como a volta à era ditatorial, também impedia o cancelamento ou suspensão de decisões de Mursi, mas foi cancelada pelo próprio presidente por conta dos intensos protestos.
A nova Carta Magna foi formulada e aprovada neste processo por apenas 234 membros vinculados a Irmandade Muçulmana da Assembleia Constituinte durante uma sessão boicotada por representantes de outros setores.
Por esta razão, grupos apontam a falta de participação e de garantia constitucional aos direitos do povo, sobretudo das minorias. Organizações cristãs, vinculadas ao regime de Mubarak, laicas e de esquerda fazem parte do amplo espectro da oposição.
Desde então, milhares de egípcios favoráveis e contra o presidente tomaram conta das ruas do país. Os muros próximos ao palácio presidencial estão repletos de grafites e frases que pedem pela democracia, liberdade do povo e ironizam o presidente, vinculado a Irmandade Muçulmana.
Referendo
O resultado desta última fase do referendo vai determinar se o rascunho pode se tornar ou não a nova Constituição.
Caso os 51 milhões de eleitores escolherem pelo “não”, uma eleição será convocada para a formação de uma nova Assembleia Constituinte que deverá redigir outro texto que, novamente, deverá passar pelo crivo popular. Por outro lado, se a proposta for aceita pela maioria, a população deverá ir também às urnas para eleger o Parlamento.